Defesa-esquerdo alto e corpulento, Miguel Areias jogou no FC Porto, clube que o formou e onde conquistou uma Taça Intercontinental (atual Mundial de Clubes) em 2004. "Foi a melhor conquista e a melhor recordação da minha carreira", confidenciou ao DN o antigo lateral, com a "tristeza" de não ter sido campeão pelos dragões. Disse adeus aos relvados na época 2010--11, ao serviço do Leixões, depois de ter jogado na Bélgica e em Espanha. Depois dedicou-se a ajudar outros futebolistas a arranjar clube, como empresário, e atualmente é treinador na formação do FC Porto, com a ambição de um dia treinar "o clube do coração".
"Felizmente tive a oportunidade de seguir ligado ao futebol, através do agenciamento de jogadores. Na altura o meu empresário (Rui Neno) convidou-me para trabalhar com ele, ir ver jogos, contactar com jogadores e colegas", contou Areias, admitindo que a função não o preenchia completamente: "Não me sentia realizado, agora sim, já me sinto. Acordar, saber que vou ter treino, saber que no fim de semana vou ter jogo, aquela adrenalina de termos de ganhar. Esta rotina fez parte de mim como jogador e eu sentia falta dela quando fui para o agenciamento."
Enquanto arranjava clubes a alguns ex-colegas de profissão, surgiu a oportunidade de treinar os sub-14 do FC Porto. "Um dia encontrei o presidente (Pinto da Costa) e durante a conversa disse-lhe que gostaria de ser treinador. Ele ouviu-me e felizmente, em 2015, deu-me essa oportunidade, abrindo-me a porta do regresso ao FC Porto", contou o agora técnico dos sub-16 dos dragões, que está a "adorar a experiência".
Se como jogador subiu "a pulso", agora espera fazer o mesmo como técnico: "Quando és jogador pensas que sabes da parte do treinador, mas não percebes nada. Sabes ir para o treino, o que tens de fazer, mas não dominas o treino, os exercícios, as partes táticas. Agora vejo que afinal não dominava nada. Estou a aprender e a fazer o meu caminho. Comecei nos sub-14 e agora treino os sub-16. Estou a evoluir como treinador e ainda por cima estou no meu clube e espero um dia chegar aos seniores. Quem é que não gostaria? Vamos ver..."
Enquanto jogador, Areias "adorava aquela adrenalina matinal, de saber que ia ter jogo, a pressão de ganhar". Depois, quando deixou de jogar sentiu falta dessa sensação: "Por muito que um jogador diga que está preparado para o fim da carreira... nunca está."
Aos poucos foi-se adaptando à nova realidade. E se lhe faltavam os treinos e os jogos, sobrava-lhe tempo para poder "fazer coisas" de que abdicou enquanto futebolista. Como por exemplo jantar fora sem olhar para o relógio ou gozar férias no verão. "Os jogadores têm de tirar férias assim que acaba a época, em maio, e uma semana antes do regresso têm de estar a fazer umas corridinhas e ter atenção ao que comem para não regressar à nova época, no início de julho, fora de forma. Agora dá para ir jantar sem olhar para o relógio a ver se já é hora do recolher obrigatório", explicou o ex--lateral, que nunca chegou a representar a seleção.
Jogar no FC Porto deu-lhe fama e dinheiro, mas nunca se deixou iludir: "Sempre tive uns pais que me abriram os olhos e me aconselharam e alertaram. Na altura uma pessoa ganha bem e chega ao fim do mês com mais dinheiro do que qualquer trabalhador normal. Mas felizmente sempre tive cabeça e fui preparando o futuro. Fiz o meu pé- -de-meia, nada de especial ou grandes investimentos, tenho uma conta poupança normal e graças a Deus tenho casa e carro pagos e não devo nada a ninguém."
Cedido por um jogo à Juventus
Dragão desde os 13 anos, foi em Aveiro que começou a dar mais nas vistas como sénior ao serviço do Beira-Mar. Em 2004 trocou a ria de Aveiro pelas margens do Douro a pedido de Mourinho, mas não seria treinado pelo técnico, que acabou por rumar ao Chelsea. Chegou então Del Neri, depois José Couceiro e a seguir Vitor Fernández... todos no mesmo ano. "Foi uma época atípica", recordou o ex-lateral, que foi campeão do Mundo de Clubes, meses depois de regressar ao FC Porto, em dezembro de 2004.
Pouco depois chegou Co Adria-anse ao Dragão. Durante o estágio de pré-época os jornalistas perguntaram-lhe se contava integrar o plantel e Areias respondeu: "Já levo 27 anos de sócio e não vou deixar de pagar as quotas se for embora." Não ficou e foi emprestado ao Boavista e depois aos belgas do Standard de Liège.
Quando estava na Bélgica passou por uma experiência caricata: foi cedido à Juventus por um jogo! "O presidente, Luciano D"Onofrio, chamou-me e disse que o clube tinha um protocolo de cooperação com a Juventus e todos os anos havia um jogo de solidariedade em que iam dois jogadores do Liége fazer um jogo por eles. Fui, fiz um treino ao lado do Nedved e do Del Piero, e no dia a seguir joguei com a Roma", contou Areias, que no dia a seguir regressou a Liège com boas recordações de Turim e um jogo pela vecchia signora no currículo.
No St. Liège jogou com o atual treinador do FC Porto, Sérgio Conceição, "uma pessoa cinco estrelas", que espera ver triunfar no Dragão: "Quando ele soube que eu ia jogar pela Juventus, disse-me: "Vai ter com o Nedved, diz que és meu amigo e manda-lhe um abraço! Fui bem recebido por todos, o Didier Des-champs foi fantástico, veio ter comigo e pôs-me à vontade, era tudo malta porreira."