Ficam algumas perguntas no ar em Cannes. Além dos lugares estafados do “para onde vai o cinema”, fica a dúvida se os filmes, os melhores, que foram selecionados, não estão a pedir um novo olhar para as imagens.
Talvez não haja (ainda) respostas, mas há uma convicção de que é pelo olhar do público que começam a surgir novos caminhos de cinema. O espectador como “parte interessada” ou colaborador. Quem por aqui assistiu à mistura de ficção e documento que é An Unfinhesd Movie, de Lou Ye, percebe que este novo cinema chinês pede uma disponibilidade inventiva, quanto mais não seja para perceber o que é real ou não – o filme fala de umas filmagens reais que foram interrompidas na China devido ao covid.
Também Volvereis, nova obra-prima do madrileno Jónas Trueba, pede interactividade. Somos nós a testemunhar a montagem do filme dentro do filme. Este pequeno grande deslumbramento da Quinzena dos Realizadores vai estrear-se em Portugal: a Leopardo Filmes ficou com ele.
Isto para referir uma das tendências das temáticas da 77.ª edição deste festival: o cinema como ponto de partida para uma resolução de ficção.
Nesse domínio, Christophe Honoré foi rei e senhor dessa maneira de converter memórias de cinema em espectros fantasmagóricos em Marcello Mio, o tal filme onde Chiara Mastroianni inventa um novo Mastroianni. Foi dos grandes prazeres deste festival.