Gisele P., uma mulher francesa atualmente com 71 anos, terá sido violada por 51 homens, recrutados pelo próprio marido, durante uma década, entre 2011 e 2020.
Dominique está acusado de abusar sexualmente da sua mulher, drogando-a com comprimidos para dormir e depois recrutando dezenas de estranhos para a violar, disse esta quarta-feira em tribunal o investigador principal Jeremie Bosse Platiere, durante o julgamento.
Dominique P. foi exposto por acaso quando foi apanhado a filmar saias femininas num supermercado local.
Na terça-feira, respondeu “sim” quando questionado se era culpado das acusações que lhe eram imputadas.
O pai de três filhos, de 71 anos, documentou as suas ações com uma precisão meticulosa num disco rígido com uma pasta chamada “abuso”.
Isto permitiu à polícia francesa localizar mais de 50 homens suspeitos de violarem Gisele P. enquanto esta estava drogada. Um terço deles foi identificado através de software de reconhecimento facial, afirmou Bosse Platiere.
O chefe da polícia da região dos Altos Alpes disse que escolheu a dedo os investigadores “que tiveram estômago” para enfrentar vídeos e imagens de abusos.
A polícia elaborou uma lista de 72 indivíduos suspeitos de abusar de Gisele P. Os investigadores contaram cerca de 200 casos de violação, a maioria deles cometidos por Dominique P., e mais de 90 por estranhos recrutados através de um site para adultos.
As agressões ocorreram entre julho de 2011 e outubro de 2020, maioritariamente na casa do casal em Mazan, uma aldeia de 6000 habitantes na região sul da Provença.
A mulher disse esta quinta-feira, durante o julgamento, que a polícia a salvou ao descobrir os crimes. “A polícia salvou-me a vida ao investigar o computador do senhor P.”, disse Gisele P. ao tribunal da cidade de Avignon, no sul do país, referindo-se ao marido – um dos 51 dos seus alegados agressores em julgamento.
Gisele P. manteve-se estóica e silenciosa durante os primeiros três dias do caso, que está a ter grande impacto em França, comunicando apenas através dos seus advogados, mas revelou a sua emoção no depoimento desta quinta-feira, quando contou o momento, em novembro de 2020, em que os investigadores lhe mostraram pela primeira vez as imagens de uma década de abusos sexuais orquestradas e filmadas pelo marido.
"O meu mundo está a desmoronar-se. Para mim, tudo está a desmoronar-se. Tudo o que construí ao longo de 50 anos", disse Gisele P.. “Francamente, estas são cenas de horror para mim”, afirmou sobre as fotos, enquanto o marido ouvia com a cabeça baixa. “Estou deitada imóvel na cama, a ser violada”, acrescentou a mulher acerca da filmagem “bárbara”.
“Trataram-me como uma boneca de trapos”, disse a um painel de cinco jurados, acrescentando que só teve coragem de assistir às filmagens em maio de 2024. “Não me falem de cenas de sexo. São cenas de violação”, disse, sublinhando que nunca praticou swing ou qualquer outra forma de sexo extra-conjugal.
Os advogados de alguns dos arguidos questionaram na quarta-feira se o casal tinha tido uma relação aberta ou se era credível que Gisele P. não tivesse notado nada durante toda a década de abusos.
A linha de interrogatório pareceu perturbar a queixosa, embora esta tenha permanecido onde estava enquanto os seus três filhos abandonaram brevemente o tribunal, enojados. “É claro que ela ficou ofendida”, disse o seu advogado, Antoine Camus.
"Ela queria responder. Sentimo-la a balançar para cima e para baixo atrás de nós, dizendo: 'Quero responder. Só tenho de responder' e dissemos-lhe: 'Amanhã!'"
Gisele P. insistiu que o julgamento fosse realizado em público para que todos os factos do caso pudessem surgir.
No entanto, haverá “momentos extremamente difíceis” para ela enquanto testemunha, disse Stephane Babonneau, o seu outro advogado.
O julgamento deverá durar quatro meses, até 20 de dezembro – “uma provação totalmente terrível” para Gisele P., disse Camus. “Pela primeira vez, terá de sobreviver às violações a que foi sujeita durante 10 anos”, das quais “não tem memória”, disse à AFP.
A maioria dos suspeitos pode enfrentar até 20 anos de prisão por violação agravada se forem condenados. Dezoito dos 51 acusados estão sob custódia, incluindo Dominique P. 32 outros réus participam no julgamento como homens livres. O último suspeito, ainda em fuga, será julgado à revelia.