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Política
21 agosto 2024 às 00h01
Leitura: 6 min

Grupos xenófobos celebram manifestação convocada pelo Chega

Grupo 1143 e Reconquista destacam que o ato a 21 de setembro é resultado do trabalho dos próprios.

Daqui a um mês, manifestantes vão sair às ruas em Lisboa contra imigrantes e “por mais segurança” em Portugal, numa correlação direta e sem provas de que imigrantes são responsáveis pela criminalidade no país. Após uma semana da convocação por André Ventura, o DN apurou que a mobilização não surtiu tanto efeito, apesar de o partido ter colocado em prática a estratégia de propaganda virtual massiva entre os seus membros. Mesmo entre os demais partidos, pouca atenção se deu ao tema.

Mas, se a convocação para a mobilização nas redes sociais, até agora, não resultou em grande adesão popular, a manifestação já tem grande simpatia de grupos extremistas. É o caso do 1143, liderado pelo neonazi Mário Machado, e da Reconquista, de Afonso Gonçalves.

Logo após o anúncio do protesto, Mário Machado celebrou a iniciativa. O nacionalista atribui ao seu grupo, o 1143, a realização da manifestação de André Ventura. “Depois de mais de um ano sem sair à rua, e das manifestações ‘Contra a Islamização da Europa’, ‘Menos Imigração, Mais Habitação’, e a já agendada ‘Reconquistar Portugal’, todas anti-imigração organizadas pelo Grupo 1143, o Chega é forçado a sair à rua. A força e o impacto da estratégia metapolítica do 1143 é inegável”, escreveu nas redes sociais e no chat  do Telegram. E ainda acrescentou que o grupo deseja uma “forte adesão” no dia 21 de setembro. “Desejamos uma forte adesão à manifestação do Partido de Direita”, finalizou Machado.

No chat  do Telegram, alguns membros do 1143 também comemoraram e atribuíram ao grupo a escalada de tom do partido, que nega ser xenófobo. “Depois de estar sempre a ser colado a nós de forma pejorativa, sair à rua e manifestar-se pelo mesmo que nos é de saudar”, escreveu um dos membros, enquanto outro concordou que é “ousado”, mas critica por ser “muito, muito tardio”.

Apesar de a maior parte dos integrantes estar mais mobilizado para a manifestação em Guimarães a 5 de outubro, a ‘Reconquistar Portugal’, alguns membros no X (antigo Twitter) confirmaram presença.

Quem também confirmou a participação foi Afonso Gonçalves, da Reconquista. “É claro que eu vou”, respondeu numa foto em que André Ventura pergunta aos seguidores: “Vais aparecer [no ato]?”

Gonçalves também usou o humor para celebrar a convocação do partido. Criou um meme  em que se entende que o Chega “copiou” a ideia da Reconquista, que tem marcada a “A grande marcha pela remigração” a 31 de agosto em Lisboa.

Ao mesmo tempo em que celebram a iniciativa liderada por André Ventura, ambos concordam que o tema deve ser “remigração”, palavra usava para suavizar o termo “deportação em massa”. “Estas pessoas JÁ CÁ ESTÃO (legalmente), pelo que propor o controlo da imigração não vai resolver um problema que já está presente no nosso território. A única solução possível é a REMIGRAÇÃO”, escreveu Gonçalves num vídeo partilhado por Ventura. Nas imagens, pessoas brigam, com socos, chutos e empurrões. O contexto do vídeo não é explicado. O vídeo foi partilhado inicialmente pela página Invictus Portucale, dedicada a publicar conteúdos contra imigrantes, com frequente desinformação e descontextualização.

A desinformação sobre o tema da imigração continua em alta nas redes sociais, sempre partilhada por membros do Chega, inclusive o próprio presidente do partido. Uma das mais recentes usa um artigo verdadeiro do Diário de Notícias, publicado em setembro de 2021, intitulado “SEF diz que pagou a todos os refugiados acolhidos em Portugal”. No printscreen, destacado em vermelho, está o trecho “o pagamento integral de 10 000 euros a cada refugiado acolhido em Portugal”. Ventura escreve “Não temos dinheiro para saúde ou para aumentar pensões, mas damos 10 000 euros a cada refugiado que chega a Portugal?” Imediatamente a publicação se tornou viral no X, TikTok, Facebook e Instagram, somando milhares de comentários de pessoas revoltadas com o alegado pagamento de 10 mil euros para cada refugiado.

No entanto, como escrito no texto original, mas omitido por André Ventura, o valor é recebido pelo Estado para as despesas de acolhimento, situação que ocorre em todos os países da União Europeia (UE). Não se trata, ao contrário do que indica o deputado, de um pagamento para o refugiado.

Mesmo o mote de “imigração descontrolada” usado para a manifestação daqui a um mês não está ligado à realidade atual: desde 4 de junho, não há mais como entrar em Portugal sem visto, porque o Governo de Luís Montenegro acabou com a Manifestação de Interesse, procedimento que permitia a entrada dos cidadãos no país sem autorização prévia e que depois podiam regularizar-se. O Chega não respondeu aos pedidos de esclarecimento do DN.