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Dinheiro
01 dezembro 2024 às 01h00
Leitura: 6 min

Taxa de juro da nova dívida portuguesa não alivia apesar das descidas na Zona Euro

Custo das novas emissões nos mercados internacionais desde o início deste ano está estacionado em 3,4% desde maio. Portugal ainda é dos mais endividados da Zona Euro e precisa muito de reduzir peso dos juros no Orçamento, despesa que continua a subir e já vai em 7,2 mil milhões de euros anuais.

As taxas de juro de referência da Zona Euro e as taxas da dívida de longo prazo de Portugal (a dez anos) estão a descer de forma evidente desde junho (sobretudo as definidas pelo BCE - Banco Central Europeu).

No entanto, a República Portuguesa parece não estar a colher, até agora, grandes benesses desta fase no custo da nova dívida emitida: a taxa média global das novas emissões (BT - Bilhetes do Tesouro, OT - Obrigações do Tesouro, etc.) está congelada desde maio, não saiu do planalto dos 3,4%, valor onde se manteve estacionada em outubro, mostram números do IGCP, a agência tutelada pelo Ministério das Finanças.

Só para se ter um termo de comparação, a taxa de mercado secundário das OT nacionais a dez anos desceu de 3,2% em junho (média do mês, segundo o Banco de Portugal) para 2,7% em outubro.

A taxa principal do BCE, após dois anos de aumentos muito agressivos para ajudar no combate à inflação, atingiu um pico de 4%, mas desde junho que começou a aliviar, encontrando-se atualmente em 3,25%.

Na próxima reunião em Frankfurt, BCE deve descê-la um pouco mais, para 3%, antecipa a maioria dos analistas e economistas que seguem a instituição liderada por Christine Lagarde.

Esta estagnação no custo da nova dívida -- uma medida calculada pela agência que gere o endividamento da República (IGCP), tutela do ministro Joaquim Miranda Sarmento -- é problemática porque Portugal continua a ter uma das dívidas mais elevadas da Zona Euro.

O País tem vindo a reduzir este fardo, é certo, mas se as novas emissões não ficarem mais baratas, a fatura paga em juros, que continua a subir, ano após anos, vai demorar mais a inverter esta tendência, atrasando a consolidação orçamental.

Portugal conta pagar só em juros 7,2 mil milhões de euros este ano, mais 6% do que em 2023, segundo as Finanças, no Orçamento do Estado.

Atualmente, apesar da descida gradual do peso da dívida, Portugal ainda carrega um volume considerado extremamente excessivo à luz do Pacto de Estabilidade.

No final de setembro, o endividamento global da República ascendia a 272,2 mil milhões de euros, o equivalente a 97,4% do Produto Interno Bruto (PIB), de acordo com o banco central de Mário Centeno, a entidade responsável pelo apuramento deste indicador crucial.

Miranda Sarmento estima que conseguirá baixar este peso para 95,9% do PIB no final deste ano e 93,3% no próximo.

O Pacto de Estabilidade europeu exige que o máximo seja 60%. A Portugal, falta bastante para lá chegar.

A redução da dívida só se faz através da entrega de excedentes orçamentais consecutivos, o que permite ao governo ir recorrendo menos e menos aos mercados para se endividar e assim pagar excessos que possam ocorrer na despesa ou quebras nos impostos, por exemplo.

De acordo com fontes do mercado ouvidas pelo DN, a paralisação da taxa de juro da nova dívida em 3,4% pode ser explicada pela retração do Governo nas idas ao mercado este ano, uma forma de travar o endividamento e poder assim apresentar uma descida do indicador da dívida maior do que a esperada. Mas há outros motivos possíveis.

Empréstimos do PRR compensam

Por exemplo, há atualmente uma nova forma de dívida a entrar nos cofres do Estado, a que procede do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), em forma de empréstimos.

De acordo com o IGCP, na última apresentação que fez aos grandes credores e investidores em dívida nacional, este ano devem entrar 1,6 mil milhões de euros em empréstimos do PRR.

No entanto, com o País a entregar excedentes orçamentais (1,2% do PIB em 2023, 0,6% do PIB este ano, segundo diz a Comissão Europeia), é visível a travagem no endividamento do Estado, o que também ajuda a reduzir a exposição às taxas de mercado.

Segundo a agência da dívida, o financiamento de mercado pedido pelo Estado totalizou 22,2 mil milhões de euros em 2022, baixou para 19,1 mil milhões no ano seguinte, e este ano deve cair para 17,9 mil milhões.

Por exemplo, este mês, o IGCP decidiu "cancelar o leilão de BT referente à linha a 12 meses". É uma prática pouco comum: nos últimos cinco anos, só aconteceu quatro vezes em muitas dezenas de leilões programados.

Faz sentido: se avançasse aumentaria a dívida este ano uma vez que estas BT só seriam amortizadas daqui a um ano. Foi mais uma forma de circunvalação e evitar contratar mais dívida a taxas de juro menos interessantes, que, daqui a poucas semanas ou meses, podem até vir a baixar. É esse o sentimento do mercado, por enquanto.