O Programa do Governo dos Açores foi esta sexta-feira aprovado com os votos favoráveis dos partidos que compõem o Executivo Regional, que corresponde à Aliança Democrática (AD) - coligação entre PSD, CDS e PPM -, mas nada disto teria sido possível se o Chega, com cinco deputados, não tivesse optado pela abstenção. Do lado da oposição, PS e Bloco de Esquerda cumpriram o prometido e votaram contra, mas não chegou para travar a máquina liderada por José Manuel Bolieiro.
Os 26 deputados da AD (23 do PSD, dois do CDS e um do PPM) não garantem a maioria absoluta necessária de 29 deputados para fazer aprovar na Assembleia Regional dos Açores tudo aquilo que quiserem, mas os 23 do PS, em conjunto com um mandato do BE, também ficam aquém do necessário para impedir o que quer que seja.
PAN e IL, cada um com um mandato, escolheram a abstenção, mas também não havia garantia de que seria esta a via escolhida por ambos, tendo em conta que tanto uma força política, como a outra, já tinham dito que iriam analisar primeiro o documento do Governo Regional antes de tomar uma posição.
Além disso, se nos Açores tivessem sido seguidas pelo PAN as mesmas linhas vermelhas que foram apontadas pelo partido a nível nacional às políticas da AD, esta semana, depois da audiência de Inês de Sousa Real com o Presidente da República, talvez a orientação de voto tivesse sido outra.
No entanto, a surpresa veio do Chega, que, à semelhança do que aconteceu a nível nacional, é a terceira força política mais votada no arquipélago. O partido elegeu cinco deputados na eleições regionais de 4 de fevereiro e tinha anunciado que a sua orientação de voto para viabilizar o programa iria depender de uma participação no aparelho proposto por Bolieiro. De alguma forma, segundo o líder do Chega nos Açores, José Pacheco, algo assim terá acontecido, até porque, disse, a decisão foi tomada depois de uma conversa com o chefe do Governo na noite de quarta-feira, na véspera da votação do programa.
“Em tempo útil, não conseguimos fazer esse tal acordo escrito, mas será feito nos próximos dias com ponderação e as bandeiras do Chega estarão lá. Não estarão todas, como é óbvio. Será um acordo ou um entendimento plurianual. Vamos fazer de Orçamento em Orçamento, e de uma forma simples, que as pessoas percebam”, garantiu José Pacheco, explicando que “não é um acordo parlamentar”, porque não obriga o partido “a ter de votar ou deixar de votar o que quer que seja no Parlamento”.
“É um acordo talvez um pouco mais de governação, no sentido de podermos influenciar positivamente a governação”, considerou.
Seguindo uma via de contraponto face ao que tem acontecido a nível nacional, com o líder da AD, Luís Montenegro, a deixar o Chega de fora de um entendimento governativo, José Pacheco baixou o nível das linhas vermelhas e escolheu o diálogo. “Nós sempre dissemos isto: podíamos trabalhar de qualquer forma. Preferíamos, se calhar, estar dentro do Governo, mas talvez seja melhor estarmos fora do Governo e, com as nossas propostas, irmos contribuindo para que as propostas do Governo sejam melhoradas”, afirmou.
Do outro lado da trincheira, que em termos insulares parece não existir, Bolieiro assumiu a reciprocidade. “Eu demonstrei, como aliás sempre fiz de forma direta com o deputado José Pacheco (...), esta minha abertura para um diálogo que possa ter, desde logo nos documentos que são essenciais para concretizar o Programa do Governo e a estabilidade governativa, por referência às orientações de médio prazo, o que seria, obviamente, a disponibilidade para um entendimento plurianual”, garantiu o líder do Governo Regional, admitindo também que, por parte da coligação que integra o Governo, o objetivo é “encontrar pontos de convergência” com o Chega.
“Sou um referencial de estabilidade, fazendo o que é estratégico e, portanto, sendo reformista e procurando mudar um paradigma do desenvolvimento dos Açores, em progresso”, afirmou.
À esquerda, também as vozes da oposição soaram afinadas umas com as outras. Para o líder da bancada socialista nos Açores, João Castro, o Programa do XIV Governo Regional está “mal-organizado, com ideias que se repetem, que se atropelam e que se contradizem”.
“Não concordámos em 2020, não concordámos em nenhum dos Planos e Orçamentos até novembro do ano passado, aqui apresentados, e não vamos concordar com este Programa, que, pelas palavras do senhor presidente do Governo, a 8 de fevereiro, na RTP3, até já foi sufragado pelos açorianos que votaram na coligação”, criticou João Castro.
Também o deputado único do BE nos Açores, António Lima, afirmou que “o Programa do Governo apresenta as mesmas soluções e o mesmo objetivo estratégico de desenvolvimento que foi rejeitado no último Orçamento pelos parceiros da coligação. Um modelo que coloca o mercado à frente das pessoas”. Sobre o Chega, o deputado bloquista criticou a mudança de posição do partido, face ao que tinha dito inicialmente. “Bastou uma conversa e o Chega abraçou o sistema.”