Sair de casa de bicicleta, deixá-la em segurança numa doca pública, mesmo no momento em que autocarro está a passar, e ainda deixar uma notificação de um buraco no passeio, que dentro de pouco tempo será arranjado, é possível e tudo com recurso apenas ao telemóvel. Estes são apenas três exemplos do que é viver numa smart city. A vila história na Área Metropolitana de Lisboa começou a "aproveitar a tecnologia para fazer as coisas que melhorem a qualidade de vida em Cascais", explica o diretor do Futuro da autarquia, Marco Espinheira.
Um investimento que recentemente foi reconhecido na feira de tecnologia Consumer Eletronic Show, em Las Vegas. Cascais participou no certame para falar de como uma cidade - neste caso vila - pode usar a tecnologia para "aumentar a qualidade dos serviços à população", sublinha o responsável municipal. E o sucesso foi de tal ordem que os responsáveis da cidade de Los Angeles se mostraram interessados em implementar o sistema de mobilidade integrado - o MobiCascais - e o que permite aos cidadão com boas práticas ambientais ganhar pontos que depois podem usar, por exemplo, em estacionamentos ou museus: o City Points. Na altura, o vice-presidente da autarquia, Miguel Pinto Luz, disse que os responsáveis do gabinete de inovação de LA mostraram interesse em conhecer os projetos e ficou prevista uma visita à vila.
Perante tal interesse, também extensível à equipa de futebol americano Los Angeles Rams, o DN foi perceber como o dia-a-dia dos cascalenses já se faz em torno destes avanços tecnológicos. Um dos eixos mais desenvolvidos é a mobilidade, talvez por ser também um dos principais desafios das cidades do futuro. Começou com o bike sharing, passou para a gestão municipal dos autocarros (ainda não são todos, mas em 2019 estarão sob a mesma alçada) e chegaram aos parques de estacionamento inteligentes. Mais, os residentes em Cascais podem usar o passe de autocarro para entrar em parques de estacionamento, no comboio ou usar as bicicletas e as docas disponíveis pela cidade. Tudo com um custo fixo. Como cidade turística, com ligação a Lisboa, os autocarros aceitam também os cartões Lisboa Viva, explica Rui Rei, administrador da empresa municipal Cascais Próxima - Gestão de Mobilidade, Espaços Urbanos e Energias.
Carros seguros e luz controlada
Deixar o carro num parque de estacionamento "100% autónomo" é outra das modernices possíveis em Cascais. Referimo-nos ao Parque da Quinta da Carreira, com capacidade para cerca de 200 veículos, inaugurado no ano passado e que tem "as luminárias alimentadas por energia solar e eólica, energia essa que também é usada para as máquinas de entrada e saída do parque, tem uma máquina de vídeo que consegue controlar os lugares, dizendo se estão todos ocupados ou não, consegue apagar a luz de metade de um candeeiro na parte em que está virado para um prédio", resume Marco Espinheira. Os carros estacionam num piso que tem relva e o espaço conta com videovigilância e wi-fi. Tudo acompanhado pelo centro de controlo, onde é possível perceber se, por exemplo, as luzes falharam. Nesse caso, remotamente podem aumentar a sua intensidade no resto do parque para compensar essa falha. Também pode acontecer que o parque esteja vazio, e aí reduz-se a intensidade das luzes.
Esta iluminação inteligente pode ser alargada a toda a cidade, e esse é um passo que está a ser estudado, admite o diretor do Futuro da câmara. O objetivo é que se possa ligar o funcionamento da iluminação ao movimento da rua, permitindo maior eficiência energética.
Visão global dos cidadãos
A Cascais do futuro tem também um projeto - a Cascais ID - que junta os cidadãos numa base de dados. "É a capacidade de conseguirmos ver de forma holística os cidadãos. Um cidadão é "cliente" da câmara na saúde, na educação, na cultura, na mobilidade, enfim, em variadíssimos sítios, mas até agora isto estava compartimentado. Agora conseguimos uniformizar esse tratamento da informação", refere Marcos Espinheira. Esta reunião de dados permite "olhar para um cidadão e perceber toda a interação que tem connosco e com um só telefonema pode tratar 40 assuntos", acrescenta o responsável da autarquia. Se facilita do lado do munícipe, também a câmara tem oportunidade de ser mais pró-ativa, reconhece Marco Espinheira, garantindo que "tendo a informação e conseguindo cruzá-la, conseguimos resolver problemas antes de o cidadão pensar sequer que tem um problema". Os pontos de contacto possíveis são também variados: telefone, Facebook, e-mail ou chat. Este agregar de informação surge numa lógica de "aumento da qualidade de serviço", assegura o responsável.
Os problemas do centro de contacto passam para o Centro de Controlo de Cascais, que tem como missão encontrar a solução, seja em relação a água, eletricidade, infraestruturas, lixo, mobilidade ou limpeza urbana. A solução, diz Marco Espinheira, não é inédita, mas Cascais destaca-se pela quantidade de sistemas inteligentes que já funcionam em simultâneo. Neste momento, funcionam duas destas vertentes, a mobilidade e a videovigilância, mas no próximo ano e meio passará a ter 11 variáveis.
A recolha do lixo já é feita tendo em conta os sensores que estão nos contentores. As rotas são definidas pela quantidade de lixo que ali existe, o que permitiu reduzir para metade as rotas, e cortou nos quilómetros percorridos e nas emissões de CO2. Em 2014, foram poupadas 264 toneladas de emissões.
Uma das aplicações mais usadas é a Fix Cascais, que permite reportar ocorrências como buracos no passeio, na estrada, semáforos avariados, espelhos partidos, e os utilizadores podem ver qual o estado da sua sinalização.
Mas nem tudo são indicações do que está mal na cidade. Os habitantes do concelho podem ganhar pontos e "competir" para serem os melhores cidadãos. É a City Points, que ganhou um dos World Summit Awards, organizados pela ONU. A aplicação atribui pontos por se adotar um animal, doar livros, comprar no mercado biológico, pontos esses que podem trocados por viagens nas bicicletas partilhadas, no estacionamento na cidade ou em concertos.
Nem o meio ambiente nem a deteção de incêndios ficam de fora. A Smart Forest utiliza sensores para monitorizar os parques, são sensores de vento, humidade e temperatura, criando alertas quando estes atingem valores de risco. Os sensores estão colocados num projeto-piloto na Quinta do Pisão.
A construção de uma Cascais inteligente começou na gestão da mobilidade. Esse é o fator-chave que integra soluções tecnológicas para o uso de transportes públicos e privados, depois de um passe único que permite ainda usar as bicicletas e os parques de estacionamento. O próximo passo é o teste de carros autónomos, primeiro na Adroana, numa zona controlada. O objetivo é que os carros autónomos possam ser um transporte público de passageiros: "Levar as pessoas ao centro de saúde, entre o parque de estacionamento e a estação de comboio. Vamos avaliando como se pode usar", aponta Rui Rei.