É “um misto”: ou se continua “numa atividade político-partidária” num espetro ideológico próximo, ou quem mudou não se sentiu “reconhecido pelo seu partido”, neste caso o PSD. Isso levou a que vários nomes ligados aos sociais-democratas tenham passado para o lado mais à direita da barricada, o do Chega. A análise é feita por Paula do Espírito Santo, investigadora no Instituto de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) de Lisboa.
A professora afirma que não haverá “explicações muito para lá” destas duas. Mas acrescenta uma terceira: a juventude do Chega enquanto partido. Isso faz com que “também procure quadros ou figuras” já experimentadas a nível político. Isso, aliado à necessidade que o partido de André Ventura poderá ter de mostrar que “há suficiente proximidade ideológica para também atrair antigos quadros do PSD”, acabaram por levar, entre outros, os ex-deputados sociais-democratas Tiago Moreira de Sá (que será o número 2 às Europeias de junho) e Rui Cristina (que foi eleito como cabeça-de-lista por Évora) a mudar de ares. Antes deles - e vindos de outros partidos - já Cristina Rodrigues (ex-deputada do PAN) ou Nuno Simões de Melo (ex-Iniciativa Liberal) tinham passado para as hostes do Chega. O caso mais recente foi o de Lina Lopes, ex-deputada do PSD. Apesar de não ter entrado para um lugar parlamentar, foi nomeada para o gabinete de Diogo Pacheco de Amorim, deputado do Chega que foi eleito vice-presidente da Assembleia da República no início da legislatura.
Não é isto contraditório com o discurso apresentado por André Ventura, que quer caçar e terminar com os ‘tachos’ políticos? O Chega, defende Paula do Espírito Santo, “tem uma coerência muito precária”. Dura enquanto “a finalidade ou o objetivo não são atingidos” e, depois disso, “rapidamente acaba por ter essa plasticidade ideológica e política”, tendo a função de “atingir determinadas metas”. Resumindo: “É um meio para atingir um só fim”, que passa pela continuidade na vida política.
André Freire, investigador no ISCTE, relembra que fenómenos como este “não são novos”. “Nas primeiras décadas da democracia portuguesa” houve vários. Muitas delas ligadas a “uma mudança de orientação ideológica”, traduzidas numa divisão entre protagonistas, com temas mais fraturantes (como posições sobre o Muro de Berlim, por exemplo). “Nesses casos, isso era conhecido”. Algo que, agora, não aconteceu. Ou seja: “Estes casos podem sugerir que os interesses de carreira se podem sobrepor a tudo o resto”. Afinal “não se ouviu” nenhuma dissidência crítica “deste ou daquele deputado”.
Estas “incursões” têm, depois, um outro efeito. O investigador explica que “não são só pela qualidade das pessoas”. É muito mais “espetar uma lança, penetrar no terreno do adversário e provocar uma sangria de votos” do PSD para o Chega.