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Sociedade
24 outubro 2024 às 00h03
Leitura: 5 min

Sala de chuto na Alta de Lisboa? Santa Clara só ouviu falar. Lumiar e câmara desmentem

Em comunicado à população, executivo de Santa Clara cita “ameaça” da instalação de equipamento para toxicodependentes em zona limítrofe com o Lumiar, que, por sua vez, desconhece origem da notícia.

Com um comunicado à população assinado pelo seu executivo, a Junta de Freguesia de Santa Clara manifestou o seu desagrado com “a dita sala de consumo assistido” para toxicodependentes que, alegadamente, será instalada ao pé da Escola Básica Pintor Almada Negreiros, que faz limite com o Lumiar. “Perante tal ameaça, o Executivo desta Junta de Freguesia não pode deixar de expressar a sua posição e alertar os moradores para os problemas que, no seu entendimento, tais situações acarretam”, lê-se no comunicado. A questão é: quem vive na zona desconhece a informação.

Durante cerca de meia tarde, percorremos as ruas em redor da escola, sem sinais de construção que não sejam os avassaladores empreendimentos imobiliários que tomam conta desta zona da Alta de Lisboa. Em total oposição aos cenários das obras, as ruas largas e os vários espaços com mato a crescer dão um aspeto de abandono e descuido à localidade, agravado por um fator que chama logo a atenção: os monos que em nada combinam com um ambiente escolar marcam presença em frente a um dos muros da EB, perto da entrada, a atrapalhar o caminho e a sensação de bem-estar daquelas crianças e jovens.

É um passeio com diálogos curtos, já que a nossa pergunta é simples. “Boa tarde! O senhor sabe onde será instalada a dita sala de chuto que a junta de freguesia está a denunciar?”. O senhor, a passear o seu cão, responde logo que nem sabe do que se trata. “E tenho uma neta na escola, mas não ouvi dizer nada”, diz, e segue o seu caminho. Num dos cafés da rua Vasco da Gama Fernandes há dois ou três clientes, que também desconhecem a informação. Na esquina oposta, onde fica o moderno prédio da Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados Santa Clara e Lumiar, os utentes à espera do atendimento, na calçada, nunca ouviram falar em outro equipamento de saúde pela zona.

Pois sim, as salas de consumo assistido são mecanismos da política de saúde pública previstos em Lei em Portugal desde 2001. Nestes 23 anos que se passaram, Lisboa recebeu duas. Com a do Porto, o país tem três equipamentos para que consumidores de drogas as administrem de forma vigiada por profissionais das áreas da saúde e social. Para a Junta de Freguesia de Santa Clara, só a possibilidade da instalação de uma sala destas - baseando-se numa informação que não se sabe de onde veio - foi o motivo da notícia. “Foi-nos transmitido que se fala novamente em implementar o famigerado equipamento na Alta de Lisboa”, diz o executivo no comunicado. Do passeio pela zona, depreende-se que estes moradores ou não seguem as comunicações da sua JF ou, realmente, tudo não passa de mexericos de vizinhança.

Contactamos então quem está ao lado. “Nem a Junta de Freguesia do Lumiar, nem a Câmara Municipal de Lisboa têm conhecimento da origem do teor deste comunicado”, escreve o Gabinete de Apoio ao presidente da JF do Lumiar em resposta. Recorremos à chefia autárquica para mais esclarecimentos. “Não existe qualquer decisão ou proposta de localização para uma nova sala de consumo assistido em Lisboa”, responde a assessoria de comunicação da CML.

A hipótese de instalação de uma sala de chuto no Lumiar esteve, de facto, na mesa, em 2021, altura em que a junta de freguesia e a população marcaram oposição. “Quando surgiu o comunicado em questão o Sr. Presidente contactou imediatamente a Câmara Municipal de Lisboa sobre o conteúdo do mesmo e, mais uma vez, lhe foi assegurado que esse assunto não está sequer em consideração e que a decisão anunciada é definitiva”, acrescenta a JF do Lumiar na resposta.

Já da parte da Junta de Freguesia de Santa Clara não houve nenhuma resposta ao pedido de esclarecimentos sobre o motivo da publicação do comunicado a denunciar a eventual instalação da sala de chuto.

caroline.ribeiro@dn.pt