Agressão em Famalicão arquivada
26 julho 2024 às 06h47
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IGAI quer forças especiais da PSP com identificação sempre à vista

Caso remonta ao jogo de futebol entre o Famalicão e Sporting, em fevereiro, quando um polícia agrediu uma pessoa. O processo foi arquivado por falta de identificação do culpado.

Um processo sobre uma agressão por parte de um agente da Unidade Especial de Polícia, da PSP, a uma pessoa que acabou com um ferimento de 13 centímetros na cabeça foi arquivado por não ter sido possível identificar o polícia, revela um despacho da inspetora-geral da Administração Interna, a juíza desembargadora Anabela Cabral Ferreira, ao qual o DN teve acesso. No documento, é feita a recomendação de que os polícias passem a estar identificados.

A juíza desembargadora destaca a “recomendação” para que “os agentes das unidades especiais de polícia” exibam “um elemento de identificação visível e frontal quando em exercícios de funções”, sendo o objetivo derradeiro desta orientação consagrada na lei haver “uma polícia mais próxima e de confiança para o cidadão”.

Mas vamos aos factos. Tudo aconteceu no momento em que os adeptos leoninos se dirigiam ao estádio onde iria acontecer o jogo de futebol entre o Famalicão e o Sporting, em 3 de fevereiro deste ano. O jogo não aconteceu, devido à ausência do policiamento habitual, motivada por um protesto das forças de segurança.

Nada disto impediu que houvesse seis feridos, como consequência dos desacatos entre adeptos, e pelo menos uma pessoa foi agredida por um polícia, com necessidade de ser transportada para o hospital.

O queixoso desta agressão em concreto estava acompanhado pela mulher e ambos iam assistir ao jogo. No início, estavam com adeptos do Sporting, que se envolveram em confrontos com adeptos do Famalicão, levando o casal a ficar para trás.

O “Corpo de Intervenção da Força Destacada da Unidade Especial de Polícia recorreu à utilização de meios coercivos de baixa potencialidade letal”, lê-se no relatório final do inquérito do processo de natureza disciplinar (PND), entretanto aberto.

O casal acabou a fugir dos disparos: o homem refugiou-se atrás de um carro e a mulher conseguiu abrigo num alpendre.

Com os polícias a aproximarem-se, o homem “levantou-se devagar com as mãos no ar”, continua o relatório, acrescentando que “nesse momento, um elemento da Unidade Especial de Polícia, de identidade não apurada”, acabou por lhe desferir, “com cassetete, uma pancada na cabeça”.

Depois de ter ligado para a mulher, com a cabeça a sangrar, o queixoso ficou no local, sentado, até que um “técnico de emergência médica”, que estava no outro lado da rua, tentou socorrê-lo. Como primeira diligência, a testemunha pediu a um dos polícias que chamasse uma ambulância.

A resposta foi negativa. Ele que a chamasse, disseram - o que aconteceu. Depois, o técnico pôs alguns guardanapos na cabeça da vítima, até que “chegaram três agentes da Unidade Especial de Polícia”, com um a dizer: “Larga, ca*****! Larga ca*****!”, sustenta o documento da Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI).

A testemunha justificou ao agente que estava obrigada a prestar apoio médico, dada a sua profissão, e alegou que o polícia, ao impedir o ato, estaria a cometer uma ilegalidade. Com o obstáculo a manter-se, a testemunha pediu ao polícia que se identificasse, para que pudesse avançar com uma queixa, e foi aí que lhe foi permitido continuar a prestar auxílio à vítima. Mas ainda ouviu, por parte de um agente: “Deves ser um grande santinho para estares a ajudá-lo. Deves ser um anjo.”

Nenhum dos agentes foi identificado e o caso acabou arquivado. A vítima foi transportada para o hospital com uma ferida de 13 centímetros, que acabou suturada com 10 pontos. O PND que resultou da agressão foi sublinhado pela queixa apresentada pela vítima, e a queixa foi sugerida por por um agente, a quem a testemunha recorreu, pedindo, também sem sucesso, a identificação dos agentes envolvidos.

Caso não é inédito

A Recomendação n.º 1/2024, de 18 de janeiro, sublinha a “obrigatoriedade de identificação visível frontal dos agentes das unidades especiais das forças de segurança [PSP e GNR]”. A juíza recorda que esta recomendação, sem “força vinculativa”, teve origem no caso em que, num jogo de futebol entre o Vitória de Guimarães e o Boavista, em 2014, “três elementos do Corpo de Intervenção agrediram um cidadão, causando-lhe cegueira”, sem que, entre os 11 polícias acusados, tivesse sido possível encontrar um único culpado, por falta de identificação. Foram todos absolvidos.

Termos do processo

O despacho da IGAI diz que não seria inevitável o arquivamento do processo, salvaguardando “que foram praticados atos merecedores de censura disciplinar” por cinco agentes, “não tendo sido, por qualquer meio, possível obter a sua identificação”.

Factos apurados

O despacho é cabal a sublinhar que um cidadão foi agredido com um cassetete, por um polícia, sem que nada o justificasse. Foram ouvidas 14 testemunhas e nenhuma conseguiu apontar qualquer elemento de identificação dos agentes. Há um número na parte posterior dos capacetes dos polícias, mas, pelo local onde se encontra, não facilita a identificação. Alguns dos polícias tinham as proteções dos ombros para cima, o que ainda dificultava mais a identificação.