Da convicção de “não querer afetar” o Orçamento do Estado (OE), à afirmativa promessa de que “[a Vinci] terá de pagar” o novo aeroporto, passando pela certeza recente do “nem um euro para os contribuintes”, surgiu agora o aparente “cenário” de uma ”intenção” sem “encargos diretos para os contribuintes”.
O esclarecimento “necessário”, diz ao DN fonte governamental, surge depois de Miranda Sarmento, ministro das Finanças, ter revelado, com o ministro das Infraestruturas a seu lado, que o Governo ia tentar que os “encargos” da construção do aeroporto em Alcochete fossem “o mais limitados possíveis” e “se possível até sem qualquer impacto para os contribuintes”.
A 14 de maio, Miguel Pinto Luz, durante a apresentação do novo aeroporto, garantia ser “compromisso” do Governo “não” querer “afetar de maneira nenhuma o OE” com a construção do novo aeroporto.
No dia seguinte, numa entrevista à CNN, o ministro das Infraestruturas foi mais incisivo: ”Naturalmente, é a própria concessão que terá de pagar o aeroporto”.
A 24 de julho, no Parlamento, questionado pelos deputados da oposição, Miguel Pinto Luz voltou a garantir que o aeroporto “será construído sem verbas do OE” poupando, assim, “os contribuintes de esforços suplementares”. E até garantiu que “as receitas futuras fazem parte dos bolsos dos contribuintes” afastando, desta forma, o cenário de “direta ou indiretamente” o Estado “financiar o novo aeroporto de Lisboa”.
Argumento? A solução de um novo aeroporto em Alcochete iria gerar “verbas suficientes para pagar toda a infraestrutura” não só através das taxas aeroportuárias, mas também através da criação de um “polo de desenvolvimento de tecnologias”.
A 7 de novembro, novamente no Parlamento, e mais uma vez questionado por deputados da oposição, Miguel Pinto Luz não hesitou e foi mais esclarecedor: “Nem um euro para os contribuintes”.
Na terça-feira, Miranda Sarmento, na cerimónia de receção do relatório inicial da ANA com as condições da concessionária para a construção do aeroporto, traçou outro cenário: “Vamos procurar que os encargos para o Orçamento do Estado sejam o mais limitados possíveis, se possível até sem qualquer impacto para os contribuintes”.
A “revelação”, refere ao DN fonte governamental, obrigou a um esclarecimento conjunto, em comunicado, do ministério das Infraestruturas e do das Finanças, contrariando “suavemente” a frase “malsucedida” e “infausta”de Miranda Sarmento.
O Governo mantém, assim, a “intenção [não é referida a certeza de declarações anteriores] de não onerar diretamente o OE com a construção do aeroporto”. Justificação? “O relatório da ANA apresenta um cenário em que não há encargos diretos para os contribuintes, redobrando a convicção do Executivo”. Na prática, “a convicção” de que o aeroporto será financiado através das taxas aeroportuárias e da extensão do prazo de concessão - ou por ambas.
Já sobre a diferença de custos de 6 mil milhões de euros para os cerca de 9 mil milhões, referida em vários jornais, “nem uma palavra”.
Miguel Pinto Luz, que nega contradições e desentendimentos com Miranda Sarmento, considerou ontem que tanto ele como o ministro das Finanças foram “claros” - no comunicado - e que, “numa primeira análise do relatório, o que podemos dizer aos portugueses é que a ANA, a Vinci, apresenta uma solução onde não há aporte para o OE. Esse era o nosso compromisso”.
Perante “as dúvidas e até contradições no seio do Governo, nomeadamente entre os Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Ministro das Infraestruturas e Habitação”, o PS exige “informações concretas” sobre o relatório, a “estimativa preliminar dos custos e a forma de financiamento, bem como a proposta de duração e conclusão da construção”.
O PCP exige a presença de Miguel Pinto Luz no Parlamento e explicações sobre “os contornos deste negócio e sobre o que é que o Governo está disponível para ceder à ANA em prejuízo do país”.
O Chega, por seu lado, considera um “escândalo” que ainda sem novo aeroporto já “estejamos a ver as obras e o dinheiro a derrapar”.
A mesma “preocupação” é partilhada pela IL que quer ainda explicações sobre “o discurso político do Governo que prevê que venha a ser necessário esse financiamento por parte dos contribuintes”.
BE tem uma pergunta: “O que é que aconteceu entre maio e dezembro para, afinal, o novo aeroporto poder mesmo ser pago pelos contribuintes portugueses e para os seus lucros serem explorados pela Vinci?”.
O ministro das Infraestruturas diz estar disposto a ir Parlamento ainda que este agora seja o “tempo do Governo” analisar o relatório da ANA que “não é público”.