Alegada prática de fixação de preços
13 dezembro 2024 às 17h10
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Fabricante da Nivea em Portugal poderá ter lesado consumidores em 152 milhões de euros, diz Ius Omnibus

Associação europeia para os direitos dos consumidores encomendou um estudo que avalia em mais de 152 milhões de euros os danos para os consumidores portugueses pela alegada prática de fixação de preços da Beiersdorf Portuguesa, supostamente em acordo com grandes grupos de distribuição.

A associação Ius Omnibus considera que a Beiersdorf Portuguesa – fabricante de produtos como a Nivea ou os pensos Hansaplast – poderá ter lesado os consumidores portugueses em 152,6 milhões de euros, sendo essa a sua meta na ação coletiva que interpôs e corre termos no Tribunal da Concorrência, tal como DN revelou na edição impressa desta sexta-feira

Questionada pelo DN sobre a que montante pode ascender a indemnização por parte da Beiersdorf Portuguesa, a secretária-geral da Ius Omnibus, Carolina Ramalho dos Santos, respondeu que, “de acordo com o relatório económico preliminar pedido pela Ius Omnibus a uma entidade internacional especializada, a estimativa dos danos causados pela Beiersdorf pode ascender a 152.660.619 euros”.

Sendo uma entidade europeia de defesa dos consumidores, a Ius Omnibus considera – e quer ver provado em tribunal – que a Beiersdorf Portuguesa beneficiou da “prática de um acordo - ou, subsidiariamente, de uma prática concertada - com as empresas de distribuição participantes, de fixação de preços de venda e outras condições de transação” na venda de produtos de cuidados da pele em lojas de distribuição.

Ou seja, especifica Carolina Ramalho dos Santos, “a Ius Omnibus considera que na ação que apresentou contra a Beiersdorf existem evidências de que os consumidores residentes em Portugal foram lesados pela Beiersdorf dado que esta entidade , enquanto fornecedora, coordenou com grandes cadeias de supermercados portugueses os preços dos seus produtos para venda aos consumidores”. As provas baseiam-se em elementos divulgados pela Autoridade da Concorrência, sublinha a responsável. Aliás, o processo agora apresentado “foi inspirado na infração declarada na Decisão da AdC de 15 de junho de 2022, mas não está dependente de qualquer decisão que venha a ser tomada sobre o processo de contraordenação”, salienta.

Esta alegada concertação, que terá prejudicado os consumidores portugueses, terá ocorrido entre 23 de maio de 2008 e 2 de maio de 2017, segundo o processo.

“São representados nesta ação todos os consumidores residentes em Portugal que adquiriram em Portugal, pelo menos entre estas datas, produtos comercializados pela Beiersdorf. Em caso de sucesso da ação, será o tribunal a fixar o montante global da indemnização a ser paga pela Beiersdorf aos consumidores”, disse Carolina Ramalho dos Santos.

O DN perguntou à Ius Omnibus que tipo de provas os consumidores portugueses devem ter na sua posse para aderirem à ação, como por exemplo prova de compra de produtos do fabricante entre as datas citadas.

A secretária-geral da Ius Omnibus respondeu que “será o tribunal que irá decidir as provas que deverão ser apresentadas pelos consumidores para reclamarem a sua parte da indemnização”.

Contactada pelo DN, a Beiersdorf Portuguesa afirmou que não pode comentar o tema porque “até ao momento” não recebeu “qualquer informação oficial do tribunal”. “Em todo o caso, sublinhamos que o cumprimento das normas legais, especialmente no que diz respeito às regras de concorrência, é fundamental na Beiersdorf”.

A Ius Omnibus defende que a Beiersdorf Portuguesa seja condenada a indemnizar os consumidores representados nesta ação pelo sobrepreço pago em consequência das práticas anticoncorrenciais em causa, em montante global a fixar. O anúncio do processo esclarece que todos os consumidores portugueses estão representados nesta ação coletiva, podendo dessa forma ser indemnizados.

A associação pretende que seja declarado em tribunal que a prática da Beiersdorf “teve efeitos em todo o território nacional e causou danos aos interesses difusos e/ou coletivos de proteção do consumo de bens e serviços e da concorrência, e aos interesses individuais homogéneos dos consumidores representados”.

No ano passado, a Beiersdorf registou um volume de vendas de 9447 milhões de euros, um crescimento de 10,8% face ao exercício de 2022. O resultado operacional atingiu 1268 milhões de euros em 2023 e o lucro líquido fixou-se em 876 milhões. O grupo alemão emprega quase 22 mil pessoas a nível mundial.

Em 2022, a Autoridade da Concorrência (AdC) deu como provado que a Auchan, Modelo Continente, Pingo Doce, a Beiersdorf Portuguesa e um responsável desta empresa participaram num esquema de fixação de preços de venda ao consumidor dos produtos de higiene pessoal e cosmética deste fornecedor alemão. Na altura, a AdC aplicou uma multa global de 19,5 milhões de euros.

A coima mais elevada foi aplicada ao responsável da Beiersdorf (9,2 milhões de euros). A Modelo Continente foi alvo de uma multa de 7,5 milhões, seguindo-se o Pingo Doce (4,8 milhões), a Beiersdorf (4,4 milhões) e a Auchan (2,6 milhões).

Na ocasião, o supervisor revelou ter sido apurado que as empresas de distribuição asseguraram o “alinhamento dos preços de retalho” nos supermercados, mediante contactos estabelecidos com o fornecedor. O processo foi considerado “equivalente a um cartel”. No direito da concorrência designa-se como hub-and-spoke.

No entanto, a presente ação da Ius Omnibus está limitada à Beiersdorf e não às cadeias de distribuição nacionais. “A Ius Omnibus considera que os direitos dos consumidores estão salvaguardados com a apresentação da ação contra o fornecedor, sem prejuízo de, na eventualidade de se considerar pertinente, as empresas de distribuição poderem vir a ser também responsabilizadas pela concertação dos preços dos produtos da Beiersdorf”, admitiu, no entanto, a responsável.