"Não faço ideia do que ele disse no fim daquela frase. E acho que ele também não”. Esta declaração de Donald Trump, proferida depois de Joe Biden ter pronunciado algo que ninguém percebeu quando tentava explicar como pretende resolver a crise migratória na fronteira com o México, era a mais usada pelos media americanos para explicar a dimensão da derrota do democrata no primeiro debate para as presidenciais de novembro, realizado quinta-feira à noite (madrugada de ontem em Lisboa).
Uma derrota de tal forma expressiva que o Partido Democrata estava esta sexta-feira dominado por uma espiral de pânico e a pensar qual será o melhor passo seguinte: todos unidos em torno de Biden? O presidente desistir da corrida e dar lugar a outro? E quem seria esse outro, a vice Kamala Harris? Haverá alguém disposto a desafiá-lo na convenção democrata? “O movimento para convencer Biden a não concorrer é real”, dizia ao Politico um congressista democrata, garantindo que falava também em nome de outros.
O veredicto sobre o desempenho de Biden por parte dos estrategistas do partido e dos media foi unânime e contundente, rotulando o debate como um “desastre político” e destacando a “consternação” dentro das fileiras do partido com a eleição a pouco mais de quatro meses de distância. “Não há duas maneiras de dizer isto - este não foi um bom debate para Joe Biden”, disse a ex-chefe de comunicações democrata da Casa Branca Kate Bedingfield à CNN, pouco depois do debate. Maria Shriver, membro destacado da dinastia democrata Kennedy, fez o que quase equivaleu a um elogio fúnebre às esperanças de reeleição de Biden. “Eu amo Joe Biden. Sei que ele é um bom homem”, publicou no X. “Esta noite foi comovente em muitos aspetos. Este é um grande momento político. Há pânico no Partido Democrata”.
Para o Politico, “os democratas acordam para o pesadelo”, enquanto que o The New York Times escrevia que o partido - incluindo membros da própria administração Biden - trocaram telefonemas e mensagens de texto “frenéticas” à medida que o debate se desenrolava. Alguns também “discutiram entre si se era tarde demais para persuadir o presidente a renunciar em favor de um candidato mais jovem”, acrescentou o jornal.
Um candidato forte - mas não automático - para ocupar o lugar de Biden seria a vice-presidente, Kamala Harris, que defendeu lealmente o seu desempenho, embora reconhecesse que teve um “início lento, isso é óbvio para todos, não vou discutir esse ponto, mas acho que teve um final forte ”. Outros nomes falados como possíveis substitutos de Joe Biden eram ontem o governador da Califórnia, Gavin Newsom, a governadora do Michigan, Gretchen Whitmer, o governador do Illinois, JB Pritzker, e o veterano senador do Ohio, Sherrod Brown. Mas, pelo menos, Newsom esta sexta-feira já havia garantido a sua lealdade e apoio ao presidente.
Quem parece ter a certeza de que Joe Biden é o melhor candidato que os democratas podem apresentar em novembro, embora reconhecendo que a sua prestação no debate poderia ter sido melhor, é o próprio Joe Biden. “Sei que não sou um homem jovem, para dizer o óbvio. Sei que não ando tão facilmente como antes, não falo tão bem como antes, não debato tão bem como antes, mas sei o que sei. Sei dizer a verdade”, afirmou o presidente esta sexta-feira num comício na Carolina do Norte.
E para quem não tinha percebido a mensagem ele foi ainda mais claro: “Pessoal, dou-vos a minha palavra como Biden, não voltaria a concorrer se não acreditasse de todo o coração e alma que posso fazer este trabalho. Porque, francamente, os riscos são demasiado elevados”.
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