No entanto, e segundo esclarece Milton Severo, não quer dizer que Portugal se mantenha como único com esta classificação, pode haver algum atraso na atualização dos dados por parte de alguns países, que possam crescer mais tarde no que toca ao excesso de mortalidade. O site revela mesmo que a Alemanha e a Ucrânia não atualizaram os dados na última semana.
A questão é que não é a primeira vez que Portugal tem esta classificação. “Já aconteceu noutros anos, pré-pandemia, e até mesmo durante a pandemia, em janeiro de 2021”, destaca o especialista, considerando que esta “é uma situação preocupante” que deve “ser estudada de forma a aprofundar-se as causas”. Segundo explicou ao DN, “o nosso país está nesta altura entre os 10 e os 15 desvios de padrão à média esperada para o excesso de mortalidade e isto é muito elevado”.
Ontem, o site do Ministério da Saúde, que faz a vigilância da mortalidade em Portugal, dava conta de que, nos últimos sete dias, houve 797 mortes a mais do que o esperado. Na última sexta-feira este número foi de 751.
O excesso de mortalidade em Portugal está, à partida, associado ao envelhecimento natural da população e às ondas de temperaturas extremas, mas “é necessário aprofundar o que está, de facto, a gerar esta situação para que possamos proteger a população mais idosa, mais frágil, e conseguirmos descer o excesso de mortalidade. É preciso um estudo de forma mais rigorosa para se ir mesmo à raiz da situação”, defende Milton Severo.
De acordo com a sua análise dos números, “esta onda de gripe está dentro do esperado”, o que não está é este elevado excesso de mortalidade. E o que parece haver de diferente em relação a outros parâmetros, como episódios de urgências, tempos de espera e diagnósticos de infeções respiratórias, “é o tempo médio de espera para a primeira observação médica dos doentes”.
Ou seja, sustenta, “o número estimado de episódios de urgência está dentro do esperado, a taxa de diagnóstico de infeções respiratórias está um bocadinho acima da média, mas dentro de valores registados anteriormente, a grande diferença é mesmo o tempo médio de espera para a triagem dos doentes, que aumentou muito. Normalmente, e de acordo com os valores de anos de referência, o tempo médio de espera rondava os 30 minutos para a primeira observação médica, na última semana este tempo registou uma média de duas horas, o que é uma grande diferença”.
O especialista do Porto refere igualmente ser normal que, a seguir ao Natal, suba a quantidade de infeções respiratórias, dado o aumento de contactos entre a população, mas considera que o excesso de mortalidade registado “é preocupante”. “Podemos ter sido o primeiro país a desenvolver uma onde epidémica de gripe, mas estamos claramente acima dos restantes países europeus”, diz.
Por outro lado, salvaguarda o epidemiologista, não quer dizer que este excesso não seja esbatido ao longo deste ano, com a mortalidade a manter-se dentro da média esperada ou, como aconteceu em 2023, quando se conseguiu reduzir o excesso de mortalidade registado nos anos pandémicos, passando-se de um excesso com 10 a 11 mil mortes a mais para seis mil.
De acordo com o que tem sido referido por alguns especialistas, e até pela própria DGS, a cobertura vacinal contra a gripe está abaixo do esperado na faixa etária a partir dos 65 anos, mantendo-se nos 62% quando deveria ter atingido já os 75%. Esta parece ser uma das causas para este excesso de mortalidade associado às infeções respiratórias, mas outros especialistas defendem que este excesso está também ligado à “saturação dos serviços de saúde e a menos cuidados”.
O pneumologista Filipe Froes confirmou isso mesmo ao DN, na edição de sábado, assumindo que “a saturação dos serviços tem evidentemente consequências assistenciais”. O epidemiologista do ISP reforça a necessidade de um estudo rigoroso para se ir à raiz do problema e Filipe Froes também defendia que a resposta da próxima época de atividade gripal deveria começar a ser planeada assim que esta acabar para se travar o excesso de mortes.