Ciência
13 outubro 2024 às 00h12
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Avanços no combate a doença rara e prémio para jovens investigadores nos destaques da ciência nacional

A semana trouxe-nos novidade no que toca a uma descoberta no combate a uma doença rara e potencialmente fatal, a distrofia muscular congénita. Também em português, mais concretamente na ciência desenvolvida por jovens investigadores nacionais, o Prémio Maria de Sousa, em homenagem à imunologista falecida em 2020.

A distrofia muscular congénita (MDC1A) é uma doença rara e potencialmente fatal, com incidência na Europa de 10 a 14 casos por milhão de habitantes. Também designada como distrofia muscular relacionada com LAMA2 (LAMA2-CMD) é causada por alterações no gene LAMA2, responsável pela produção de laminina-2, uma proteína essencial para o correto funcionamento dos músculos. Uma equipa de investigadoras de dois laboratórios do Centro de Ecologia, Evolução a Alterações Ambientais - CE3C (Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa), a par com instituições internacionais, desenvolveu ao longo dos últimos três anos e meio um estudo que revela novas informações sobre esta patologia.

Através de estudos com modelos de ratinho para a doença, esta equipa identificou como as células do músculo com alterações nesta proteína enfrentam dificuldades em crescer, desenvolver-se e fundir-se corretamente.

“Estes são processos essenciais para a formação muscular, tanto no desenvolvimento embrionário como numa recuperação após a existência de lesões musculares”, explica Susana Martins, aluna de doutoramento de Ciências da Universidade de Lisboa. 

Os investigadores observaram ainda que as células afetadas apresentam danos no ADN, stresse oxidativo e disfunções nas mitocôndrias - as ‘fontes de energia’ das células. Estas descobertas representam um avanço significativo na compreensão dos mecanismos que levam ao surgimento desta doença.

“Os resultados do estudo são agora detalhados na revista Life Science Alliance. O artigo explora de forma aprofundada os mecanismos que levam ao desenvolvimento da LAMA2-CMD, identificando novos alvos terapêuticos e abrindo caminho para o desenvolvimento de tratamentos que possam ajudar os pacientes que sofrem desta distrofia”, destaca a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. 

Nas palavras da investigadora Ana Rita Carlos, líder do grupo do Laboratório de Mecanismos Moleculares de Doença, “embora o estudo não traga uma cura imediata, proporciona uma nova compreensão dos processos biológicos envolvidos, o que poderá, no futuro, abrir portas para o desenvolvimento de novas terapias, nomeadamente no campo da terapia génica.”

“Estamos otimistas de que os resultados alcançados poderão, no futuro, contribuir para novas terapias, oferecendo esperança para as famílias que lidam com esta doença incapacitante”, conclui Sólveig Thorsteinsdóttir, líder do Laboratório de Matriz Extracelular no Desenvolvimento e Doença. 

Após esta primeira abordagem, a equipa prosseguirá com o estudo em duas frentes de investigação: “O estudo de células obtidas de pacientes com a doença, para verificar se os processos observados em modelos de ratinho podem ser revertidos em células humanas e a exploração de estratégias de terapia genética que possam, um dia, corrigir as alterações no gene LAMA2 e auxiliar no tratamento da doença”, destacam as investigadoras.

A linha de investigação focada no desenvolvimento de novas terapias genéticas é também o foco do projeto de doutoramento do aluno Diogo Fernandes (CE3C), recentemente premiado com uma bolsa pela Fundação “la Caixa”, no âmbito do programa Doctoral INPhINIT fellowships Retaining Call 2024.

A investigação contou com a colaboração de investigadores do Instituto de Biossistemas e Ciências Integrativas, assim como de instituições internacionais, nomeadamente a Universidade de Nápoles (Itália) e o Jacqui Wood Cancer Centre da Universidade de Dundee (Escócia).

Trabalho de cinco jovens investigadores portugueses reconhecido com o Prémio Maria de Sousa

Foto: Bial

Cinco jovens investigadores portugueses foram galardoados na 4.ª edição do Prémio Maria de Sousa, em homenagem à imunologista portuguesa. A cerimónia de entrega dos galardões decorreu a 9 de outubro na Aula Magna da Reitoria da Universidade de Lisboa. Um prémio para os “jovens investigadores portugueses, com idade igual ou inferior a 35 anos, em projetos de investigação na área das ciências da saúde”, sublinha a Ordem dos Médicos e a Fundação Bial, promotoras desta iniciativa. Os prémios foram atribuídos a Maria Arez, investigadora no Instituto de Bioengenharia e Biociências (Instituto Superior Técnico), Pedro Alves, do Centro de Estudos Egas Moniz (Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa), Ana Rita Araújo, investigadora no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (Universidade do Porto), Samuel Gonçalves, investigador no Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (Escola de Medicina da Universidade do Minho) e Joana Gaifem, investigadora no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (Universidade do Porto). 

Maria Arez, de 29 anos, apresentou ao prémio uma nova abordagem relacionada com erros em células estaminais geradas em laboratório a partir de células do nosso corpo (como células sanguíneas ou da pele). “A minha linha de investigação foca-se em perceber que tipo de erros são estes, como e quando é que eles ocorrem durante a produção destas células e como é que podemos evitar ou corrigi-los”, sublinha a investigadora no site do Instituto Superior Técnico.

Pedro Alves, de 35 anos, deteve-se no desenvolvimento de terapias apoiadas em medicamentos com vista a melhorar a recuperação neurológica de doentes vítimas de AVC. Ana Rita Araújo, de 35 anos, pretendeu com a sua investigação “perceber se as células que proliferam durante mais tempo ao longo da nossa vida têm um papel protetor na manutenção da função dos diferentes tecidos e ajudam à desaceleração do envelhecimento”, informa no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde.

Joana Gaifem, de 35 anos, também investigadora no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde, sublinha no site daquela instituição que o estudo que empreendeu “pretende explorar se o perfil de glicanos (açúcares) presentes na mucosa intestinal do hospedeiro é capaz de definir a composição da microbiota intestinal, e de que forma é que esta interação pode ditar um intestino saudável ou um ambiente inflamatório (doença). O objetivo primordial será contribuir para o desenvolvimento de novas terapias, abrindo caminho para estratégias preventivas para a DII”.

Samuel Gonçalves, de 30 anos, estuda o Aspergillus fumigatus, um fungo ambiental presente em nossas casas. Apesar de não causar problemas à maioria das pessoas, quem tem o sistema imunitário comprometido, pode desenvolver uma doença respiratória fatal (aspergilose pulmonar invasiva) na presença deste fungo. “O objetivo principal deste projeto é perceber os mecanismos moleculares através dos quais o metabolismo do colesterol permite respostas imunitárias antifúngicas, contribuindo assim para encontrar novos alvos terapêuticos e estratégias de medicina personalizada”, detalha o investigador no site da Universidade do Minho.

De acordo com o regulamento do Prémio Maria de Sousa, cada um dos premiados recebe até 30 mil euros. O júri do Prémio foi presidido pelo neurocientista Rui Costa, à frente do Instituto Allen, com sede em Seattle, nos Estados Unidos. 

Maria Ângelo Brito de Sousa, imunologista, Professora emérita da Universidade do Porto, morreu em 2020, aos 81 anos. Nasceu em Lisboa no ano de 1939 e licenciou-se naquela cidade, na Faculdade de Medicina, em 1963. Exerceu atividade científica em Inglaterra, na Escócia e nos Estados Unidos. Foi mais tarde professora Catedrática de Imunologia do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto e coordenadora de investigação no Instituto de Biologia Molecular e Celular. Entre os inúmeros contributos para a ciência, a investigação de Maria de Sousa, centrou-se na descoberta de um fenómeno a que deu o nome de ecotaxis, termo que designava a capacidade de células de diferentes órgãos migrarem e organizarem-se em áreas bem delineadas dos órgãos linfóides periféricos. A investigadora reuniu um arquivo pessoal com mais de 60.000 documentos, correspondência e recortes de jornais e revistas. Em 2014, publicou um livro, Meu Dito Meu Escrito. Em Janeiro de 2012, foi condecorada pelo Presidente da República Aníbal Cavaco Silva com o grau de Grande-Oficial da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada.

Mundo Material

Uma história substancial do nosso passado e futuro

Tudo o que assiste ao mundo atual, mesmo quando não lhe identificamos qualidades tangíveis, como a internet e as redes sociais, assenta em infraestruturas físicas das quais dependem para funcionar. Estas são construídas a partir de matérias-primas que são fundamentais, mas que nem sempre são valorizadas fora do mercado onde circulam. “Podemos saber o preço de uma coisa, mas o preço não é o mesmo que a importância”, refere Ed Conway autor do livro Mundo Material - Uma história substancial do nosso passado e futuro (edição temas e Debates). Conway, jornalista e editor de Economia do canal de televisão britânico Sky News, desenrola o seu livro em torno de seis substâncias: areia, sal, ferro, cobre, petróleo e lítio. “Os seis materiais descritos neste livro podem não ser escassos. Podem não parecer ou dar a impressão de ser particularmente atraentes. Só por si, não são especialmente valiosos. Mas são os componentes básicos do nosso mundo”, escreve o autor no capítulo introdutório, para acrescentar: “Alimentaram a prosperidade dos impérios. Ajudaram-nos a construir cidades e a arrasá-las. Alteraram o clima e, a seu tempo, poderão ajudar a salvá-lo. Estes materiais são os heróis esquecidos da idade moderna, e é tempo de ouvirmos a sua história.”

O livro tem o preço de capa de 29€.