A partir de 1 de janeiro do próximo ano, todos os Estados-membros terão de assegurar a recolha seletiva de têxteis, vestuário e artigos de moda, como o calçado, chapéus e outros acessórios. Tendo em vista suportar os custos desta recolha, triagem e reciclagem, as instâncias comunitárias admitem que sejam os produtores a pagar uma taxa pelos artigos que colocam no mercado. Mário Jorge Machado, presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal (ATP) e recém-eleito líder da confederação europeia do setor, a Euratex, aplaude a iniciativa e assume que a ATP está a preparar, em conjunto com outras associações, uma candidatura para entidade gestora destes resíduos, à semelhança do que a Sociedade Ponto Verde faz em relação às embalagens e plásticos.
“Caminhamos para uma economia circular e este é um passo muito grande que está a ser dado. Hoje, cerca de 70% dos artigos que chegam ao seu final de vida são incinerados, vão para aterro ou acabam numa montanha de lixo algures em África ou na América latina”, diz Mário Jorge Machado, explicando que a ATP está em conversações com outras associações do setor e da distribuição para criar uma entidade gestora conjunta de modo a organizar este processo.
“A recolha e triagem têm de ser feitas em moldes que permitam que as matérias-primas possam vir a ser reutilizadas na fileira produtiva. Temos muita fibra na Europa que era destruída e que agora podemos vir a incorporar nos processos produtivos. É um novo modelo de negócio, quase inexistente, mas o futuro do setor e o futuro da economia dentro do setor têxtil vai passar muito pela reutilização e pela circularidade”, frisa.
O presidente da ATP e da Euratex reconhece que nem todas as soluções tecnológicas estão já inventadas, defendendo, por isso, a “importância de haver financiamento para a investigação” no setor que permita criar soluções para a reutilização do que já não se quer.
Para já, diz Mário Jorge Machado, o tema está a ser estudado, sendo que o objetivo é avançar com uma candidatura à atribuição de uma licença de gestão de resíduos após as férias de verão. Sendo certo que o processo terá de ser suportado pelos fabricantes.
Isso mesmo deliberou o Conselho Europeu, que recentemente adotou uma posição sobre a revisão da Diretiva-Quadro de Resíduos, prevendo que, no caso dos têxteis e artigos de moda, a responsabilidade alargada do produtor inclua as microempresas e também que os Estados-membros possam cobrar mais às marcas da fast fashion.
“Cada produtor, quando coloca o seu produto no mercado, vai ter de pagar um determinado valor para assegurar a sua recolha e reciclabilidade em fim de vida. É o que hoje acontece com as embalagens e a Sociedade Ponto Verde”, explica o também presidente da Euratex.
O que significa que o custo da recolha e reciclagem acabará, naturalmente, refletido no preço final de vendas dos artigos. No entanto, Mário Jorge Machado frisa que a forma como um produto foi produzido, em termos de sustentabilidade social e ambiental, tem também de ser refletida no seu custo.
Ou seja, a fast fashion tem de pagar mais. “Se não há um custo na produção, há um custo para o planeta. Não podemos permitir que alguém produza recorrendo ao carvão, o que o torna mais competitivo por isso, quando nós usamos energias renováveis e temos o nosso produto mais caro por isso e depois o consumidor prefere um artigo fabricado com energias fósseis do que com energias renováveis”, diz, sublinhando que “tem de haver aqui também uma ecomodelação dos produtos que chegam ao mercado”.
Recorde-se que, em março, o Parlamento Europeu aprovou a sua posição sobre a proposta de revisão da Diretiva-Quadro de Resíduos, que existe desde 2008, por 514 votos a favor, 20 votos contra e 91 abstenções, propondo, precisamente, que sejam alargados os regimes de responsabilidade do produtor, através dos quais os produtores que vendem têxteis na UE deveriam cobrir os custos de recolha, triagem e reciclagem separadamente.
Por ano, a UE produz 12,6 milhões de toneladas de resíduos têxteis, dos quais o vestuário e o calçado representam 5,2 milhões de toneladas. São 12 quilos de resíduos por pessoa por ano. Estima-se que menos de 1% de todos os têxteis em todo o mundo sejam reciclados em novos produtos.
Entretanto, já em junho, foi a vez de o Conselho Europeu adotar a sua posição relativamente à revisão da diretiva. Até ao final de 2028 a Comissão Europeia considerará a definição de metas específicas para a prevenção de resíduos, a recolha, a preparação para a reutilização e a reciclagem no setor têxtil.