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Sociedade
29 outubro 2024 às 00h01
Leitura: 6 min

Vão faltar professores a quase todas as disciplinas em 2031

Estudo “Reservas de Professores sob a lupa: antevisão de professores necessários e disponíveis”, do Edulog (Fundação Belmiro de Azevedo), alerta para a escalada da escassez de professores, que se irá acentuar entre 2026 e 2030 caso não se tomem medidas estruturais.

A escassez de docentes irá acentuar-se entre 2026 e 2030, período em que as reservas de professores, essenciais para substituir as ausências temporárias e preencher vagas deixadas por aposentação, ficarão em risco de se esgotar. Em 2026, alguns grupos de recrutamento entrarão em défice estrutural, sendo que, em 2031, estarão praticamente todos nesta circunstância, à exceção da disciplina de Educação Física. E mesmo que haja um incremento na formação de professores, isso só trará resultados em 2029, tendo em consideração o tempo para a sua formação.

Estas são algumas das conclusões do estudo “Reservas de Professores sob a lupa: antevisão de professores necessários e disponíveis”, realizado pelo Edulog, um think tank  da Fundação Belmiro de Azevedo, e lançam  alertas para “os desafios estruturais que o Sistema Educativo enfrentará até 2031”.

O estudo avança com um cenário global “preocupante”: se nada for feito para combater a falta de professores, em 2031 assistiremos a uma “incapacidade quase total de fazer substituições ao longo do ano”. Esta dificuldade de substituições de docentes já se faz sentir em todo o país, com o pedido dos mesmos horários nas plataformas de recrutamento do Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI).  

O Edulog estima em 20%, relativamente ao total de professores colocados, o número de docentes necessários para as substituições temporárias: 10% por faltas de longa duração (baixas médicas) e 10% por faltas entre os 12 e os 30 dias. “Em 2023 já não foi possível substituir grande parte destes professores, com quase todos os grupos do 3º ciclo do Ensino Básico e do Ensino Secundário abaixo da linha dos 20%”, refere o documento.

Os números apresentados refletem essas dificuldades: a taxa de sucesso de substituição foi de 68%. Ou seja, mais de 30% dos professores de baixa médica, licença ou aposentados não foram substituídos. Um problema que tem piorado a cada ano desde 2021.

Novos diplomados

Em 2022/23 estavam em formação 1862 professores dos Pré-Escolar, 1.º CEB e 2.º CEB, distribuídos pelos dois anos de mestrado, dos quais, segundo o Edulog, se prevê que concluam 95%.  Para o 3.º CEB e o Ensino Secundário estavam em formação 2640 professores. Contudo, 43% frequentam cursos de Educação Física.

“Descontando a taxa de desistência, podemos esperar a formação, no biénio 2023-2024, de 2380 novos professores”, refere o estudo. Recorde-se que as aposentações de professores, no mesmo ano letivo, se fixaram em 3500, resultando num saldo negativo.

David Justino, membro do Conselho Consultivo do Edulog, sublinha, por isso, ao DN a necessidade urgente de formação de novos diplomados. “Precisamos de perceber que, para formar um professor, precisamos de 5 anos. Ou seja, os efeitos das decisões que se tomem agora só se vão repercutir nesse espaço temporal”, explica.

O também ex-ministro da Educação do Governo de Durão Barroso afirma ser necessário aumentar os numerus clausus dos cursos de formação de professores em todas as zonas do país. “Terá um impacto financeiro para as instituições, mas é obrigatório fazer-se. E há uma clara divergência entre o Norte e o Sul na formação de professores. É preciso aumentar a oferta a Sul”, refere, ressalvando que “o problema da falta de professores se faz sentir agora mais a Sul, mas chegará também ao Norte em breve”.

Nas disciplinas das Humanidades, a escassez vai sentir-se já em 2026 ou 2027, “caso não se verifiquem novas entradas de professores em condições de se candidatarem”. A situação é também muito complexa em Artes e em Informática, onde as carências serão notórias também em 2026. Já o número de professores nas disciplinas de Ciências entrará em sinal negativo a partir de 2029. A única disciplina sem rotura de professores é a de Educação Física.

David Justino afirma haver ainda tempo para resolver o problema da falta de professores, mas apenas se forem implementadas medidas no imediato. “Se nada for feito, não haverá professores. Estamos ainda a tempo de tomar medidas estruturais, mas é necessária capacidade de planeamento e antevisão. É o que tem faltado nos últimos anos. Toda a gente pensa nos custos, mas ninguém pensou que os professores não são um recurso ilimitado”, sustenta.

David Justino aponta a dignificação da carreira e a valorização do papel do professor como fundamentais. “O problema não se resolve apenas com a componente remuneratória. Criou-se uma ideia de que, para professor, qualquer um serve, e não é verdade. Essa dignificação passa por medidas que tornem a carreira mais atrativa e mais compensadora. Não podemos manter esta imagem desvalorizada do papel do professor. Temos de mudar a forma como é respeitado, ou não, dentro e fora da sala de aula”, afirma.

Para o responsável, “este é um dos motivos para a falta de novos diplomados”.