Segurança
10 junho 2024 às 09h32
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Imigrantes com medo de portugueses e vice-versa. Policiamento aumenta no Porto

O DN esteve na zona onde cinco estrangeiros foram agredidos e verificou o forte aparato policial. Na semana passada, dois imigrantes foram agredidos na rua. A PSP está em diligências para tentar identificar os autores do crime.

Vinte polícias e três carrinhas de Intervenção Rápida estão estacionadas na zona do Campo 24 de Agosto, no Porto. Estamos na manhã do último sábado, um dia nublado e normal na cidade. Turistas dividem as ruas com moradores, os cafés estão cheios e há pessoas à espera do transporte público com sacos de compras. Este é uma manhã normal, à exceção do reforço de policiamento na zona do Bonfim.

“Desde a primeira quinzena do mês anterior [maio, quando a casa de cinco imigrantes foi invadida e estes agredidos] que a Polícia de Segurança Pública definiu e estabeleceu um policiamento de visibilidade específico para a zona do Campo 24 de Agosto através da esquadra da área (3.º Esquadra - Heroísmo) com o apoio de várias valências que compõe a PSP”, explica fonte oficial da PSP ao DN.

Como resultado desse policiamento visível, a polícia destaca já ter diminuído “as queixas dos cidadãos que residem e trabalham naquela zona”. No entanto, o tema da insegurança continua presente nas conversas dos moradores.  O DN ouviu vários empresários, trabalhadores e residentes da zona. Os relatos vão no sentido de que os portugueses estão com medo dos imigrantes e os imigrantes estão com medo dos portugueses.

A Associação Comercial do Porto (ACP) escreveu uma carta à ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, em que alerta para a “preocupação com a crescente vaga de insegurança existente na cidade do Porto”, de acordo com notícia da Agência Lusa. Os exemplos citados pela ACP vão desde “casos de tráfico e consumo de droga, confrontos como o do ataque a imigrantes no Campo 24 de Agosto no dia 4 de maio, furtos a carros e lojas, ruído e desordem em zonas de diversão noturna ou aumento dos sem-abrigo, que têm a mendicidade como último recurso de sobrevivência”.

Na semana passada, dois cidadãos indianos foram agredidos na Rua da Alegria, cerca de um mês depois de cinco imigrantes terem a casa invadida por três portugueses e serem espancados. Ao DN, a PSP do Porto explica que, neste momento, decorre a investigação no sentido de apurar a identificação dos suspeitos. Foram realizadas diligências “com vista à preservação de prova”.

Foi na rua da Alegria que dois imigrantes indianos foram agredidos na semana passada.
Foto: Amanda Lima / Diário de Notícias

Até agora, a investigação indica que não há indícios de que os dois crimes que vitimaram imigrantes estejam interligados. Muitos moradores ouvidos pelo DN afirmaram que, nos últimos meses, o sentimento de insegurança aumentou, apesar de os dados oficiais da PSP apontarem o contrário. “Em termos homólogos, a criminalidade violenta e grave participada à 1.ª Divisão do Cometpor da PSP manteve-se estável, com 214 crimes reportados, com especial incidência nos roubos a pessoas na via pública, com ou sem recurso a arma, e roubos a estabelecimentos comerciais.” O período referido é de 1 de janeiro até 5 de junho. 

Ao mesmo tempo, a PSP já prendeu, nos primeiros seis meses deste ano, 17 pessoas estrangeiras por crimes contra o património. As nacionalidades não foram informadas pela fonte oficial, que apenas aponta para “várias nacionalidades”. Os detidos estrangeiros correspondem a cerca de metade do total de presos por crimes contra o património no mesmo período, de janeiro a junho.

“São todos uns ladrõezinhos, mas eu nunca vi nada”

O taxista Alberto Oliveira trabalha há 45 anos na zona. Diz que, depois do policiamento visível, “a situação melhorou um pouco”. A apontar para três imigrantes estafetas sentados em frente a um supermercado, afirma que “são todos uns ladrõezinhos”, mas que “nunca viu nada”, apenas “ouve-se falar”.

Uma moradora da zona, que pediu para não ser identificada, pensa o contrário do taxista. “A maioria trabalha, não incomodam ninguém esses coitados”, cita. A senhora, residente no Bonfim há mais de 50 anos, destaca que “não se sente insegura”.

Um condutor TVDE culpa a polarização pelo clima que sente no Porto. “Por vezes vejo-me a olhar para os imigrantes de forma diferente, mas eu não sou assim, nem quero ser assim, aqui no Porto não somos assim”, explica. “Os imigrantes são importantes para o país, mas há muita polarização política, as tais organizações antirracistas mais atrapalham do que ajudam, porque promovem a divisão”, complementa.

Entre os imigrantes, é mais difícil ainda que conversem com a imprensa. Um deles, relata que “sente medo” desde que as agressões contra imigrantes começaram. De nacionalidade indiana, trabalha na restauração, junto com outros estrangeiros, a maior parte brasileiros. “Gosto muito daqui e não quero ir embora”, adiantando que “possui visto” e que cumpre com todas as obrigações.

Um imigrante que o acompanhava apenas relatou que sente o mesmo que o amigo. Outro estrangeiro de Bangladesh, pontua que “ouviu [falar] dos casos de agressões”, mas que não sente medo. Elogia os portugueses e diz que “sempre o ajudaram”. Morador no Porto há 5 anos, está a ter aulas de Português e a trabalhar na construção civil.

O tema da insegurança relacionado com a imigração dominou a campanha para o Parlamento Europeu e já havia sido destaque nas Legislativas. Na semana passada, ao lançar o novo plano para as migrações, o primeiro-ministro Luís Montenegro disse que “não há nenhuma ligação direta entre a nossa capacidade de acolher imigrantes e aumentos de índices de criminalidade”. Para o líder do país, “há crimes cometidos por cidadãos portugueses e crimes cometidos por cidadãos estrangeiros”, rejeitando “episódios casuísticos” que permitem a estigmatização dos estrangeiros que vivem em Portugal.

amanda.lima@globalmediagroup.pt