Catarina Dias partiu de Montalegre há 9 dias. Se tudo correr como previsto, ela e o grupo de 49 companheiros em peregrinação a Fátima chegarão à Cova da Iria bem a tempo das celebrações do 13 de maio. A organização pertence a Chaves, mas a composição é diversa, incluindo gente de Boticas e Valpaços. É quase uma da tarde de sexta-feira, estão 31 graus, quando o grupo faz uma paragem à beira do IC2, junto ao camião dos gémeos Ferreira, do Marco de Canaveses, que há 31 anos cumprem a promessa de apoiar os peregrinos. Este ano, o espaço dos Hiper Gémeos tem novidades: além do porco no espeto, das febras, bolos e bolachas, presunto a perder de vista e água para matar a sede, anuncia-se a “festa do peregrino”.
Há artistas populares, música para quem quiser dançar. Catarina reconhece dois amigos de infância: Rafael e Francisca, que são afinal o duo Toka e Dança, em cima do palco improvisado num canto do camião. E ela, que é engenheira civil de profissão e música de paixão (integra o grupo Os Lordes, de Montalegre) pega na concertina e faz o gosto aos dedos. O grupo que a acompanha aplaude. “Vamos lá dançar!”, incentiva Catarina. Com ela vem também a irmã gémea, naquela que é a sua primeira peregrinação. Ninguém diria que nos últimos 9 dias percorreu, a pé, os cerca de 300 km que separam a sua terra daquele descampado à beira do IC2, no lugar de Relvão, freguesia da Redinha, próximo de Pombal.
Mais tarde, diz ao DN que esta está a ser uma experiência intensa. “Venho sobretudo em sinal de gratidão. E parece-me importante vir e dar um sinal aos jovens no sentido de lhes mostrar que precisam de ser mais humanos”. Tem 25 anos e é uma das mais jovens do grupo. Considera iniciativas como esta “muito valiosas, até porque muita gente vem em sofrimento, e a música é uma maneira de o combater”. Arminda Pinto, 41 anos, companheira de viagem, alinha na mesma opinião. Também ela faz o caminho pela primeira vez, sendo que veio propositadamente da Suíça para o fazer. Queixosa dos joelhos e dos pés, prefere filmar o momento em vez de dançar.
Quando há três décadas os gémeos José e António Ferreira começaram a distribuir mantimentos aos peregrinos o tempo era outro. O pai era feirante, de modo que ambos cresceram no comércio e acabaram por singrar nessa área (são proprietários de várias lojas no Marco de Canaveses, Lousada, Amarante e Paredes). Aos 25 anos, José sentiu que a vida lhe escapava, à conta de uma doença pulmonar. “Naquele ano prometi à Nossa Senhora que, se ficasse bom, ia a Fátima a pé.” E foi. Nesse e nos quatro anos seguintes. “Aquilo eram condições muito más. Dormíamos onde calhava. Nem imagina”, conta ao DN, ao mesmo tempo que recorda o momento em que decidiu “fazer alguma coisa pelas pessoas que fazem este caminho”. Desde então, repetem o gesto solidário nos dias 9 e 10 de maio.