301 dias. Thamy Luíza Baruch Azevedo vive em Portugal com visto de estudante há exatamente 301 dias e, até ao momento, não conseguiu um agendamento para obter o título de residência e, segundo a imigrante, ser atendida ao telefone é uma tarefa quase impossível. “Tento realizar o agendamento desde que cheguei, já me aconteceu passar o dia todo usando dois celulares ao mesmo tempo na tentativa de ligar, literalmente das 08:00 às 20:00”, relata a estudante de Mestrado em Direito de Empresas na Universidade de Lisboa. Numa das ocasiões, foram mais de 300 as ligações. Nas poucas vezes em que conseguiu ser atendida, a resposta foi: “Não há vagas, torne a ligar.”
“Eu acreditava que por fazer tudo de forma legal, pagar o visto no consulado português, seguir os trâmites legais, no mínimo teria uma condição básica que é um agendamento”, desabafa a brasileira. Sem o título de residência, a advogada não pode exercer atividades profissionais que sejam compatíveis com o estudo, como planeava. Sair do país, seja para passear ou participar de eventos académicos, ou mesmo ir e voltar do Brasil em casos de emergência, também não lhe é permitido pela falta do documento. “O imigrante investe dinheiro no país, entra de forma regular e não tem o mínimo dos seus direitos garantidos”, diz.
Além destes constrangimentos, Thamy corre o risco de perder a oportunidade de participar no programa Erasmus, para o qual foi aprovada. “Me sinto completamente impotente e frustrada, como se você ficasse travada, impossibilitada de dar os próximos passos em sua vida”, resume.
Por lei, quem chega a Portugal com o visto de estudante ou de procura de trabalho, por exemplo, já deveria aterrar com uma marcação disponibilizada, como forma de agilizar os trâmites e promover a imigração regulada. Na prática, não é o que ocorre há meses, conforme vários casos relatados ao DN. Sem um centro de contacto telefónico e um site onde seja possível agendar online, os imigrantes não conseguem nenhuma resposta por parte da Agência para as Migrações, Integração e Asilo (AIMA).
Há também quem tenha tido a sorte de conseguir um agendamento, mas até hoje está à espera do título de residência. É o caso da também advogada Tonya Lucena, de 28 anos, que fez a entrevista no dia 23 de outubro, em Coimbra. Já passam mais de 120 dias úteis, o que ultrapassa o prazo legal para envio do cartão. “Apesar de compreender a grande quantidade de trabalho que a AIMA possui, jamais imaginei que passaria por essa situação. Desde antes da minha chegada, fiz tudo que me competia com organização para viver a melhor experiência possível”, explica a estudante.
Os constrangimentos não somente no que diz respeito a não poder participar de eventos e reuniões profissionais fora do território. Sem o documento, Tonya teve o pedido de número de utente negado. A estudante diz sentir-se “extremamente lesada, insegura e limitada, num momento que é tão especial pra nós”, ao referir-se ao facto de de ter a oportunidade de estudar em Portugal.
Os dois casos relatados não são únicos, sabe o DN. Até agora, são pelo menos 15. O Núcleo de Estudo Luso-Brasileiro da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (NELB) lançou um inquérito, aberto aos estudantes internacionais de qualquer curso e país lusófono. O tema preocupa a comunidade académica também pelo futuro, porque está a chegar o período de matrículas em outras universidades europeias. Sem o título de residência, os estudantes não podem usufruir do regime de mobilidade da União Europeia (UE), o que evita a necessidade da solicitar e pagar por outro visto de estudo para o país em que pretendem prosseguir o mestrado ou doutoramento.
Ao DN, a AIMA respondeu que “está a negociar protocolos com instituições de ensino superior, tendo em vista a agilização de procedimentos respeitantes a estudantes universitários.