Debate PSD-BE
06 fevereiro 2024 às 23h13
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Paradigmas públicos e privados com vantagem de Montenegro sobre Mortágua

Debate entre líder social-democrata e a coordenadora bloquista pôs em confronto visões inconciliáveis do que deve ser Portugal. Com Montenegro mais hábil a colar Mortágua às falhas da governação socialista na saúde do que esta a associá-lo à "expulsão dos idosos" e ao sobressalto da avó ao receber a carta do senhorio.

Num debate em que se confrontaram duas visões totalmente divergentes do que deverá ser o presente e o futuro de Portugal, Luís Montenegro e Mariana Mortágua entraram para o estúdio da TVI armados com acusações recíprocas de obsessão em relação aos privados ou ao Estado. Grande parte da vantagem obtida pelo líder social-democrata sobre a coordenadora do Bloco de Esquerda residiu na maior clareza com que defendeu o seu caminho, mas também passou pela capacidade de colar a interlocutora aos piores momentos da governação socialista.

Mariana Mortágua entrou ao ataque e aproveitou que a moderadora Sara Sousa Pinto, da TVI, tenha apresentado as "ideias muito diferentes" dos dois líderes partidários dizendo que a bloquista quer "mais intervenção do Estado" e o social-democrata pretende "mais intervenção dos privados". "O Bloco de Esquerda defende soluções e o PSD defende o agravamento dos problemas", corrigiu, descrevendo as propostas da Aliança Democrática para a saúde como uma forma de a tornar "mais cara e pior para as pessoas" e em que o Estado "estaria a pagar aos privados para irem buscar médicos ao Serviço Nacional de Saúde", repetindo várias vezes que tal seria a consequência dos cheques-cirurgia defendidos por Montenegro para fazer frente às listas de espera.

Foi a oportunidade para Montenegro lamentar que Mortágua "tenha pouca confiança no Serviço Nacional de Saúde", que a AD diz querer "salvar de uma caminhada de degradação que tem o cunho e o contributo" do Bloco de Esquerda, tendo em conta o apoio que deu a dois dos três governos de António Costa. Reconhecendo a existência de problemas estruturais do SNS - "que tem de ser salvo das tropelias que vocês lhe impuseram", vincou -, voltou a defender um programa de emergência que garanta médico de família e vouchers de cirurgia através da oferta do setor privado e social da saúde, com vista a acabar com listas de espera até 2025.

Acusando Mortágua de ser "candidata a ministra da Saúde de Pedro Nuno Santos" e de estar "obcecada com o Estado" em vez de se "preocupar com os cidadãos", Luís Montenegro voltou ao tema das parcerias público-privadas (PPP) em hospitais que "funcionavam melhor, com maior capacidade de resposta e sem urgências fechadas", acrescentando que, "se calhar, é por isso que o Bloco de Esquerda vem diminuindo a sua representação".

Sem surpresa, a coordenadora bloquista recorreu a relatórios do Tribunal de Contas para apontar às PPP "desempenho igual ou pior do que os hospitais de gestão", no que foi prontamente desmentida pelo líder social-democrata, defendendo que a única forma de resolver os problemas do SNS é o regime de exclusividade dos médicos, ao qual apontou um custo de 500 milhões de euros. "A grande proposta da AD é que todos os médicos vão para o privado", rematou, levando a que Montenegro lhe apontasse a "hipocrisia" de esconder que "nenhuma unidade de saúde pública funciona sem recurso aos privados", sendo que nesses casos "vão recrutar às escondidas".

Na parte do debate dedicado à habitação, Mariana Mortágua criticou a "política de especulação e de selva no arrendamento" da direita, contrapondo-lhe a imposição de regras que imponham tetos nas rendas e uma baixa de juros no crédito à habitação através do recurso a uma baixa de spread de 1,5 pontos percentuais na Caixa Geral de Depósitos. "E já agora fechava os outros bancos", cortou Montenegro, contrapondo "regras mais fáceis e menor castigo fiscal" para os promotores imobiliários.

"Para Montenegro o Estado só serve para garantir lucros dos privados e da especulação", acusou a bloquista, que não se furtou a uma das suas recorrentes menções aos "oligarcas de Putin", apontando-os como inspiração para o programa de vistos gold. Também não foi esquecida "a lei que expulsou idosos", mas já sem a referência à então ministra com a tutela da Habitação que promoveu alterações no regime de arrendamento, Assunção Cristas, com Mariana Mortágua a partilhar as suas memórias familiares. "Vi o sobressalto da minha avó ao receber a carta dos senhorios", disse.   

Noutro momento do debate, após ouvir a interlocutora repetir que a Aliança Democrática ainda não apresentou o seu programa eleitoral - o que irá ocorrer na próxima sexta-feira -, Luís Montenegro optou pelo humor: "Sei que se tem em boa conta, mas o programa eleitoral da AD não é de acordo com a Mariana Mortágua."

Até ao final houve novo confronto, desta vez quanto à melhor forma de aumentar os rendimentos do trabalho, com a bloquista a recusar "dar dinheiro público a grandes empresas para fazerem o que deviam fazer", defendendo a tributação "justa" dos salários. Por seu lado, o social-democrata dirigiu-se à "classe média fustigada de impostos por todos os lados", apontando uma descida de seis mil milhões de euros na cobrança ao longo da próxima legislatura. Mortágua disse que acredita "numa economia mais justa", acusou Montenegro de, com a descida do IRC, querer "reduzir impostos à banca, à grande distribuição e às empresas de energia", mas no que toca a redução de IRS não foi além de 256 milhões de euros.