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03 junho 2024 às 20h07
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Plano para as migrações. PSD e CDS elogiam, oposição alerta para aumento de imigração ilegal

Pedro Nuno Santos considerou "vago" o plano do Governo. "O que vai acontecer necessariamente é mais imigração indocumentada", defendeu Mariana Mortágua. Cotrim não quer "meias-tintas" e Ventura ameaça votar contra.

O PSD e o CDS defenderam o novo plano do Governo para as migrações, aprovado em Conselho de Ministros, enquanto a oposição à esquerda alertou para o risco de um aumento da imigração ilegal.

No Parlamento, o PSD, pela voz do deputado António Rodrigues, elogiou "a nota do humanismo" desta proposta do Governo, sublinhando "a preocupação de acabar com a exploração dos trabalhadores" e de "tentar eliminar as redes de tráfico humano que existem dentro do país".

Para o deputado social-democrata, o fim do procedimento de manifestações de interesse que, disse, "abria a porta à imigração sem qualquer tipo de controlo, sem qualquer tipo de regulação" é uma "resposta necessária", bem como "a regulação da matéria dos vistos da CPLP".

O plano contempla a "agilização e priorização dos canais de entrada de imigrantes" para reagrupamento familiar, jovens estudantes, profissionais qualificados e nacionais dos países da CPLP.

O social-democrata rejeitou o risco de um aumento da imigração ilegal por "haver um reforço da fiscalização por parte das forças e serviços de segurança" com a "criação de uma unidade que vai regular esse mesmo tipo de atividade".

Já Paulo Núncio, líder parlamentar do CDS, começou por responsabilizar o antigo Governo do PS pela atual situação e elogiou a decisão do executivo, do qual os centristas fazem parte, de pôr "fim ao regime de porta aberta", ter reativado a "fiscalização em território nacional de imigração ilegal" e ter aumentado a "capacidade dos centros de instalação temporária".

PS teme que Governo crie novos problemas nos processos de regularização de imigrantes

O secretário-geral no PS considerou "vago" o plano do Governo para as migrações e advertiu que o fim da figura jurídica da manifestação de interesse criará um "vazio" legal e novos problemas, dificultando a regularização de imigrantes.

Este aviso foi transmitido por Pedro Nuno Santos em conferência de imprensa, depois de o primeiro-ministro, Luís Montenegro, ter apresentado as principais medidas do Governo para uma maior regulação das migrações.

Tendo ao seu lado a líder parlamentar socialista, Alexandra Leitão, e o "vice" da bancada do PS Pedro Delgado Alves, Pedro Nuno Santos começou por manifestar dúvidas sobre o sucesso de alterações ao nível da lei de estrangeiros no controlo de fluxos migratórios, contrapondo que é na "regulação e fiscalização do mercado de trabalho que as medidas podem ter maior impacto".

Em relação ao plano do Governo, o secretário-geral do PS disse "acompanhar objetivos de reforço dos meios da AIMA (Agência para a Integração, Migrações e Asilo) e dos serviços consulares".

"Mas a grande medida concreta deste plano é o fim [na lei de estrangeiros] da figura jurídica manifestação de interesses. Este conceito tem como objetivo regularizar a situação de trabalhadores que já estão a trabalhar em Portugal há pelo menos um ano, com contrato de trabalho e com descontos para a Segurança Social. Ora, o fim imediato desta figura jurídica vai deixar uma situação de vazio. Podemos estar a criar um problema para o futuro, com trabalhadores a trabalhar, a descontar mas sem possibilidade de se regularizarem", avisou o líder socialista logo na sua declaração inicial.

Neste ponto, deixou uma pergunta: "Como deve o país tratar alguém que está há mais de um ano a trabalhar em Portugal, que tem contrato de trabalho e descontos para a Segurança Social? A verdade é que o Governo não dá resposta e não se prevê que o reforço dos serviços consulares seja suficiente para que se acabe com esta figura jurídica", completou.

Perante os jornalistas, Pedro Nuno Santos rejeitou uma relação entre esta figura jurídica e a existência de cerca de 400 mil processos pendentes na AIMA e não excluiu em absoluto uma revisão da lei de estrangeiros.

"Mas não queremos que se alimente a ideia de que é através de alterações legislativas que vamos conseguir controlar os fluxos migratórios", ressalvou.

De acordo com o Plano de Ação para as Migrações hoje aprovado em Conselho de Ministros, é criada "a Unidade de Estrangeiros e Fronteiras (UEF) na PSP, atribuindo-lhe as competências do controlo de fronteira, de retorno (hoje na AIMA) e de fiscalização no território nacional".

Críticas à esquerda

À esquerda, sobraram críticas.

A coordenadora do BE, Mariana Mortágua, acusou o Governo minoritário PSD/CDS-PP de incentivar a imigração indocumentada no país com o novo plano para as migrações, criticando a extinção do mecanismo de manifestação de interesse.

"Tememos que este plano na verdade aumente o problema, porque se se elimina uma das formas de regularizar imigrantes que nos procuram, o que vai acontecer necessariamente é mais imigração indocumentada", defendeu Mariana Mortágua, em declarações aos jornalistas na Feira do Livro de Lisboa, à margem de uma ação de campanha para as eleições europeias.

A bloquista reagia ao Plano de Ação para as Migrações, apresentado hoje pelo executivo minoritário PSD/CDS-PP e que inclui o fim do mecanismo de manifestação de interesse, que permite a um imigrante pedir para obter um visto de residência em Portugal.

Na opinião de Mariana Mortágua, esta extinção abre "um vazio legal".

"Ao extinguir a manifestação de interesse - que é um mecanismo que também tinha problemas na sua aplicação prática e é preciso também reconhecer esses problemas - ao extinguir a manifestação de interesse o Governo o que está a fazer é eliminar a possibilidade de alguém que chega a Portugal em procura de trabalho e que encontra trabalho de se poder regularizar", acusou Mariana Mortágua.

Na ótica da bloquista, "o Governo diz 'só é regular em Portugal quem vier regular de fora' mas quem já está em Portugal ou chegar a Portugal à procura de trabalho não vai poder regularizar -se", acrescentando que "essa lei já foi aplicada no passado".

"O que é que acontece? As pessoas chegam indocumentadas a Portugal porque a economia precisa delas (...) e depois não têm forma de se regularizar, e de x em x tempo os processos acumulam-se e obrigam a uma regularização extraordinária. O que está a ser feito pelo Governo com este vazio legal é um incentivo à imigração indocumentada", insistiu.

António Filipe, deputado do PCP, criticou a falta de celeridade do Governo para resolver "o problema das 400 mil pendências de autorizações de residência na AIMA" 

"O Governo reconhece esse problema, mas aponta uma solução muito vaga da criação de uma unidade de missão, mas sem estabelecer nenhuma calendarização concreta, nenhum objetivo concreto quanto aos recursos humanos e físicos que é necessário disponibilizar para o mais rapidamente possível resolver esse problema", afirmou.

O deputado comunista argumentou ainda que o Governo "arrisca-se a criar um problema" de aumento de imigração ilegal de pessoas que "depois não terão possibilidades legais de regularizar a sua situação".

Também o secretário-geral do PCP considerou que o plano para migrações do Governo vai potenciar a imigração ilegal e não responde aos processos de regularização pendentes, e anunciou que o partido vai apresentar um diploma para reforçar a AIMA.

Em declarações aos jornalistas na Feira do Livro, Paulo Raimundo considerou que o plano "é igual aos que têm sido apresentados pelo Governo".

"Sobre os problemas concretos, imediatos, pouco ou nada. E sobre as questões de fundo, é resoluções para depois", criticou.

O líder do PCP referiu que há atualmente 400 mil imigrantes por regularizar que "não vão ver o seu problema resolvido com as 41 medidas que o Governo apresentou hoje para supostamente dar resposta a este problema da imigração".

Por outro lado, Paulo Raimundo criticou o facto de o executivo procurar também "restringir a imigração legal", o que considerou que vai "contribuir de forma decisiva para rebentar um problema nas mãos", referindo-se ao aumento da imigração ilegal, deixando mais pessoas à mercê do "tráfego de ser humano".

O deputado Jorge Pinto, do Livre, disse que este plano não "traz qualquer tipo de solução" e acusou o Governo de querer "recuperar eleitorado à extrema-direita pelas piores razões e com as piores propostas".

"É um plano no qual o próprio Governo dificilmente acredita, certamente o ministro da Economia não acredita neste programa, porque ele representaria acrescentar dificuldades à chegada de novos trabalhadores quando estes trabalhadores são essenciais para o país", afirmou.

O PAN, pela líder Inês Sousa Real, defendeu que "a extinção da manifestação de interesses é uma via verde para as empresas e um cartão vermelho para as pessoas" e criticou o que diz ser um "paradoxo" do primeiro-ministro Luís Montenegro ao querer "garantir uma política de integração humanista" sem ficar como é que se vai "conseguir ter uma maior proteção dos migrantes que estão em situação de vulnerabilidade social".

Inês Sousa Real sublinhou ainda a adesão do Governo à proposta do seu partido para "o reforço do investimento na aprendizagem da língua portuguesa".

O Governo pôs fim ao regime excecional que permitia a um estrangeiro entrar em Portugal e só depois pedir autorização de residência e anunciou a criação de uma estrutura de missão para regularizar processos pendentes, estimados em 400 mil.

IL espera que plano "não se fique pelas meias-tintas"

O cabeça de lista da Iniciativa Liberal ao Parlamento Europeu espera que o PSD leve o Plano de Ação para as Migrações hoje apresentado até ao fim e "não se fique pelas meias-tintas".

"Esperamos que [o plano] não fique apenas pelas meias-tintas como tem sido apanágio do PSD", afirmou João Cotrim de Figueiredo no final de uma visita à empresa Polivouga, em Albergaria-a-Velha, no distrito de Aveiro.

Apesar de considerar algumas das cerca de 40 medidas anunciadas pelo Governo PSD "bastante vagas e lacónicas", o candidato a eurodeputado assumiu ter ficado agradado com a extinção dos processos por manifestação de interesse, uma proposta que a IL sugeriu.

"Registamos com agrado que ela tenha sido acolhida no desenho final deste plano porque, no fundo, repõe os requisitos àquilo que eram antes de 2017 e são um bom exemplo daquilo que nós temos vindo a dizer nesta matéria, como noutras, que não podemos nem depender de boas intenções, nem de grandes proibições", frisou.

O liberal referiu que "das 600 mil pessoas que têm pendências na AIMA certamente dois terços são para manifestação de interesse que parece um processo muito humano e muito facilitador, mas que gerou esta autêntica confusão a que todos assistem e com que ninguém concorda".

O candidato da IL registou ainda com agrado a recuperação rápida das pendências na Agência para a Integração Migrações e Asilo (AIMA), algo que várias forças políticas vinham a pedir.

Nesta sequência, Cotrim de Figueiredo voltou a criticar a extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) porque a criação de uma nova entidade tinha que estar "muitíssimo bem preparada", algo que não aconteceu.

Apesar de satisfeito com estas duas medidas, Cotrim de Figueiredo revelou não ter ficado convencido com o reforço dos serviços consulares nos países de origem.

"Queria sublinhar, quase que em jeito de alerta, que não fiquei convencido que aquilo que é designado como o reforço dos serviços consulares nos países de origem seja suficiente para evitar uma coisa que seria, do nosso ponto de vista, também muito negativa que é transferir uma situação de indignidade humana das pessoas que estão já no território nacional para o mesmo tipo de indignidade de pessoas que não conseguem nos seus territórios de origem usar os serviços consulares portugueses", vincou.

Por isso, Cotrim de Figueiredo espera que o plano para as migrações seja "levado até ao fim", nomeadamente no que diz respeito ao reforço dos serviços consulares.

Na sua opinião, é necessário fazer avanços relativamente às migrações porque é "um problema que tem de ser resolvido e encarado" e um tema "que não pode ficar exclusivo da extrema-direita.

E tem de ser resolvido começando por cumprir as regras que já estão em vigor e este plano, acrescentou, em boa parte faz isso.

Chega ameaça votar contra

O presidente do Chega ameaçou votar contra o plano do Governo para a imigração se continuar ineficaz e apresentou uma "carta de exigências", desafiando o executivo a introduzir quotas.

Em declarações aos jornalistas na sede do Chega em Leiria, antes de uma ação de campanha para as eleições europeias, André Ventura afirmou que o plano apresentado pelo Governo "acaba por se revelar frouxo, mal formado e pouco eficaz".

"Se este plano se mantiver com o nível de inconsequência e ineficácia, não terá nenhuma hipótese de passar na Assembleia da República", indicou.

O líder do Chega enumerou quatro diplomas, alguns dos quais já anunciados, referindo serem "uma carta de exigências ao Governo".

André Ventura quer a introdução de quotas, que imigrantes condenados por crimes sejam encaminhados para o seu país de origem, facilitar o regresso dos estrangeiros por sua vontade e fechar fronteiras até estar regularizada a situação dos imigrantes que já estão em Portugal e aguardam decisão.