Debate PS-PAN
10 fevereiro 2024 às 22h49
Leitura: 7 min

Pedro Nuno olhou o lítio nos campos, mas Inês recordou a trapalhada

Secretário-geral do PS e porta-voz do PAN divergiram na necessidade de suspender projetos económicos com impacto ambiental. E o primeiro acusou a segunda de ter “uma parte de centro-direita” na fiscalidade, com esta a responder que a classe média “está a ser dizimada”.

A possibilidade de suspender a exploração de lítio no Norte e o data center de Sines devido às dúvidas quanto ao impacto ambiental animou o debate entre o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, e a porta-voz do PAN, Inês de Sousa Real, transmitido pela TVI e pela CNN neste sábado. 

Reconhecendo ser “fundamental que cada projeto cumpra a lei”, o líder socialista defendeu que está em causa a “oportunidade de o país se desenvolver”, atribuindo a quem pretende travar esses projetos o ónus de “hipotecar o nosso desenvolvimento”. Mas teve que ouvir Sousa Real recordar a Operação Influencer, realçando que se tivesse sido cumprido a vontade de regulamentar o lobbying defendida pelo PAN, ter-se-ia sabido publicamente quem eram as pessoas que falaram com o ex-ministro João Galamba e “não teria havido esta trapalhada que aconteceu no final da legislatura”.

Inês de Sousa Real tem referido que o PAN foi o partido da oposição que maior número de iniciativas legislativas viu aprovadas pela maioria absoluta socialista, mas neste caso preferiu realçar que propôs a suspensão dos projetos que põem em causa o sobreiro e a rota do lobo ibérico, recebendo o voto contra do PS, que dessa vez preferiu não vestir a pele dos ambientalistas.

Pedro Nuno Santos fizera entretanto a apologia do lítio enquanto trave mestra da conciliação do desenvolvimento económico e sustentabilidade ambiental. Até porque, sustentou o até agora apenas sucessor de António Costa no que toca ao Largo do Rato, todos têm telemóveis, cujas baterias usam lítio, que tem a sua maior reserva da Europa (e oitava mundial) em Portugal. E bem pôde a porta-voz do PAN dizer que não se pode pôr em causa a biodiversidade e a qualidade de vida das populações, pois o interlocutor contrapôs que “não podemos estar no pára-arranca”, pois “o povo português merece viver melhor e num país mais rico”.

Antes disso, a localização do novo aeroporto internacional de Lisboa servira para o secretário-geral do PS retomar a frase recorrente “andamos há décadas a arrastar os pés”, escudando-se com o relatório da Comissão Técnica Independente para a opção por Alcochete. “O que falta é decidir”, disse, levando a porta-voz do PAN a acrescentar um “com transparência”, defendendo a solução “ambientalmente mais vantajosa” de Beja em vez de um local “que corre o risco de ficar submerso” e tem o óbice das rotas de aves protegidas.

A necessidade de uma solução que alivie o aeroporto já existente em Lisboa, numa lógica de complementaridade, não impediu Inês de Sousa Real de realçar que “não se pode deixar a ferrovia para trás”. Foi quanto bastou para o antigo ministro da tutela puxar dos galões, dizendo que “praticamente toda a rede ferroviária está em obras”, depois de ter estado “travada durante décadas”. “Por causa de um governo PS e, já agora, por causa de mim também”, disse Pedro Nuno Santos, sendo recordado pela interlocutora de que Portugal continua a ter uma rede que não liga todas as suas capitais de distrito.

No tema da fiscalidade, lançado pela moderadora Sara Sousa Pinto, houve choque entre os dois líderes partidários, com Pedro Nuno Santos a limitar-se a dizer que o PS “tem feito o esforço de reduzir o IRS nos últimos anos”, recusando “cortes cegos e transversais para todas as empresas” que têm sido defendidos pela Aliança Democrática e “pelos seus parceiros liberais e parceiros mais envergonhados”. Estaria a referir-se ao Chega, mas o facto é que também o PAN pretende que o IRC recue até aos 17%, naquilo que o secretário-geral do PS descreveu como “a parte de centro-direita” desse partido.

Já Inês de Sousa Real, que posicionou várias vezes o PAN no “centro progressista”, diferiu dos socialistas na denúncia de uma carga fiscal que põe os portugueses “a atravessar uma crise sócio-económica sem precedentes”, sendo necessário aliviar as pequenas e médias empresas - e não os 0,2% de empresas responsáveis por 40% da receita do IRC, como Pedro Nuno Santos tem defendido. Mas também vincou que é fundamental olhar para o IRS Jovem em particular, e para os impostos sobre o rendimento e o consumo em particular. “Não nos podemos esquecer que a classe média está a ser dizimada neste país”, disse a porta-voz e por enquanto deputada única.

O debate encerrou com os problemas da saúde, nomeadamente a atração e retenção de médicos nos hospitais públicos e centros de saúde. Com Pedro Nuno Santos a assumir a “tarefa que farei com muito gosto” de salvar o Serviço Nacional de Saude, prosseguindo o trabalho já iniciado de valorização da grelha salarial, Inês de Sousa Real salientou que é preciso ir mais longe. Algo que passa por “cumprir finalmente” a promessa de existir médico de família para todos os utentes, numa altura em que essa conta falha por um milhão, e também pela descida do IVA nos serviços médicos veterinários.

No final, confrontado com a possibilidade de o apelo ao voto útil o poder deixar sem parceiros parlamentares no pós-10 de março, Pedro Nuno Santos argumentou que “mesmo com maioria absoluta trabalhámos bem com o PAN e com outros partidos”, dramatizando os riscos para a sobrevivência do Serviço Nacional de Saúde, e para o compromisso com a transição energética e o combate às alterações climáticas, se a direita voltar a governar Portugal. Mas logo no início do debate Sousa Real dissera o que é óbvio, quando a moderadora lhe perguntou se estaria disponível para integrar um executivo liderado pelo interlocutor: “O diálogo só é possível após 10 de março.”