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Ciência
29 outubro 2024 às 00h15
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Lisboa é palco de encontro para ultimar detalhes da missão espacial Ariel

Até esta quarta-feira, a capital recebe um “grupo de astrofísicos, que estão na linha da frente em termos mundiais”. O objetivo é “convergir” nos pormenores para que a missão, quando lançada em 2029, consiga dar “uma resposta completa às perguntas científicas” sobre as atmosferas de exoplanetas.

A intenção da missão espacial Ariel é “caracterizar as atmosferas de outros mundos” e Portugal está a ter uma “importância enorme”, com um “grupo de astrofísicos ligados ao Espaço e aos exoplanetas, que estão na linha da frente em termos europeus e mundiais”, explica Pedro Mota Machado, astrofísico e investigador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Até quarta-feira, a cidade recebe os cientistas num encontro que vai servir para “dar mais um passo” importante em toda a Ariel. Para isso, diz o investigador, é necessário “convergir nos detalhes da construção dos aparelhos que vão a bordo da missão”, ou seja, definir “quais os comprimentos de onda e os filtros que são importantes colocar a funcionar para poder dar uma resposta completa às perguntas científicas sobre a composição das atmosferas dos exoplanetas.”

De acordo com Pedro Mota Machado, que também é co-investigador principal na missão (ou seja, membro da direção da Ariel), há ainda a discussão, durante o evento, de como se poderão utilizar os dados e os elementos que dali saírem. E para o astrofísico não há grandes dúvidas: “Portugal terá acesso a essa informação e vamos fazer ciência de ponta, mais uma vez, quase sempre em colaboração com colegas do mundo inteiro.” Exemplo desta “ciência de ponta”, explica, são os espetrógrafos que irão a bordo do foguetão Ariane-6, quando a Ariel for lançada, em 2029. Estes instrumentos são novos e “captam desde o visível aos raios infravermelhos” e estão a ser desenvolvidos “especialmente” para a missão. “Isto significa que Portugal vai fazer parte de um salto quântico nas capacidades de engenharia e científicas, bem como na sabedoria e capacidade de observação”, e esse papel estende-se também ao baffle, uma parte do telescópio que irá a bordo da nave e que está a ser construído pela Active Space Technologies, uma empresa de engenharia nacional.

Além disso, a FCUL e o Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço “têm a seu cargo a realização dos testes Ground Segment”, que, resumidamente, consiste em “testar, em Portugal, todos os sensores que estão a ser construídos para a nave espacial, de modo a serem calibrados e a analisar-se, também, se terão um bom comportamento no Espaço, onde vão apanhar com ventos solares, radiação, raios cósmicos, etc”. Esta parte serve, diz o cientista, para que, aquando do lançamento, se possam “obter os dados passíveis de serem utilizados de modo a darmos a resposta cabal às perguntas científicas que se pretende dar”.

A Ariel não é, na verdade, a primeira missão espacial europeia em que empresas portuguesas participam. A 7 de outubro deste ano, por exemplo, a missão Hera, vista como “a primeira de defesa planetária” da ESA levava a bordo instrumentos portugueses, produzidos por empresas como a Tekever, a Efacec ou a FHP.

Esta maior participação de Portugal em missões espaciais mostram que o país “já está a chegar à primeira linha”. “Os nossos engenheiros são excelentes, mas temos um problema, que, diria, é de dimensão. Apesar de serem excelentes, terem um portefólio fantástico e já terem, até, uma herança de trabalhos ótima, as empresas normalmente são de pequena dimensão”. No entanto, diz Pedro Mota Machado, “já começa a haver um segundo passo que é organizar, fazer colaborações entre algumas das empresas portuguesas, como está a acontecer já em outras missões. A participação portuguesa está na primeira linha. Estamos olhos nos olhos com alemães, ingleses e franceses”.

A preponderância e o crescimento de Portugal em termos de ciência espacial (que outrora se limitava a “pequenas tarefas”) vê-se, também, noutro aspeto: “Há, neste momento, um aluno de Doutoramento da FCUL que está a ser orientado pela diretora de investigação da missão Ariel, e por mim. Isto vai criar uma continuidade ao longo dos anos, que pela primeira vez está a ser orientado pela diretora de uma missão de enorme importância. Já estamos lá em cima, diria que sim”. “Agora é preciso é continuar e é preciso consolidar esta posição de destaque em missões espaciais. Isso é importantíssimo”, remata Pedro Mota Machado.

Missão vai estudar mais de mil planetas

Coordenada pela Agência Espacial Europeia (ESA), a Ariel tem como principal objetivo estudar a composição química e a temperatura atmosférica de mais de mil exoplanetas (que estão fora do Sistema Solar). O consórcio responsável pela missão é composto por quase 50 institutos de investigação, de 17 países europeus. Além disso, há várias empresas associadas, que vão desenvolver tecnologia e aparelhos para chegar ao objetivo: conhecer melhor estes “outros mundos” que estão a milhões de quilómetros da Terra.