A investigadora Maria João Feio olha para o Dia Mundial da Água com uma visão holística, que nunca se limita ao que é “a água para beber ou para regar, mas antes como algo que permite a existência de uma série de seres vivos, de biodiversidade muito alargada”. A verdade é que o ecossistema onde cabe toda a fauna e flora é mantido “não só quando a parte físico-química da água está em boas condições, sem poluição, mas também quando todos os elementos lá estão: os processos ecológicos a funcionar como deviam”.
Há anos que esta investigadora do MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente e do Departamento de Ciências da Vida da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra – se dedica a compreender toda a ecologia dos rios. À medida que o tempo avança, lamenta que a legislação – que existe – não seja aplicada, por forma a garantir que possamos ter mais e melhor água. Por outro lado, apesar de todos os esforços do MARE, nomeadamente com atividades junto da sociedade civil, desde os mais novos aos adultos, não lhe parece que exista ainda uma consciência da importância de gerir bem os recursos como a água. “O que me parece é que as pessoas têm a consciência da importância da água não estar poluída, mas não aquela de que a água está integrada nos ecossistemas, e que para estar em boas condições o ecossistema também tem que estar”, afirma ao DN, sublinhando que essa não é uma lacuna apenas do cidadão comum, mas estende-se aos decisores políticos, nomeadamente autarcas.
O mesmo acontece com quem gere indústrias ou zonas agrícolas: “Não há essa consciência e isso é uma pena, porque leva à destruição do ecossistema. Por exemplo, uma questão simples como cortar a vegetação toda das margens , muitas vezes feito pelos agricultores ou pelas juntas e Câmaras, é feito porque as pessoas não percebem que aquilo faz parte do ecossistema, sendo essencial para a sua manutenção e para garantir a qualidade da água”.
“Habituámo-nos a abrir a torneira como se o gesto fosse uma coisa natural e abundante, mas já não estamos nesse ponto”, recorda Maria João Feio. Afinal, a água doce deveria ser vista como um bem escasso, “não só porque vivemos num país onde metade tem um clima mediterrânico bem marcado, e sabemos que, pelo menos, no verão há sempre menos água”. Mas neste cenário de alterações climáticas, essa escassez de água vai aumentar. E em zonas que eram tipicamente mais temperadas, e que até tinham mais água no inverno, “começam a sentir mais cedo a falta”, adverte.
A investigadora lembra que, ao haver menos quantidade de água, acaba por existir uma maior concentração dos organismos poluentes. Ou seja, não é apenas o caso de menos água, mas também em piores condições.