Num festival, o reconhecimento do público em relação a quem se apresenta em palco roça por vezes a crueldade. Por exemplo, neste mesmo palco, há uns anos, vimos uma lenda como o referido Neil Young ser ignorada nas primeiras filas por quem queria ver um grupo de quem já ninguém se recorda, e que ia atuar posteriormente. Ou, na sexta-feira, os Smashing Pumpkins de Billy Corgan e James Iha receberam mais reconhecimento de Win Butler, o líder dos Arcade Fire, do que da assistência.
Calhou às irmãs Kim e Kelley Deal e às suas The Breeders tocarem antes dos Sum 41 quando a lógica ditaria que, tal como Neil Young, deveria estar a encabeçar o cartaz. Afinal, o grupo não só se afirmou na sequência da saída de Kim Deal dos Pixies (que influenciaria todo o movimento grunge) como na época teve mais sucesso comercial.
Indiferentes a estas considerações, as The Breeders, que mantêm o trio de guitarras e voz desde o início, na viragem dos anos 80 para os 90, apresentaram-se com a simplicidade do sorriso eterno de Kim, a disfarçar a já respeitável idade, o groove e as suas melodias instantaneamente reconhecíveis num emaranhado sónico agridoce.
Vindas de outro festival, em Madrid, seguiram o mesmo alinhamento com que tinham tocado há menos de 24 horas, baseado quase na totalidade nos dois primeiros álbuns, Pod e Last Splash. Uma receita de sucesso -- afinal foram estes os seus momentos altos na carreira.
Vestida como uma funcionária administrativa, Kim Deal não liderou um grupo burocrático, embora incapaz de surpreender. Exceto para quem as desconhecia de todo ou quem não suspeitava que para a despedida seria brindado uma versão de Gigantic. Como no tema gravado no primeiro álbum dos Pixies também aqui foi cantado e tocado na guitarra baixo por Kim (tendo trocado de papéis com a baixista Josephine Wiggs para a ocasião), despedindo-se da melhor forma de uma cidade em que o grupo apenas tinha atuado na sua primeira vinda a Portugal, há mais de duas décadas.
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