À entrada do Campo de Tiro (CT) estão cerca de 10 militares, perfeitamente fardados e alinhados. Aguardam o general João Cartaxo Alves, Chefe do Estado-Maior da Força Aérea (CEMFA), que é recebido ao portão pelo comandante da instalação militar, o coronel Manuel Bernardo da Costa, investido no cargo há pouco mais de um ano. A presença do chefe do Ramo naquela manhã de quarta-feira no CT, vizinho da vila de Alcochete, tem um motivo: assistir a um treino de tiro Ar-Solo, com munição real, e largada de bombas por dois caças F-16 das esquadras 201 e 301, sediadas na Base Aérea de Monte Real. Um tipo de treino raro, desde logo porque exige semanas de preparação e tem de obedecer a uma série de critérios de segurança.
A começar pelas condições meteorológicas, que permitam aos pilotos dos F-16 terem clara visibilidade dos alvos a atingir, sendo que este tipo de exercício não pode ser realizado no período de verão devido ao risco de incêndios. Depois, é necessária a presença, no CT, de equipas multidisciplinares que envolvam profissionais de inativação de engenhos explosivos, de assistência e socorro, de comunicações e controladores aéreos especializados. Antes de tudo isso, também é preciso informar as autarquias mais próximas do tipo de treino que vai ter lugar, para que estas, por sua vez, passem mensagem à população e evitem algum tipo de alarme face ao ruído causado pelos rebentamentos.
Este é também um tipo de treino que tem os dias contados no CT. Em maio deste ano, o Governo liderado por Luís Montenegro anunciou que o novo aeroporto que irá servir a cidade de Lisboa (e que terá o nome Luís de Camões) será construído nos terrenos onde hoje funciona o CT. Numa fase inicial será dotado de duas pistas, mas o plano permite a expansão da infraestrutura até quatro.
O Governo, que aponta o prazo de conclusão da obra apenas para 2034, argumenta que o novo aeroporto terá “a capacidade de acomodar a procura” crescente por Portugal, estimando-se que possa “ultrapassar os 100 milhões de passageiros” após 2050. O investimento inicial para a construção das duas pistas será de 6105 milhões de euros, mas a esta verba ter-se-á de somar os custos das deslocalização do Campo de Tiro para outra região – uma fatura que poderá ser na casa dos 250 milhões de euros, de acordo com o que chegou a ser noticiado pelo Público.
A hipótese mais forte é a zona de Mértola, já identificada em estudos realizados há mais de uma década (quando já se falava na possibilidade de o aeroporto vir para Alcochete). Na altura, foi feita uma pesquisa em várias zonas do país, que pudessem servir de solução, sem densidade populacional, sem estarem integradas na Rede Natura ou em zonas de aquíferos. Mértola emergiu como principal alternativa e à Força Aérea foi pedido que listasse os requisitos operacionais que necessitava, em termos de dimensões e espaço aéreo, para manter a continuidade do treino de tiro com todas as especificidades que este envolve.
A inevitável mudança de instalações do CT, seja para Mértola ou para outro destino, não tira, para já, o sono ao general João Cartaxo Alves, garantindo que estão abertas as linhas de diálogo entre os militares e o Governo na busca da melhor solução. “Sinceramente, na Força Aérea estamos muito tranquilos com essa matéria, porque é uma questão de que o Ministério das Infraestruturas está ciente. Já falou connosco, tem esse estudo, e sabe, claramente, quais são os requisitos funcionais que precisamos”, explica o CEMFA ao DN.