28 agosto 2009 às 01h00

Chiado1988O drama dos políticos em tempo de férias

JOSÉ MANUEL BARROSO

Eanes e Cavaco em Alcafache, em 1984. Soares e Cavaco no Chiado, em 1988. Durão Barroso no interior do País, em 2003. Sócrates no Quénia, em férias, em 2005. Cavaco e Sócrates em Albufeira, em 2009. Que faz um dirigente político, um titular de um órgão de soberania, estar ou não presente nos locais onde o drama atinge os cidadãos, quando se encontra em período de férias?

A resposta nem sempre é óbvia, na medida em que a fronteira entre o estar ou não estar pode ser ténue. Ir ao local nem sempre significa melhor comandar a situação - pode-se coordenar a partir de um gabinete ou com um telefone ao lado. Mas, de um modo geral, prevalece o valor simbólico. Ir é estar perto, acompanhar acontecimentos e, sobretudo, pessoas - ser solidário, algo que o cidadão também espera de quem tem funções de Estado. Mas... e se o governante está longe, como aconteceu em 2005 com o primeiro-ministro, José Sócrates, de férias no Quénia, onde se manteve?

O alarido político, em torno de uma ausência é sempre muito. A ausência de Sócrates no momento difícil dos fogos florestais de 2005 e a sua substituição no comando do Governo pelo número dois, António Costa, provocaram protestos da oposição e críticas no interior do próprio PS. Na verdade, Sócrates terá ponderado regressar, mas o seu ministro de Estado tê-lo-á aconselhado a permanecer em África. António Costa vai para o terreno, mantém-se em contacto com o chefe do Governo, mas as críticas não param. Sócrates dirá, depois: "A exploração política do tema das minhas férias tem sido absolutamente demagógica, injusta e mesquinha."

O certo, porém, é que as pessoas, atingidas pela dor ou sensibilizadas pelo drama, esperam do político atenção e solidariedade. E, também, decisões - ou promessa de decisões. Entre as quais... a promessa da identificação "dos culpados".

No caso do acidente ferroviário de Alcachafe, o Presidente Eanes e o primeiro-ministro Mário Soares pouco mais poderiam fazer - e foi o que fizeram - do que mostrar solidariedade aos que tentavam socorrer as vítimas e aos que escaparam vivos da catástrofe. E observar, com horror, o monte de ferros retorcidos, os corpos carbonizados, o desolador panorama nocturno do acidente.

Já Presidente, Soares foi confrontado com outro drama ocorrido em pleno tempo de férias. No final de Agosto de 1988, o Chiado ardia - e era toda uma memória da Lisboa dos últimos duzentos anos que desaparecia. Homem de cultura, Soares sofre duplamente com o acontecimento. Primeiro- ministro, Cavaco Silva estará lá também.

Em Agosto de 2003 e de 2005 o País arde. Durão Barroso e vários ministros, em 2003, adiam férias, até a situação estar dominada e medidas tomadas. O mesmo acontece, em 2005, quanto às medidas, mas José Sócrates não regressa a Portugal. Há uma semana, no caso da Algarve, Sócrates e Cavaco estarão ao lado da família das vítimas.

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