Concertação Social
11 setembro 2024 às 07h00
Atualizado em 11 setembro 2024 às 05h55
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Patrões rejeitam subida do salário mínimo “por decreto” e pedem redução da carga fiscal

Confederações patronais defendem que subida do salário mínimo deve ser acompanhada de medidas fiscais para as empresas. Sindicatos pedem que aumentos vão além dos 855 euros no próximo ano.

O aumento da Retribuição Mínima Mensal Garantida (RMNG)é um dos temas quentes que irá marcar o encontro de hoje entre o Governo e os parceiros sociais. A um mês de entregar o Orçamento do Estado para o próximo ano, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, e a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Maria do Rosário Ramalho, discutem, na Comissão Permanente de Concertação Social, as perspetivas económicas para 2025 e o acordo de rendimentos.

Os sindicatos dizem que é imperativo reforçar os rendimentos do trabalho, com um salário mínimo a avançar para valores entre os 890 euros e os mil euros no próximo ano. Já do lado dos patrões, a postura é de cautela, com as confederações a alertarem para a necessidade de uma análise prévia ao dossier fiscal e à conjuntura económica.

“Precisamos de soluções para a economia crescer e se, nesta reunião, o objetivo for discutir o salário mínimo isoladamente e sem contexto, então estamos a discutir uma economia de mínimos”, alerta o presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP). Armindo Monteiro defende que a evolução dos salários deve ser analisada em linha “com o crescimento da economia e não por decreto e por imposição” e acredita que para equilibrar a balança é preciso baixar impostos.

“Se em cada 100 euros de aumento, 55 euros vão para os cofres do Estado, não adianta aumentar salários. No fundo, estaremos a discutir qual será o aumento da receita do Estado, é uma agenda encapotada. Se o objetivo é aumentar os salários, então que sejam os trabalhadores os principais beneficiários dessa medida”, aponta. O dirigente irá levar para a Concertação Social propostas para apresentar ao Executivo e, embora não queira deslindar o teor antes da reunião, adianta que estão assentes em três pilares: simplificação administrativa e desburocratização, crescimento económico e aumento do rendimento dos trabalhadores.

A CIP colocará ainda em cima da mesa a proposta-base apresentada no ano passado, no Pacto Social, para a criação de um 15º mês isento de impostos. Ou seja, as empresas poderão proceder ao pagamento voluntário de um salário-extra até ao limite da remuneração-base sem incidência de IRS e exclusão da base de incidência contributiva em sede de Segurança Social.

Apesar de a medida ter sido adotada pelo anterior Executivo, a Autoridade Tributária englobou este extra para efeitos do cálculo da taxa de IRS a pagar. “Esta medida é importante porque, isentando custos sobre este salário, estamos convencidos de que é uma forma de pôr dinheiro no bolso das pessoas e não no bolso do Estado”, justifica Armindo Monteiro.

O dirigente espera que não existam “preconceitos de base” sobre a proposta que permitirá, afiança, “subir os rendimentos dos trabalhadores sem que isso agrave o excesso de custos sobre o trabalho em Portugal”.

Recorde-se que o atual acordo de rendimentos, que foi assinado pelo anterior Executivo socialista em 2022 e revisto no final do ano passado - e do qual ficaram de fora a CIP e CGTP - prevê uma atualização do Salário Mínimo Nacional em 2025 para os 855 euros, um aumento de 35 euros face aos atuais 820 euros. O Governo de Luís Montenegro apontou já a intenção de chegar aos mil euros em 2028 com aumentos graduais durante a legislatura. O salto previsto para o próximo ano pode ficar acima do estabelecido no acordo de rendimentos, fixando-se em 860 euros, conforme noticiou ontem o jornal online Eco.

Contactado, o gabinete de Maria do Rosário Ramalho remeteu explicações sobre esta matéria para o final da reunião com os parceiros sociais.

O presidente da Confederação do Turismo de Portugal (CTP) rejeita uma discussão de valores sem fundamento. “Não se pode chegar e dizer que agora vão ser 850 euros ou 900 euros. Porquê? É preciso justificar, não se pode definir salários por decreto. Têm de ser definidos através de indicadores concretos, sejam eles a inflação, o crescimento económico ou a produtividade”, enumera.

Francisco Calheiros está confiante, ainda assim, em que, caso o Governo decida ir além do acordo de rendimentos, apresente “medidas que permitam a mitigação dos impactos para as empresas”. O representante dos patrões do turismo volta a insistir na necessidade de uma reforma do Estado que permita “diminuir a despesa pública e motivar uma baixa profunda em termos de IRS e IRC”.

Já para João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), a principal preocupação na reunião de Concertação Social é perceber as medidas do Governo no capítulo dos impostos, relembrando que urge mexer no IRC e baixar as taxas de tributação autónomas. “A carga fiscal sobre as empresas é alta e para haver condições para subidas significativas de salários, temos de perceber quais são as medidas fiscais que o Governo pretende colocar neste Orçamento do Estado”, indica.

Do lado dos sindicatos, a CGTP é perentória a afirmar que o aumento da RMMG definida no acordo de rendimentos “fica aquém” do necessário. “Há trabalhadores que, no último ano, viram a sua prestação da casa subir 400 euros. Como é que temos coragem de lhes dizer que este acordo só prevê um aumento de 35 euros?”, questiona o secretário-geral da CGTP.

Tiago Oliveira reitera a proposta já apresentada pela estrutura sindical de avançar com um salário mínimo de 910 euros em janeiro de forma a conseguir, progressivamente e até ao final do ano, atingir os mil euros. “Este ano tivemos um aumento do Salário Mínimo Nacional de 60 euros e, agora, com o brutal aumento do custo de vida a proposta que está em cima da mesa é inferior. Isto é a degradação completa das condições de vida de quem trabalha e esperamos solidariedade na reunião de hoje”, acusa.

Por outro lado, o secretário-geral adjunto da UGT, Sérgio Monte, desafia o Governo a avançar para um salário mínimo de 890 euros e alerta para o cumprimento da neutralidade fiscal, de forma a garantir que os trabalhadores, ao serem aumentados, não percam rendimentos líquidos em caso de mudança de escalão.

rutesimao@dinheirovivo.pt