Na sua análise anual ao setor, a OIV destaca que a produção mundial de vinho foi, no ano passado, a mais baixa desde 1961. Terão sido produzidos cerca de 237 milhões de hectolitros de vinho no mundo, menos 10% do que no ano anterior, fruto de dificuldades relacionadas com eventos climáticos extremos e de doenças na vinha.
Menos vinho, numa altura em que o consumo mundial volta a cair, não é mau de todo, não fosse o facto de Portugal, em contraciclo, ter aumentado a sua produção em 9,8% para 7,5 milhões de hectolitros. Os excedentes continuam a ser um problema para os produtores nacionais.
O presidente do IVV refere que as autoridades portuguesas têm tentado encontrar “medidas excecionais” junto de Bruxelas para ajudar a fazer face aos excedentes, mas reconhece que não tem sido fácil. Por um lado, porque estamos em contraciclo, “estamos um pouco sozinhos nesta matéria”. Por outro, já foram feitas três destilações de crise nos últimos quatro anos em Portugal, e como a Comissão Europeia “olha para as destilações de crise como uma intervenção, que vai contra as regras do mercado livre, não está a facilitar esse tipo de medidas novamente”.
Qual a solução, então? “Tem de haver um grande apoio à promoção e uma agressividade maior do país em explorar novos mercados e novos segmentos de mercado que consigam absorver grandes volumes”, defende Bernardo Gouvêa.
O presidente da ViniPortugal concorda: “É preciso apostar mais em promoção, temos de abrir novos mercados que valorizem os vinhos portugueses e encontrar saídas para ajudar os produtores nacionais.”
Consumo em queda
A verdade é que a conjuntura não ajuda. O consumo mundial voltou a cair: 2,6% face a 2022, ano em que já havia sido baixo, diz a OIV. No total, terão sido consumidos, 221 milhões de hectolitros, menos seis milhões do que no ano anterior, fruto das pressões inflacionistas.
E, na Europa, Portugal foi dos países onde o consumo mais caiu: passou de 6,1 milhões para 5,5 milhões de hectolitros, uma quebra de 9,2%, equivalente, em termos relativos, à perda dos Países Baixos, igualmente assinalados pela OIV, em termos de redução nos gastos com vinho. A diferença, refere a própria OIV, é não só ao nível do tamanho do mercado - os Países Baixos passaram de 3,6 para 3,3 milhões de hectolitros -, mas também da realidade do ponto de partida de cada um. É que, embora a perda portuguesa tenha sido grande em 2023, o consumo total ficou, ainda assim, acima da média dos últimos cinco anos.
A quebra de rendimentos das famílias, por via da subida da inflação e das taxas de juro, ajuda a compreender grande parte dessa quebra. “Sente-se na distribuição, sinal de que a carteira dos portugueses está em dificuldades, e sente-se nos restaurante, embora aí o turismo esteja a compensar”, diz Frederico Falcão.
E, por isso, Portugal mantém, ainda assim, o título de campeão mundial no consumo per capita de vinho, com uma média de 61,7 litros per capita (contra os 67,5 litros de 2022), bem longe dos 45,8 litros de França e os 42,1 litros de Itália.
“O nosso consumo per capita, na realidade, não é esse. O turismo conta sempre para esse consumo, mas há dois fatores que enviesam a análise: é que o turismo em Portugal tem uma proporção superior face à população, comparativamente com outros países - em 2023 teremos tido 30 milhões de hóspedes - , e os turistas em Portugal consomem muito mais vinho do que nos outros países, porque os nossos preços são muito mais baratos”, explica o presidente do IVV, sublinhando que a questão já foi abordada com o INE e com a OIV. “Não conseguimos alterar a fórmula do INE, mas isso não exprime o consumo per capita da população portuguesa e é um problema porque dá imensos argumentos ao lobby da saúde”, frisa.
ilidia.pinto@dinheirovivo.pt