Será que os ativistas climáticos sabem que também estão a deixar uma pegada carbónica quando convocam protestos pelo whatsapp ou publicam nas redes sociais os vídeos das suas ações que rapidamente viralizam na net? Provavelmente não, mas na verdade estarão a conectar-se a qualquer coisa como 100 data centers em simultâneo em várias partes do mundo, que consomem enormes quantidades de energia e emitem largas quantidades de gases com efeito de estufa. E se soubessem, estariam, estaríamos todos dispostos a mudar o modo de comunicarmos?
Em plena era digital vivemos na ilusão da desmaterialização. Porque usamos menos papel e comunicamos sem fios, tudo nos parece limpo, sem espinhas. Mas não é assim. Para além dos 1,2 milhões de quilómetros de cabos submarinos de fibra ótica, que ligam continentes, e de antenas cada vez mais potentes a emitir radiações, estima-se que a Internet e a indústria digital associada produzam aproximadamente as mesmas emissões de CO2 por ano do que a aviação. De acordo com estimativas do Programa da ONU para o Meio Ambiente, o setor digital será mesmo responsável por cerca de 3% das emissões globais de gases com efeitos de estufa e a tendência vai no sentido de um rápido reforço da digitalização e não o inverso.
O gesto mais singelo que fazemos todos os dias de enviar um e-mail, uma fotografia ou colocar um ‘gosto’ ou comentário nas redes sociais viaja através de múltiplas camadas da infra-estrutura cibernética, consumindo muita energia fóssil, nomeadamente, em servidores alojados em centros de dados de grandes proporções. É por isso que há quem lhe chame, à internet, “ a maior máquina movida a carvão na Terra”.
E à medida que a tecnologia vai ficando mais sofisticada, a pegada carbónica aumenta. É o caso da Inteligência Artifical generativa que usamos para obter respostas simples, que consome quatro a cinco vezes mais energia que uma busca convencional na Net, adverte Paul Gillaume Pitron, jornalista, investigador e autor de The Dark Cloud - How the Digital Industry is Costing the Earth, entre outros livros sobre a pegada ambiental do setor digital.
Não é, por isso, de estranhar a estimativa de, já no próximo ano, esta indústria se transformar no quarto maior consumidor de energia do mundo, atrás de países como China, Índia e EUA.
É um paradoxo, mas quando entramos no mundo da nanotecnologia, “quanto mais fino, discreto e pesado é o aparelho no seu bolso, mais óbvias podem ser as consequências ambientais no outro extremo do mundo, de onde esses produtos provêm, que é numa mina”, disse o especialista francês numa entrevista ao podcast norte-americano HC Insider.
Só o processo de fabrico de um smartphone, por exemplo, equivale a cerca de 80% das emissões de carbono ao longo da sua vida útil. Se pensarmos que existem cerca de 34 mil milhões de dispositivos (telemóveis, tablets e computadores) em circulação e que estes são feitos de mais de 15 metais em média, podemos logo ter uma ideia do impacte ambiental, observa Paul Guillaume Pitron. “Para extrair os minerais do solo e refiná- los é necessária água e eletricidade para transformar o recurso em metal. E para mover e juntar todos os componentes de várias partes do mundo, são necessários aviões que usam petróleo”. O especialista aprofunda a explicação: “Se calcularmos a quantidade total de recursos que são incluídos, direta e indiretamente, no produto acabado que é o seu telefone, teremos o que chamamos MIPS - uma entrada de material por unidade de serviço-, que é uma relação entre o produto final e todos os recursos usados. Essa proporção pode ser de 100 para um, 200 ou 300 para um, se estivermos a falar de uma caneta, uma camisa ou um livro. A proporção mais alta possível foi calculada para o microchip do smartphone e é 16.000 por 1, o que significa que requer 16.000 vezes mais recursos do que a forma final do produto”.