Ator com uma filmografia de quase duas centenas de títulos, ícone de um certo cinema “anti-sistema” das décadas de 1960/70, popularizado em anos recentes junto dos espectadores mais jovens pela interpretação do Presidente Snow na série de filmes The Hunger Games, Donald Sutherland faleceu nesta quinta-feira, Miami, após doença prolongada - contava 88 anos.
Será, por certo, algo exagerado, mas é um facto que a “imagem de marca” de Sutherland se consolidou através da interpretação de algumas personagens em que o aspeto mais ou menos agressivo, porventura sinistro, não exclui, antes parece atrair, uma dimensão irónica e divertida, por vezes à beira do burlesco. Para tal contribuiu, antes de tudo o mais, o seu capitão Hawkeye Pierce, personagem desse enorme sucesso que foi M*A*S*H, comédia negra de 1970, realizada por Robert Altman, retratando o comportamento pouco ortodoxo de uma unidade médica do exército americano, em 1951, durante a Guerra da Coreia (as iniciais do título remetem para Mobile Army Surgical Hospital).
Caricaturando regras e comportamentos do universo militar, M*A*S*H estava longe de ser uma mera atualização de um modelo tradicional de comédia. Tal como outras produções da mesma época, o filme de Altman envolvia um subtexto político visando a discussão e, mais do que isso, a contestação da Guerra do Vietname - também em 1970, o western O Pequeno Grande Homem, de Arthur Penn, com Dustin Hoffman, e Woodstock, de Michael Wadleigh, documentando o lendário festival realizado em agosto de 1969, participavam da mesma conjuntura artística e ideológica que, para a história, ficou registada com a designação sugestiva de “contra-cultura”.