Quando começou o processo?
A Operação Marquês iniciou-se em 2014, conduzida pelo procurador Rosário Teixeira e pelo juiz Carlos Alexandre. Tudo surgiu depois de uma denúncia, no ano anterior, feita pela Caixa-Geral de Depósitos (CGD) à Unidade de Informação Financeira da Polícia Judiciária, que dava conta de um possível esquema que teria rendido quase mais de meio milhão de euros a José Sócrates, que se tornou no principal arguido desta investigação. O ex-primeiro-ministro viria a ser detido a 21 de novembro de 2014, quando chegava a Lisboa num voo vindo de Paris, indiciado pelos crimes de fraude fiscal, branqueamento de capitais, corrupção e tráfico de influência. Ficaria, então, em prisão preventiva no Establecimento Prisional de Évora, onde esteve durante quase um ano, tendo saído em setembro outubro de 2015, após ter as medidas de coação revistas.
O que está no centro da investigação?
O primeiro foco da investigação foram os mais de 23 milhões de euros reunidos por Carlos Santos Silva que foram transferidos da Suíça para Portugal, primeiro em 2004 e, depois, em 2010 e 2011. O empresário - amigo próximo de Sócrates - tinha uma conta no Banco Espírito Santo (BES), em seu nome, que o Ministério Público (MP) acreditava servir para cobrir despesas feitas em nome de Sócrates. Além disso, o MP dizia na acusação que o primeiro-ministro recebia dinheiro em mãos,e, entre outras coisas, dispunha de verbas para pagar férias ou ter à sua disposição a casa de Carlos Santos Silva em Paris. As suspeitas iniciais de corrupção recaíam apenas sobre o grupo Lena, pois o MP acreditava que o dinheiro na Suíça eram contrapartidas pelo favorecimento que Sócrates teria feito à construtora, enquanto responsável político, em obras ligadas ao TGV e à Parque Escolar. A investigação acabou por conseguir encontrar aquilo que considerou ser a origem do dinheiro, mantendo suspeitas de corrupção ligadas apenas a 2,9 milhões de euros de euros, que terão tido origem no grupo Lena, passando pela conta do administrador Joaquim Barroca. Foram também descobertos 12 milhões de euros que também passaram por contas na Suíça, controladas por Hélder Bataglia, administrador de uma empresa do Grupo Espírito Santo (GES), relacionada com o empreendimento de Vale do Lobo, no Algarve.
Quem são os arguidos?
A Operação Marquês foi, desde o início, um processo tido como complexo. O rol de arguidos, desde o início da acusação, tem 28 nomes. 19 são pessoas singulares, 9 são pessoas coletivas (empresas). O principal é, claro, José Sócrates. Mas, além do ex-primeiro-ministro, também foram constituídos arguidos, entre outros, Carlos Santos Silva, Joaquim Barroca, Hélder Bataglia, Ricardo Salgado, Armando Vara (ex-ministro de Sócrates) e a sua filha (Bárbara Vara), Zeinal Bava e Henrique Granadeiro (ex-líderes da Portugal Telecom, PT), Rui Horta e Costa (ex-administador do empreendimento de Vale do Lobo) e João Perna (ex-motorista de Sócrates que serviria de intermediário entre Santos Silva e o ex-governante, transportando envelopes com dinheiro. As suas contas foram também utilizadas para transferências entre os outros dois arguidos).
Já houve condenados?
Sim. Ao longo destes anos, Armando Vara e Ricardo Salgado foram condenados. No caso do ex-ministro (que já tinha sido condenado no âmbito do processo Face Oculta), foi-lhe aplicada uma pena de dois anos de prisão efetiva, em 2021, por um crime de branqueamento de capitais, depois de ter sido julgado num processo autónomo. Estava inicialmente acusado de crimes de fraude fiscal, branqueamento de capitais e fraude fiscal qualificada. Já o ex-banqueiro Ricardo Salgado foi, em 2022, também condenado a seis anos de prisão por três crimes de abuso de confiança. Em 2023, o Tribunal da Relação agravou a medida, passando para oito anos de prisão. João Perna, ex-motorista de José Sócrates, foi também condenado. Apanhado na posse de arma proibida, Perna foi levado a julgamento por esse facto. Foi condenado a prisão domiciliária, que entretanto foi alterada para liberdade mediante a apresentação semanal às autoridades.
Já todos os arguidos foram a julgamento?
Não. Inicialmente com 28 arguidos, o processo Marquês passou a ter, após a instrução (onde se decide se o caso segue ou não para julgamento), a cargo do juiz Ivo Rosa, apenas cinco a ir a julgamento. Foram eles: José Sócrates, Carlos Santos Silva, Armando Vara, Ricardo Salgado e João Perna. A decisão, vista como uma derrota em toda a linha do Ministério Público, foi alvo de recurso por parte dos procuradores. De acordo com Ivo Rosa, Sócrates devia ser julgado por crimes de branqueamento de capitais e três de falsificação de documentos; Santos Silva por três crimes de branqueamento de capitais e três de falsificação de documentos; Armando Vara por um crime de branqueamento capitais; Ricardo Salgado por três crimes de abuso de confiança, e João por um crime de detenção ilegal de arma.
Qual foi a decisão do Tribunal da Relação?
Esta quinta-feira, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu sobre o recurso interposto pelo Ministério Público. Segundo a decisão, todos os arguidos iniciais vão a julgamento. Ou seja: Henrique Granadeiro, Zeinal Bava, Joaquim Barroca, Helder Bataglia, Rui Horta e Costa, José Paulo Pinto de Sousa (primo de José Sócrates), o ex-diretor de Vale do Lobo Gaspar Ferreira (ex-diretor de Vale do Lobo), Luís Silva Marques e José Luís Ribeiro dos Santos (funcionários da Infraestruturas de Portugal), Gonçalo Trindade Ferreira (advogado), Inês do Rosário (mulher de Santos Silva), Sofia Fava (ex-mulher de Sócrates), e Rui Mão de Ferro (administrador de empresas) vão a julgamento. Isto além de José Sócrates, Ricardo Salgado, Carlos Santos Silva, Armando Vara e João Perna.