O brasileiro Marcelo Dias, de 55 anos, escolheu Portugal para viver com a esposa. Um ano de planeamento, visto solicitado no consulado e depósito de 13,6 mil euros para provar os meios de subsistência. Quando chegou, como prevê a lei, pediu o título da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Sem contar as burocracias, está feliz com a companheira no Fundão. Na cidade, montaram um estúdio de pilates com equipamentos que está com lista de espera, tanta é a procura, e 90% dos clientes são portugueses. O empresário vê como “muito triste” e “desagradável” a possibilidade de ter o seu título revogado, conforme proposta do partido Chega.
A iniciativa é uma das várias que aparecem nos programas dos partidos políticos e estão presentes nos debates da campanha, algumas vezes com informações falsas, como de que o título CPLP não precisa de meios de subsistência. Independente de quem seja Governo, todos apostam em mudanças que vão mexer com a vida dos milhares de imigrantes que vivem no país e dos que pretendem vir. O Chega não respondeu ao DN o que seria feito com os mais de 150 mil imigrantes que residem em Portugal com o acordo multilateral da CPLP.
O DN analisa algumas das propostas dos partidos sobre as dificuldades enfrentadas pelos imigrantes em Portugal e outras criadas que significariam mais problemas aos estrangeiros. Poucos são os consensos. Um dos temas que mais fomenta divisões é o das fronteiras. O Partido Socialista (PS) e o Partido Comunista Português (PCP) não propõem mudanças na atual política, enquanto o LIVRE fala numa “revisão” na lei, mas sem pormenores. O Bloco de Esquerda (BE) quer “uma nova lei da imigração”, que contemple as mudanças da legislação vigente, “numa nova filosofia humanista e aberta ao mundo”, sem se saber muito bem o que isso é.
A coligação AD resume a política como “imigração regulada com integração humanista”, porém, não especifica mudanças na lei. A Iniciativa Liberal (IL) propõe acabar também a regularização através da Manifestação de Interesse (MI), um dos principais métodos utilizados atualmente. A Nova Direita, que concorre pela primeira vez nas legislativas, defende um sistema de pontos, com base no modelo da Austrália e prioridade aos falantes de português.
O Chega quer estabelecer quotas anuais e criar o “crime de residência ilegal em solo português e impedir a permanência de imigrantes ilegais em território nacional”. Segundo a proposta, quem for encontrado nesta situação fica “impedido de regressar a Portugal e legalizar a sua situação nos cinco anos seguintes”. Pedro Góis, professor da Universidade de Coimbra e investigador na área, avalia que “não tem sentido” a medida de criação de um novo tipo penal focado nesta população. “Colocávamos os imigrantes irregulares na prisão a aguardar julgamento antes do afastamento de território nacional? Seria um julgamento sumário seguido de expulsão? Num Estado de Direito com garantias de presunção de inocência a expulsão seria sempre recorrível, o que poderia demorar anos”, diz. A fiscalização e o pagamento de deportações também suscitam dúvidas do especialista.
“Reformar o sistema consular é essencial”
Quase todos os partidos falam da necessidade de estimular o pedido de visto no país de origem. No entanto, Góis aponta que a rede consular de Portugal existente não é suficiente. “Se querem que as pessoas venham com o visto, é preciso que os postos deem resposta”. Um exemplo é a Índia, atualmente a quarta nacionalidade mais representativa em Portugal, em que só existe um posto consular, localizado em Nova Deli. O órgão é também responsável por atender o Nepal, a nona nacionalidade mais presente em Portugal. Conforme o Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), o país possui um total de 116 postos consulares pelo mundo e 41,79% estão localizados na Europa e a Ásia vem em quarto lugar. Parte das propostas dos partidos na área consular estão nas secções dedicadas aos portugueses pelo mundo. É o caso do BE, da AD e do PCP, que destacam a necessidade de reorganizar e modernizar o modelo, com a aposta nos serviços digitais e contratação de profissionais.
A IL trata do tema dentro da área de imigração, com a proposta de melhorar o processo de emissão de vistos nos postos consulares. O PS quer “promover a imigração regular desde a origem, o que exige uma cobertura consular eficaz”. Porém, é na secção de comunidades portuguesas que constam pormenores, como a abertura de novas embaixadas na Ásia e África e alocar recursos humanos. O Chega não possui nenhuma medida no que diz respeito aos postos consulares para pedido de vistos. A Nova Direita e o LIVRE não apresentam, também, ideias para a rede consular.