Orçamento
10 julho 2024 às 23h30
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Cavaco abala estratégia do Governo ao desvalorizar chumbo do Orçamento

Entrevista do líder histórico do PSD, na qual disse que “ninguém morre” por ser governado em duodécimos, baralha posição de Luís Montenegro após Pedro Nuno Santos abrir portas à viabilização. Facilitada por Miranda Sarmento retirar os maiores alvos das críticas do PS.

Depois de o primeiro-ministro Luís Montenegro ter dito que preferia ir-se embora em vez de “fazer o contrário daquilo que nos comprometemos perante os portugueses e daquilo em que acreditamos”, referindo-se às negociações necessárias para a aprovação do Orçamento do Estado para 2025, levando o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, a abrir a porta à sua viabilização, desde que os socialistas “não sejam ignorados”, Cavaco Silva baralhou a estratégia do Governo, ao desvalorizar um eventual chumbo, dizendo que “não há nenhum drama se não for aprovado”.

Numa entrevista ao Observador, na qual procurou esclarecer o artigo que escrevera há duas semanas para o Expresso, o antigo primeiro-ministro e Presidente da República disse, acerca do Orçamento do Estado, que “não há nenhum drama se não for aprovado”. Mesmo admitindo ser “muito provável” que o documento que vier a ser apresentado pelo Governo encontre votos favoráveis e abstenções suficientes, Cavaco Silva defendeu que “não aprovar orçamentos é banal nalguns países da Europa”, acrescentando que “ninguém morreu” em Espanha quando o país foi governado por duodécimos ao longo de dois anos.

Entre as interpretações dos sociais-democratas a essa tese de Cavaco Silva, que também disse ao Observador ser contrário a novas eleições antecipadas - consequência mais provável da eventual demissão de Luís Montenegro -, não falta quem veja o líder histórico do PSD “a descolar” do primeiro-ministro, de quem no último congresso do partido, a 25 de novembro, semanas depois da demissão de António Costa levar às eleições legislativas antecipadas que deram uma vitória, distante da maioria absoluta, à Aliança Democrática. “Não me parece estar nada articulado com Montenegro”, comentou ao DN um conselheiro nacional, crente de que Marcelo Rebelo de Sousa, que dissolveu a Assembleia da República por duas vezes - a primeira das quais na sequência do chumbo do Orçamento do Estado para 2022 na generalidade - não permitiria um cenário prolongado de governação por duodécimos.

Para outro social-democrata ouvido pelo DN, a entrevista de Cavaco Silva demonstra, além da constatação de que, “afinal, não é nada bom ir para eleições antecipadas” - algo que também é encarado como uma vontade de condicionar Marcelo -, que o antigo Presidente da República está conformado com a falta de reformas, devido à ausência de maioria absoluta na Assembleia da República, porque “não chega para muita coisa, mas pelo menos não é a política do PS”. No entanto, entre outros membros do partido persiste um mal-estar, resumido pelo antigo ministro Ângelo Correia, face ao “imbróglio político” que tem marcado o arranque de legislatura: “Tudo permanece estável, com a condição de que o dolce far niente se mantenha.”

IRC e IRS Jovem “desviados”

Também nesta quarta-feira, numa audição na Comissão Parlamentar de Orçamento, Finanças e Administração Pública, o ministro das Finanças, Miranda Sarmento, disse que algumas das medidas de política fiscal do Governo mais criticadas pelo PS serão “desviadas” do Orçamento do Estado para 2025. Em causa está a descida do IRC, que tal como o IRS Jovem será aprovada mediante um pedido de autorização legislativa.

“O IRS Jovem já deu entrada no Parlamento e o IRC terá a mesma formulação. Nenhuma das outras medidas fiscais estarão no articulado da lei do Orçamento do Estado”, disse Miranda Sarmento, garantindo aos deputados que tais medidas, tal como a isenção de IMT e o programa de emergência para a saúde “são compagináveis com o cenário macroeconómico”.

Numa reação ao pacote económico apresentado pelo Governo na semana passada, a líder parlamentar socialista Alexandra Leitão rotulara a descida do IRC de “profundamente injusta” e sem “nenhuma eficácia”. E acrescentara que, tal como o IRS Jovem, vem “beneficiar aqueles que menos precisam”.

Por seu lado, Miranda Sarmento advertiu que o chumbo da proposta orçamental do Governo “só pode ser muito prejudicial para o país, pela instabilidade que traz e pelos impactos na execução do Plano de Recuperação e Resiliência”, prevendo excedentes orçamentais em torno de 0,2% ou 0,3% do PIB ao longo dos próximos quatro anos, com a economia a crescer acima de 2% em 2024 e 2025.