Sei que é de Falmouth. Como foi a sua família parar a essa cidade do Massachusetts? Qual a tradição portuguesa de se fixar aí?
As minhas origens familiares estão em São Miguel, mas todas as gerações se deslocaram para trás e para a frente sobre o Atlântico desde o século XIX (Açores, Brasil, Bermuda, EUA e o continente). Os meus amigos menos informados pensam que os luso-americanos navegaram todos em barcos baleeiros e hoje trabalham como pescadores. Esta visão romântica e teleológica do marinheiro português contrasta com a realidade, em que se enviava trabalhadores precários com pouca formação através dos oceanos para serem vítimas de abusos em barcos, e em fábricas e plantações industrializadas. Os açorianos e os cabo-verdianos vieram para Falmouth e Cape Cod para trabalharem na agricultura industrial e no serviço doméstico para os Yankees. Depois, alguns trabalhadores pensaram, "porque é que estamos a trabalhar para ajudar os outros a enriquecer quando podemos cultivar e vender nós próprios?" Assim, fundaram cooperativas agrícolas, introduziram inovações e, coletivamente, dominaram setores do comércio regional. Fizeram o mesmo com a construção civil. Durante os anos de 1960-1980, como toda a região, a comunidade lusófona de Falmouth foi revitalizada por migrantes açorianos, muitos deles da Terceira, e desde os anos de 1990 do Brasil. Existem muitas organizações fraternais de imigrantes em Falmouth, e houve dezenas de antigas organizações cívicas, beneficentes e sociais, incluindo várias Irmandades do Divino Espírito Santo. Até ao surgimento da covid, duas delas realizavam uma festa anual todos os anos desde a década de 1890. As sedes destas associações continuam como centros sociais e cívicos. Os meus pais trouxeram-me para uma "igreja nacional portuguesa" fundada pela comunidade (que ainda celebra missa em português), onde sempre fitei com fascínio, por cima do altar, o santuário de sete metros de altura com um mural da Virgem de Fátima emoldurado por um friso com um escudo português ornamentado na abside. Participei nos eventos dos clubes vários, e mais recentemente, o Cape Cod Cape Verdean Museum, um projeto em que estou empenhado, acabou de ser instalado numa quinta histórica portuguesa, criando um espaço para apresentar histórias menos conhecidas dos imigrantes. É impossível crescer em Falmouth sem uma consciência de que a aldeia é apenas um cruzamento num mapa maior da história transoceânica.