Estima-se que, só em Portugal, “haja, claramente, entre dois a três milhões de pessoas” que estejam em pobreza energética (isto é, que tenham falta de condições de conforto em casa, seja por falta de aquecimento ou de arrefecimento). Mas, apesar do problema ser reconhecido pelo poder político (“que deve ser sempre o primeiro passo”), João Pedro Gouveia, investigador da Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) da Universidade Nova diz ser preciso fazer mais.
Ouvido pelo DN, o professor refere que, apesar de o país ter “uma estratégia de combate à pobreza energética”, publicada em janeiro deste ano, falta colocá-la em prática. Até porque, no seu entender, havia “objetivos altamente ambiciosos”, como a erradicação total deste problema até 2050 ou a intenção de, até 2030, renovar 60% das casas. “Atualmente, se calhar, nem 5% renovámos até agora, não é em cinco anos que se vai vencer esta guerra”, diz, acrescentando que “basta olhar para os dados ou para as estatísticas de renovação de casas na última década”. “Os resultados estão piores ou muito piores do que em anos anteriores. Não estamos a fazer o caminho certo”, sublinha João Pedro Gouveia.
O caminho a seguir, diz, deve ser o de fortalecimento económico desta estratégia, para se poderem aplicar os instrumentos. “Apesar de haver um reconhecimento político, os instrumentos financeiros, os mecanismos de apoio às pessoas, o financiamento existente é manifestamente escasso para a dimensão do problema que Portugal tem. Não chega só reconhecer ou ter estratégia. É preciso, efetivamente, implementar os instrumentos para esse combate à pobreza energética de forma efetiva às pessoas mais vulneráveis”, acrescenta ainda.
Esta falta de medidas, traduz-se, depois, no facto de Portugal ser o país europeu “onde mais pessoas reportam incapacidade em aquecer as casas”. Isto deve-se, sobretudo, “à falta de equipamentos eficientes, ou mesmo falta de equipamentos para aquecer a habitação”. Segundo João Pedro Gouveia, há ainda outro problema que acontece “em muitos países do sul da Europa”: “As pessoas até têm o equipamento, mas depois não têm dinheiro, tentam gerir o orçamento familiar de outra forma e não querem ou não têm capacidade de aquecer a casa. A casa realmente é tão má, com tantos problemas estruturais de isolamento e de problemas nas janelas que, mesmo aquecendo, não conseguem estar confortáveis em casa.”
Ao todo, estima-se que, a nível europeu, a pobreza energética afete cerca de 35 milhões de pessoas. Mas, realça João Pedro Gouveia, “dependendo das consequências e das causas”, esse número pode chegar aos 100 milhões, seja no inverno com as dificuldades no aquecimento ou “no verão com o passar calor em casa”. “O assunto é cada vez mais relevante”, diz o especialista.