Debate Chega-IL
06 fevereiro 2024 às 23h26
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O “socialismo” de Ventura e a “pobreza, pobreza, pobreza” de Rui Rocha

Rui Rocha diz que depois de debater com Pedro Nuno Santos debateu com “o líder do outro partido socialista”. “E levou uma coça dos dois”, rematou André Ventura, num debate acesso entre dois partidos de direita.

André Ventura segue a cartilha da extrema-direita europeia: uma mistura de conservadorismo social com políticas económicas que vão do liberalismo total em algumas áreas (como a habitação, a saúde e a educação) a um protecionismo nacionalista com ataques a grandes grupos económicos. E é esse modelo de pensamento que transforma o debate entre dois dos partidos da direita numa disputa acesa com Rui Rocha a atacar o “socialismo” de Ventura na defesa do interesse estratégico da TAP, no aumento das pensões e nas propostas para taxar a banca e as gasolineiras (que o Chega apresentou depois de durante a legislatura ter chumbado propostas semelhantes de PCP e BE).

Grande sintonia em matéria de impostos

O debate arrancou com a política fiscal e nesse ponto a sintonia é grande. “Estamos de acordo em muita coisa. O IRS é uma delas”, afirmou André Ventura, que voltou a defender a descida do imposto sobre os rendimentos do trabalho, a baixa do IRC e o fim do IMI, “o imposto mais estúpido do mundo”. Sem apresentar grandes contas e admitindo que o fim do IMI penalizará os municípios, Ventura lá explicou que estas reduções fiscais serão progressivas.

Tal como Rui Rocha, André Ventura acredita que a descida fiscal fará crescer a economia. “Vamos atrair muito mais investimento se tudo correr bem”, disse sobre a descida do IRC (ideia que partilha com a IL e o PSD). Isto, apesar de apenas 56,9% metade das empresas terem pagado IRC em 2020, com uma quebra no número de empresas que pagam este imposto de 20% em três anos.

Depois de explicar que a sua proposta de descida de IRC custará entre 4 e 5 mil milhões de euros, Rui Rocha apontou como desperdício os investimentos feitos pelo Estado para segurar a CP, a TAP e a Efacec.

Um dia depois de ter debatido com Pedro Nuno Santos, que o acusou de querer cortar impostos “por magia”, Rui Rocha diz que com a IL não haverá esse “desperdício” nas empresas seguras pelo Estado esses euros “ficam no bolso dos portugueses”.

De resto, Rui Rocha recuperou um mantra que em tempos foi de Passos Coelho e Paulo Portas para explicar que os cortes fiscais se pagam com “eficiência” e “redução do desperdício do Estado”. “Com isso eu estou de acordo”, dizia entredentes André Ventura.

Rocha e os exemplos do “socialismo” de Ventura

Mas se em matéria de impostos há aproximação, ficaram claras as distâncias entre os dois partidos quando Rui Rocha tentou provar o “socialismo” do Chega. Exemplos desse “socialismo”? A proposta para taxar a banca para apoiar programas de habitação, a subida do salário mínimo nacional, a defesa da TAP na esfera pública por questões estratégicas e a promessa de subir pensões para o nível do salário mínimo nacional. “Isto é socialista”, atirou Rocha.

“Não é socialismo. É perceber o país em que estamos a viver. O que a IL faz é estar desligada do país real”, atacou Ventura, lembrando que a IL votou “contra os aumentos dos polícias, dos bombeiros, das pensões”. Apresentando-se como um defensor dos mais frágeis, como Marine Le Pen faz em França, Ventura lançou a Rocha. “Não estamos a defender a banca, isso é o papel da IL”.

“Vocês são o partido dos grandes grupos económicos, das soluções para os ricos”, continuou Ventura, que foi repetindo que a IL “só sabe privatizar e despedir” e que defende políticas que trarão “pobreza, pobreza, pobreza”. “Vocês só se comprometem com uma coisa: com a banca e os seguros”, disse.

Aproximação na imigração

Ventura e Rocha só voltariam a aproximar-se quando falaram de imigração. Com o líder do Chega a criticar a “bandalheira” que diz ser a entrada de imigrantes no país e com a IL a defender a criação de um regime de vistos atribuído apenas a quem comprove ter condições de subsistência no país. “É o que toda a Europa está a fazer neste momento”, justificou-se Rui Rocha, que recusa fazer parte de um governo com o Chega por “questões de princípios e de dignidade humana”.

Rocha trouxe um papel, que Ventura recusou assinar

Rui Rocha tentou usar o truque de João Cotrim Figueiredo que nos debates em que participou impos o slogan “o liberalismo funciona e faz falta”, usando uma frase que Cotrim lançou no encontro no qual no último fim de semana apresentou o programa da IL. “O único voto que muda Portugal e o voto na Iniciativa Liberal”.

Mas, para mudar Portugal, a IL precisa de se aliar ao PSD. Rocha assumiu que quer “trazer o PSD para as transformações económicas do país”. Por isso, levava no bolso um papel com uma declaração escrita para André Ventura assinar, dando a garantia de que viabilizaria um governo minoritário de sociais-democratas e liberais.

Ventura recebeu a proposta com escárnio. E lembrou que nas sondagens é o Chega que ronda os 20% enquanto a IL está em queda e ronda os 4%. “Eu não sou líder do partido há um ano. Sou líder do partido há cinco anos e esses cinco anos foram sempre a crescer. A IL está doidinha para se meter na cama com o PSD ou com qualquer partido que dê”, reagiu, jocoso, rejeitando assinar por baixo a declaração.

“Hoje debati com o líder do outro partido socialista”, observou Rui Rocha. “E levou uma coça dos dois”, rematou André Ventura.