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15 setembro 2024 às 00h17
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Isaltino de Morais. “Ligações entre Lisboa, Oeiras e Sintra estão em risco de perder milhões do PRR”

Isaltino de Morais acusa o executivo de Moedas de indefinição e falta de liderança no projeto LIOS, que passou de metro ligeiro a metrobus e ainda não tem nem data nem projeto definitivo. Em risco está também a ligação de Oeiras a Sintra em corredor BUS, que depende do Governo, diz o autarca, em entrevista.

Oeiras é o único município da Área Metropolitana de Lisboa, para além da capital, que todos os dias recebe quase tantas pessoas para trabalhar como as que saem. Para fora vão entre 57 e 58 mil por dia e entram perto de 50 mil, vindos de Lisboa, Sintra, Amadora ou Cascais em direção aos vários parques empresariais do concelho, disse o presidente da Câmara Municipal de Oeiras, Isaltino de Morais, em entrevista.

“Temos uma grande pressão de pessoas e carros vindos de outros municípios, quase 30% de Lisboa”. E é por isso que “os projetos para melhorar a mobilidade e os eixos em transporte público entre os municípios, como o LIOS ou o SATU, são críticos para o município, para milhares de pessoas e para o ambiente”, assume o autarca do concelho com o segundo maior Produto Interno Bruto do país.

Em causa no LIOS (Linha Intermodal Ocidental Sustentável) está o projeto inicial de metro ligeiro de superfície a ligar Alcântara, Algés e Cruz Quebrada, -mas sem ser em linha reta, para atravessar Linda-a-Velha, Miraflores e Restelo. Mas o projeto, com modificações várias, não está a andar ao ritmo desejado, sobretudo se o objetivo for também aproveitar os fundos do PRR (Programa de Recuperação e Resiliência), alerta Isaltino de Morais. O objetivo inicial era a articulação com a extensão da Linha Vermelha do Metro de Lisboa até Alcântara e com a extensão do elétrico 15E da Carris, desde Algés ao Jamor.

“Já tivemos duas ou três reuniões com o Carlos Moedas, mas parece que a visão de agora não é a mesma e há aqui um problema de liderança _ é o Metro ou a Câmara Municipal de Lisboa que decide?”, questiona Isaltino.

Diálogo com CML bloqueado

Com efeito, o vice-presidente da CML com o pelouro da mobilidade, o centrista Filipe Anacoreta Correia, admitiu em fevereiro a possibilidade de o metro ligeiro de superfície passar a metrobus BRT (autocarro em corredor dedicado) a operar pela Carris (e não pelo Metro, como se previa), introduzindo-se uma maior flexibilidade, capaz de servir outras zonas residenciais, nomeadamente no concelho de Oeiras. Todavia, “o diálogo técnico e institucional mantido com o município de Lisboa encontra-se obstaculizado, devido a uma alegada falta de informação que deverá ser prestada por diversos operadores de transportes, tais como a TML, a Carris ou o Metropolitano de Lisboa”. Esta era, pelo menos, a situação invocada em julho, e é vista com alguma incredulidade pelo executivo de Oeiras.
Isaltino diz que, “com esta indefinição, o acesso aos fundos do PRR pode estar em risco, se não se abrir o concurso para a obra já no próximo ano”. Apesar de o PRR vigorar até final de 2026, “se o processo estiver em andamento, julgo que ainda iríamos a tempo de aceder àquelas verbas”, disse o autarca. Se estiver bloqueado, não.

Já passaram quatro anos desde o protocolo de colaboração firmado entre os municípios de Oeiras, Lisboa e Loures, bem como pela Carris e pelo Metropolitano de Lisboa. Esse protocolo foi revisto em 2021, com a definição da repartição de encargos a reembolsar ao Metropolitano de Lisboa pelos custos suportados com a realização dos estudos necessários à concretização do projeto, cabendo a Oeiras um total de 503.481 euros.

Apesar de Oeiras ter comparticipado o investimento inicial, os estudos previstos não foram realizados na sua totalidade, razão pela qual a empresa municipal de Oeiras com o pelouro da mobilidade, Parques Tejo, encomendou um estudo de soluções para um corredor em Oeiras, com versões comparativas entre BRT e elétrico rápido. De acordo com as suas conclusões, entregues em abril, “a solução BRT traduz um conjunto de vantagens, entre elas a de acarretar um menor investimento em infraestrutura, uma maior integração com a malha urbana, e maior facilidade de articulação com outras soluções”. Como desvantagens, tem “menor capacidade de transporte em comparação com o modo ferroviário, além de acarretar vários constrangimentos por via da eliminação de estacionamento e de faixas de rodagem”. Para esta solução, as estimativas de custos rondam um valor entre os 54,5 a 56, 5 milhões de euros, só a cargo do município de Oeiras.

Já a solução élétrico rápido teria uma “melhoria da eficiência e qualidade do serviço, a par da maior capacidade de transporte e da elevada velocidade comercial, mas investimentos mais avultados em infraestruturas e material circulante, bem como as condicionantes de integração do traçado em áreas urbanas consolidadas”. Não foi feita estimativa concreta de custos para esta solução.

País tem de saber captar fundos

A propósito da necessidade de o país captar fundos para investimentos estruturantes, Isaltino de Morais defende que na reta final do PRR, “era altura de o Governo fazer um levantamento dos projetos em curso, em obra e dos que ainda podem entrar”, e encarregar um secretário de Estado de os acelerar. Mas, “como somos sempre mais papistas que o Papa, há um excesso de regulamentação no PRR”, embora, diz, “parece que o Governo já o terá percebido e esteja a procurar uma maior flexibilidade para conseguir gastar o dinheiro disponível, nomeadamente para o setor da habitação”.

Outro projeto de mobilidade que Oeiras pretende acelerar é o da ligação do concelho a Sintra – que não existe – passando pelos três grandes parques empresariais, por meio de um corredor dedicado ao transporte público, através da reativação do SATU. O Sistema Automático de Transporte Urbano deu os seus primeiros passos em 2001 em formato monocarril, mas esteve suspenso mais de dez anos, com um complexo processo que resultou na extinção da empresa, e vai agora ganhar uma nova vida em versão autocarro, revelou o autarca.

“É um projeto que tem um custo avaliado em 90 milhões de euros, mas, tudo indica que vamos perder milhões em fundos comunitários, só depende do Governo” diz o autarca.

“Não é lamentável que um projeto desta natureza não tenha programação? Que alguém que queira ir de Sintra para Cascais tenha de ir ao Rossio ou Entrecampos? Alguém duvida da bondade deste projeto, que poderia facilitar a ligação de cerca de 40 mil pessoas por dia entre a linha de Cascais e a Linha de Sintra, sem necessidade de usar carro?”

Segundo Isaltino, a velocidade a dar a este projeto só depende do Governo. “Toda a gente conhece o projeto. O Governo fica a saber que a Câmara  de Oeiras e Sintra têm capacidade para abrir concurso de imediato”. Os projetos para a obra já estão feitos, garante.

Isaltino de Morais considera que a administração central, e local também, padecem de uma “grande falta de planeamento a longo prazo”. E aponta o exemplo de três grandes obras estruturantes que estão previstas, como o novo Aeroporto de Lisboa, o TGV e a nova ponte sobre o Tejo. “É algo que vai ter implicações profundas no ordenamento de toda a Área Metropolitana de Lisboa. E eu pergunto: não há nenhuma alteração ao plano de ordenamento da AML, fica tudo na mesma?”