Morreu um homem infetado em Bragança
23 agosto 2024 às 12h41
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Detetado em Portugal primeiro caso de Febre Hemorrágica da Crimeia-Congo. "Caso raro e esporádico"

O primeiro caso foi detetado em Bragança. Doente não resistiu. DGS "esclarece que não há risco de surto nem de transmissão de pessoa para pessoa, evidenciando que se trata de um caso raro e esporádico".

Foi detetado em Portugal o primeiro caso de Febre Hemorrágica da Crimeia-Congo, avança esta sexta-feira a SIC Notícias, dando conta que a doença foi diagnosticada num idoso com mais de 80 anos, que acabou por morrer no Hospital de Bragança.

A informação já foi confirmada pela Direção-Geral da Saúde (DGS), referindo que o caso foi identificado a 14 de agosto.

"A DGS, comprometida com a transparência e a comunicação oportuna, esclarece que não há risco de surto nem de transmissão de pessoa para pessoa, evidenciando que se trata de um caso raro e esporádico", indica a autoridade da Saúde, em comunicado, ao confirmar o caso de Febre Hemorrágica da Crimeia-Congo (FHCC) em Portugal.

"O caso, num indivíduo com mais de 80 anos de idade, de nacionalidade e naturalidade portuguesa, residente no distrito de Bragança, que realizou atividades agrícolas durante o período de incubação, teve início de sintomas a 11 de julho de 2024, tendo sido admitido no Hospital de Bragança por sintomatologia inespecífica e acabou por falecer", refere a nota da DGS.

O diagnóstico de febre hemorrágica Crimeia-Congo foi feito já depois da morte do idoso. "As amostras biológicas foram testadas, post mortem, para vários agentes, incluindo o vírus da FHCC, com resultados positivos a 14/08/2024, pelo laboratório de referência nacional - Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA)".

Explica a DGS que a Febre Hemorrágica da Crimeia-Congo é uma doença transmitida pela picada de "carraças infetadas pelo vírus, nomeadamente as da espécie Hyalomma lusitanicum e Hyalomma marginatum que se encontram dispersas em diferentes municípios do país".

A FHCC está sobretudo presente em duas espécies de carraças que se encontram dispersas por várias regiões do país, nomeadamente Trás-os-Montes, no Centro interior e no Alentejo, em especial na zona litoral.

"O vírus que causa a Febre Hemorrágica da Crimeia-Congo (FHCC) não foi detetado, até agora, em carraças na rede de vigilância entomológica REVIVE [Rede de Vigilância de Vetores], o que indica que o risco para a população é reduzido", refere ainda a nota assinada pela diretora-geral da Saúde, Rita Machado.

É ainda indicado que os dados do REVIVE de 2023 identificaram uma ligeira redução "na abundância de ambas as espécies [Hyalomma lusitanicum e Hyalomma marginatum] em comparação com o ano anterior, não tendo sido identificada a presença o vírus da FHCC ou outros agentes patogénicos nas carraças colhidas, até ao momento".

"Perante o alerta", após o diagnóstico da doença, as autoridades de Saúde deram início a uma investigação epidemiológica e à implementação de medidas, incluindo a identificação de contactos.

"Da investigação epidemiológica realizada, o caso não tinha histórico de viagem para fora do país, tendo participado em algumas atividades ao ar livre na área de residência. Não foram identificados contactos com eventuais sintomas nem casos adicionais da doença", diz a DGS.

Autoridades de saúde recolhem carraças após primeiro caso de Febre Hemorrágica da Crimeia-Congo detetado em Bragança

Estão também em curso "as investigações entomológicas reforçadas para recolha de carraças no distrito de residência do caso, em articulação com as Autoridades de Saúde e o INSA, assim como o seu estudo sobre a eventual deteção de carraças infetadas com o vírus FHCC". 

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a Febre Hemorrágica da Crimeia-Congo "é uma doença causada por um vírus transmitido por carraças (Nairovirus) da família Bunyaviridae. O vírus causa surtos graves de febre hemorrágica viral, com uma taxa de letalidade de 10–40%".

A OMS refere que se trata de uma doença endémica em algumas zonas do planeta, como África, Balcãs, Médio Oriente e em alguns países asiáticos.

"Os hospedeiros do vírus da FHCC incluem uma vasta gama de animais selvagens e domésticos, como bovinos, ovinos e caprinos. Muitas aves são resistentes à infeção, mas as avestruzes são susceptíveis e podem apresentar uma elevada prevalência de infeção em zonas endémicas", ainda segundo a OMS.

O vírus da FHCC "é transmitido às pessoas através da picada de carraças ou através do contacto com sangue ou tecidos de animais infetados durante e imediatamente após o abate", refere também a agência da ONU.

A DGS explica que os sintomas habituais incluem "febre de instalação súbita, dor de cabeça, dores musculares, podendo ocorrer também diarreia, náuseas, vómitos ou conjuntivite".

É referido também que a "duração do período de incubação depende do modo de contágio do vírus e da carga viral, podendo ocorrer entre 1 a 3 dias (máximo 9) após a picada da carraça ou 5 a 6 dias (máximo 13 dias) após contacto com sangue ou tecidos infetados". "A doença requer cuidados médicos especializados, devido ao potencial de evolução rápida de agravamento de sintomas e sinais", aconselha a DGS. 

Recomendações da DGS

Perante a deteção do primeiro caso da doença, a DGS recomenda medidas da prevenção da picada de carraças.

Em "atividades na natureza em zonas propícias ao risco de exposição a carraças", recomenda-se, por exemplo, a "utilização de roupas de cores claras para que as carraças possam ser vistas e removidas mais facilmente; o uso de vestuário de mangas e calças compridas e calçado fechado"

"Poderá ser, também, equacionada a utilização de repelente de insetos no vestuário e proteger a pele com produtos que contenham DEET (N,N-dietil-m-toluamida), em áreas de risco", diz a autoridade nacional de Saúde.

É ainda recomendado que "em passeios no campo", se deve "caminhar, se possível, pela zona central dos caminhos, para evitar o contato com a vegetação, devendo verificar a roupa e o corpo relativamente à presença de carraças".

Após as atividades na natureza, inspecionar a roupa, a pele e o couro cabeludo e "remover eventuais carraças, se estas estiverem agarradas, deve recorrer aos serviços de saúde para que sejam retiradas de forma adequada e ficar atento ao aparecimento de sinais e sintomas, devendo ligar para o SNS24 para ser orientado para serviços de saúde com sinalização prévia".  

De acordo com a DGS, "a deteção de casos de FHCC na Europa tem vindo a aumentar nos últimos anos, em especial no contexto de aumento das temperaturas médias no sul da Europa e em Portugal, propícias à multiplicação de vetores".

Desde 2013, foram identificados em Espanha 16 casos, "os dois últimos em abril e junho de 2024, em comunidades fronteiriças com Portugal. Em 2020 tinham sido detetadas em Espanha, carraças Hyalomma lusitanicum e Hyalomma marginatum com o vírus de FHCC".

No ano passado, em França, nos Perinéus, "foram detetadas carraças H.marginatum infetadas com vírus da FHCC", informa o comunicado.

Na nota é referido que a DGS, assim como seus parceiros, "permanecem atentos e continuarão a acompanhar a evolução da situação e a atualizar as orientações técnicas para os profissionais de saúde a nível das unidades de saúde pública e dos serviços de prestação de cuidados para melhor deteção, diagnóstico, abordagem terapêutica e proteção de contactos de casos suspeitos".

Tópicos: Doença, DGS