Não precisa de ser perfeita nem de seguir cânones religiosos. Desde Snu Abecassis e Sá Carneiro que Portugal se habituou à presença da família nas campanhas eleitorais e os especialistas ouvidos pelo DN defendem que este é um trunfo eleitoral. Para já, António Costa é o candidato que mais recorre à família. Passos Coelho ainda poderá vir a fazê-lo.
"Esta família tem um lema: um por todos e todos por um! Quando algum precisa, estamos lá todos." A frase é de Fernanda Tadeu, mulher de António Costa, que se tem envolvido de forma persistente na campanha eleitoral.
O desabafo foi feito numa entrevista - na qual revela que tanto ela como os filhos, Pedro e Catarina, vão ser assíduos na campanha - dada ao jornal de campanha do PS que dedica grande parte da primeira página ao casal.
O filho de António Costa, Pedro, é militante da JS e tem acompanhado o pai. No dia 4 de setembro, por exemplo, seguiu no "comboio da confiança", em ações entre Lisboa e o Porto. No mesmo dia Costa conversava com uma professora que lhe disse: "Não se esqueça dos professores." Costa reagiu prontamente: "Tenho lá uma em casa. Se me esquecer ela vai lembrar-me todas as manhãs ao pequeno-almoço."
A família tem sido um exemplo para Costa, que fez questão de referir a mãe e os filhos como exemplos da confiança intergeracional que quer para o sistema de pensões. Isto no debate com Passos, o mesmo em que chegou acompanhado da família. Para Costa tem duas vantagens: humaniza-o perante os eleitores e dá-lhe a tranquilidade de ter a família por perto.
A própria Fernanda Tadeu justificava ao Acção Socialista que aparecer na campanha é "uma forma de nos darmos a conhecer, de nos humanizar." O DN apurou junto de fonte socialista que Fernanda Tadeu estará nas iniciativas mais importantes da campanha ao lado de António Costa até ao dia 4 de outubro. O filho Pedro também será compagnon de route na campanha.
Já Passos Coelho tem resguardado mais a família em função da doença da mulher, para a qual pediu privacidade. O DN apurou que ainda não está decidido se Laura Ferreira irá aparecer na campanha, mas a possibilidade está em aberto.
Em 2011, Laura foi uma presença constante ao lado de Passos. A fotografia pretendida era "Pedro, o homem de família de Massamá". Nesta campanha o primeiro-ministro tem procurado resguardo devido ao problema oncológico da mulher, mas, por exemplo, na visita à Guiné - em virtude de querer visitar o seu país - Laura insistiu com Passos para lhe fazer companhia.
O momento chegou a provocar críticas de adversários (um deles o dirigente do PS Porfírio Silva), que acusaram o primeiro-ministro de se estar a aproveitar eleitoralmente do estado de saúde da mulher.
"Acrescenta sempre votos"
Para os especialistas não há dúvidas de que a família na campanha é um valor acrescentado. De acordo com o politólogo José Adelino Maltez, "trazer a família para a campanha é sempre um ganho, acrescenta sempre votos e é algo habitual em Portugal".
Também o especialista em marketing e presidente da agência Ivity Brand Corp, Carlos Coelho, considera que "a família na campanha significa um ganho imenso". Para Carlos Coelho, Portugal não deixa de ser uma "sociedade clássica e conservadora" e, muitas vezes, "mais do que em cima de números ou promessas, no final de contas quem decide eleições são os eleitores móveis, que votam de acordo com quem mais se identificam e lhes parece ser mais credível".
Já o politólogo António Costa Pinto considera que a família na campanha conta "relativamente pouco", embora tenha um efeito sempre mais positivo do que negativo junto do eleitorado. Costa Pinto lembra que "José Sócrates ganhou a maioria absoluta em 2005 e era divorciado e não apareceu com a família". Além disso, o politólogo considera que este valor conta mais "junto do eleitorado de centro-direita".
Adelino Maltez lembra que em Portugal o "pioneiro" nesta estratégia foi Sá Carneiro (que não se conseguia divorciar) quando trouxe Snu Abecassis (divorciada) para a campanha. A entrada de Snu "produziu um bom efeito, aumentou a simpatia de Sá Carneiro, no fundo, adoçou-lhe o estilo". Desde então é "normalíssimo", sendo natural que "Passos e Costa usufruam de maior simpatia por incluir a família". Apesar de admitir que é uma aposta que é feita mais pelos dois maiores partidos, Maltez lembra que "o Cunhal não o fazia, mas até o Jerónimo já fez indiretamente isso". (Em 2011, foi votar ao lado da mulher.)
Já Carlos Coelho acredita que "Passos tem mais a ganhar em apostar na família do que Costa, porque o socialista já é naturalmente mais aberto e expressivo. Passos precisa mais de mostrar lado humano".
Os politólogos recordam ainda outros casos. "Durão Barroso, por exemplo, contava com Margarida Sousa Uva, que até utilizou a metáfora do cherne [poema de Alexandre O"Neill]". Ou Cavaco Silva, que no segundo mandato "entrou em Belém de mão dada com toda a família". E até em campanhas não nacionais: Manuel Maria Carrilho na Câmara de Lisboa, que fez campanha ao lado de Bárbara Guimarães, que tinha "mediatismo grande".
Há ainda casos em que as famílias atiraram-se contra as famílias. Maria Barroso - que tal como Fernanda Tadeu não queria ser "mulher de ninguém - aproveitou uma ação de campanha, em 1979, em Nafarros, para lembrar os "valores da família", num ataque indireto a Snu Abecassis e Sá Carneiro. Mário Soares acabou prejudicado.