Estados Unidos
09 fevereiro 2024 às 23h23
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“A minha memória está boa”. Relatório dá gás à questão da idade de Biden

Conselheiro especial considera que Biden reteve documentos classificados, mas abdicou de um julgamento porque ninguém iria condenar “um homem mais velho” e “com má memória”.

As preocupações em torno da idade e memória de Joe Biden, de 81 anos, ganharam uma nova dimensão esta quinta-feira depois de ser conhecido o relatório da investigação sobre a sua posse de documentos classificados. “A minha memória está boa”, afirmou o presidente dos Estados Unidos, em resposta às alegações do conselheiro especial, que, entre outras coisas, diz que o democrata mostrou uma “memória significativamente limitada” durante os interrogatórios realizados em 2023.

No seu relatório, Robert Hur afirma que Biden reteve e partilhou intencionalmente documentos confidenciais quando era vice-presidente, mas que optou por não avançar com um processo pois um júri teria dificuldade em condenar um “homem mais velho, amigável e bem-intencionado, com má memória”. “Baseada nas nossas interações diretas e em observações, ele é alguém a quem muitos jurados gostariam de dar o benefício da dúvida. Seria difícil convencer um júri de que deveriam condená-lo - então um antigo presidente bem nos seus oitentas - por um crime grave que requer um estado mental determinado”, pode ler-se nas conclusões do conselheiro especial. Hur é um republicano que trabalhou no Departamento de Justiça durante a Administração Trump, tendo sido nomeado pelo procurador-geral para conduzir esta investigação de forma a dar-lhe um grau de independência.

Não escondendo a sua indignação com as conclusões do relatório, o presidente dos Estados Unidos rejeitou a sugestão feita por Hur de que se tinha esquecido quando é que o seu filho Beau tinha morrido. “Como é que ele se atreve a dizer isto?”, questionou, afirmando que a descrição das memórias da morte do filho “não tinham lugar neste relatório”. “Francamente, quando ele fez a pergunta pensei para mim mesmo que não era nada que lhe dissesse respeito. (...) Não preciso que ninguém me lembre de quando é que ele morreu.”

Hur refere também que Biden se mostrou confuso por duas vezes sobre quando é que o seu mandato como vice-presidente tinha terminado e que tinha memórias distintas sobre um debate acerca do Afeganistão “tão importante para ele na altura”.

Joe Biden sublinhou ainda que uma das entrevistas que deu para a realização do relatório, e que teve uma duração de cinco horas, teve lugar a 8 e 9 de outubro, os dois dias seguintes ao ataque do Hamas contra Israel, lembrando que “estava a lidar com uma crise internacional”.

O presidente dos Estados Unidos também rejeitou a ideia de que tinha retido os documentos classificados “intencionalmente”, afirmando que esta ideia deixada pelo conselheiro especial é “enganosa e simplesmente errada” e sublinhou que ele devolveu os documentos classificados, ao contrário de Donald Trump, que se recusou a fazê-lo - o ex-presidente, que enfrenta dezenas de acusações federais no seu caso, diz que Biden está por detrás deste processo.

Os advogados do presidente norte-americano condenaram veementemente os comentários “inadequados”, argumentando que “este relatório utiliza uma linguagem altamente depreciativa para descrever o que acontece frequentemente às testemunhas: dificuldade em recordar acontecimentos que tiveram lugar há anos”.

Não serve para ser julgado, não serve para presidente

Joe Biden tinha, em teoria, motivos para contentamento pelo facto de saber que não vais ser processado. No entanto, os comentários feitos por Robert Hur sobre as suas capacidades mentais e a debilidade da sua idade causam grande dano na sua campanha de reeleição e representam armas de arremesso para Donald Trump e seus apoiantes, que há muito atacam as faculdades mentais e físicas do democrata.

Trump usou a sua plataforma Truth Social para comentar estes resultados, escrevendo, em maiúsculas que “isto provou que existe um Sistema de Justiça com dois níveis e um processo seletivo inconstitucional”, partilhando também dezenas de comentários feitos por apoiantes nas redes sociais.

Um deles, o líder da Câmara dos Representantes, Mike Johnson, referiu que “quando não temos as faculdades necessárias para sermos julgados (...), certamente não temos as faculdades necessárias para estar na Sala Oval”. Uma ideia replicada por dezenas de outros republicanos desde que foi conhecido o relatório.

Numa recente sondagem da NBC, 76% dos eleitores disseram estar preocupados com as capacidades físicas e mentais de Joe Biden para cumprir um segundo mandato, em comparação com apenas 48% relativamente a Donald Trump.

Olhando para esta sondagem, os americanos parecem menos preocupados com os 77 anos do republicano, conhecido pelos os seus momentos de confusão, mas que causam muito menos discussão do que as gaffes de Joe Biden, uma das suas imagens de marca há décadas - como referiu a revista Time  num artigo que publicou, quando este era vice-presidente, sobre os seus melhores erros e enganos - mas que agora são atribuídas à sua avançada idade.

ana.meireles@dn.pt