Custo do crédito
08 março 2024 às 08h10
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Economia europeia já está paralisada, mas BCE diz que só pode descer juros em junho

Questionada sobre quando vai começar a descer taxas, Christine Lagarde respondeu que “precisamos claramente de mais provas, de mais detalhes”. A economia da Zona Euro deverá crescer 0,6% este ano.

A economia da Zona Euro já está paralisada, estagnou no quarto trimestre de 2023, e a previsão para 2024 é que avance apenas 0,6%, revelou ontem o Banco Central Europeu (BCE). Mas, ainda assim, a autoridade presidida por Christine Lagarde mostra-se insatisfeita com os valores da inflação (demasiado alta, acima de 2%, embora para lá caminhe) e, assim, faz questão de jogar pelo seguro e manter o aperto no custo do crédito, devendo começar a reduzir finalmente as taxas de juro apenas em junho, deu a entender Lagarde e confirmaram vários economistas.

Assim, as três taxas de juro diretoras do BCE ficaram inalteradas nos atuais máximos. O banco central revelou ainda que o crescimento económico europeu vai fraquejar ainda mais do que se pensava, mas, pelos vistos, os preços podem cair mais depressa, e perfila-se que o BCE possa cantar vitória mais cedo, pois deve chegar ao objetivo de inflação de 2% já em 2025, segundo as novas previsões.

A taxa de juro central de refinanciamento cobrada aos bancos comerciais da Zona Euro continuará, com altíssima probabilidade, até ao início do verão (junho), num dos valores mais elevados de sempre, em 4,5% (está neste nível desde setembro do ano passado), o que se traduz em meio ano de aperto máximo nas condições de crédito às famílias e empresas. A taxa de depósito do BCE mantém-se em 4%. A taxa marginal de empréstimos em 4,75%.

Questionada sobre quando pode então começar a descida dos juros, Lagarde respondeu que “precisamos claramente de mais provas, de mais detalhes”. “Saberemos um pouco mais em abril, mas saberemos muito mais em junho”.

Carsten Brzeski, o macroeconomista-chefe do grupo ING, diz que “a reunião do BCE foi clara e bem estruturada, com uma mensagem inequívoca de que, por enquanto, é demasiado cedo para discutir reduções de taxas, mas que chegará o momento de o fazer. Pensamos que será em junho”.

A equipa de analistas do Goldman Sachs acompanha nesse diagnóstico. “Lagarde afirmou que o BCE precisará de ver mais provas para ganhar confiança suficiente nas perspetivas de inflação e que muitos mais dados ficarão disponíveis entre as reuniões de abril e junho. Mantemos a nossa previsão para o primeiro corte em junho”.

O gabinete de estudos do BPI reitera a mesma ideia. “Tudo reforça a ideia de que a reunião de 6 de junho é a mais favorável para uma primeira descida das taxas, com 90% de probabilidade, segundo os preços dos ativos financeiros que, nas palavras de Lagarde, parecem estar a descontar melhor”.

Inflação quase domada, economia bloqueada

A autoridade presidida por Christine Lagarde anunciou que a previsão para a inflação deste ano foi revista em baixa significativa, de 2,7% (previsão média feita em dezembro) para 2,3%, agora.

“Nas projeções dos especialistas do BCE, a inflação foi revista em baixa, em particular para 2024, o que reflete sobretudo um contributo menor dos preços dos produtos energéticos. Os especialistas do BCE projetam agora que a inflação seja, em média, de 2,3% em 2024, 2% em 2025 e 1,9% em 2026”.

O alívio no ritmo dos preços dos bens mais básicos e essenciais, como alimentos e energia, parece estar a ajudar a puxar a inflação um pouco mais para baixo. Mas, como a inflação total ainda não está no ponto, os juros altos vão ter de se manter e a economia (sobretudo o consumo das famílias e o investimento das empresas) vai continuar a perder gás.

Segundo o BCE, a evolução esperada do crescimento em 2024, enfraqueceu de novo e só deve chegar a 0,6%, quase uma estagnação. Há três meses, a projeção do BCE apontava para 0,8% em 2024. Há um ano, em março de 2023, a previsão apontava para uma expansão de 1,6% este ano (mais do dobro do que prevê agora).

“A atividade estagnou no quarto trimestre de 2023, provavelmente devido aos pequenos contributos positivos da procura interna e das exportações líquidas, num quadro de continuação da redução de existências [stocks]”, explica o BCE no estudo das previsões.

Salários complicam cortes

Segundo o BCE, “embora a maioria das medidas da inflação subjacente tenham registado novo abrandamento, as pressões internas sobre os preços permanecem elevadas, devido, em parte, ao forte crescimento dos salários”. “As condições de financiamento são restritivas e os anteriores aumentos das taxas de juro continuam a pesar sobre a procura, o que ajuda a reduzir a inflação”.

Este peso sobre a procura continua a fazer estragos. “Os especialistas do BCE reviram em baixa, para 0,6%, a projeção relativa ao crescimento [económico] em 2024, devendo a atividade económica permanecer fraca”. Depois, “esperam que a economia recupere, com um crescimento de 1,5% em 2025 e 1,6% em 2026, apoiada, no início, pelo consumo e, mais tarde, pelo investimento”, explica o BCE.

O nível muito elevado de taxas de juro da Zona Euro não é produto apenas da manipulação das taxas de juro diretoras. O BCE também tem vindo a devolver aos mercados secundários (a deixar de reinvestir no seu balanço) quantidades monumentais que detinha em obrigações do tesouro (OT) e outros títulos, o que pressiona os juros em alta por esta via.

É o que vai continuar a fazer. Já descontinuou os reinvestimentos do enorme programa de compras de ativos (APP) e a outra grande bazuca de dinheiro barato, a da pandemia (PEPP), também será desligada no final deste ano.

luis.ribeiro@dinheirovivo.pt