Partidos reagem à Operação Influencer
18 abril 2024 às 13h17
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Ventura critica "pressão enorme" para ilibar Costa. Mariana Vieira da Silva pede para ex-PM ser ouvido

O presidente do Chega considera haver "um sinal preocupante" na Operação Influencer. Mariana Vieira da Silva já veio dizer que o antigo primeiro-ministro tem o direito a defender-se, enquanto o BE quer esclarecimentos da PGR e a IL pede cautela.

André Ventura, presidente do Chega, afirmou esta quinta-feira que existe "uma pressão enorme" sobre a justiça, que considerou preocupante, para ilibar o ex-primeiro-ministro António Costa na Operação Influencer e defendeu uma investigação política no parlamento.

No dia seguinte a ser conhecido o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) que rejeitou o recurso do Ministério Público (MP) no processo da Operação Influencer e decidiu reduzir as medidas de coação, André Ventura considerou que "fica evidente um entendimento diferente" entre o Ministério Público e estes juízes, mas defendeu que esta é uma decisão sobre medidas de coação e não sobre a investigação em si.

"Há um sinal preocupante, uma pressão enorme da sociedade civil, quer de setores ligados ao PS, quer de setores ligados a varias instituições, para ilibar António Costa, coisa que não aconteceu com outros políticos e outros processos", disse, questionando porque não existiu esta pressão, por exemplo, em relação ao antigo primeiro-ministro José Sócrates.

Ventura considerou que "parece haver uma espada sobre o tribunal" a pedir a absolvição rápida de Costa "para ele poder ir para o Conselho Europeu", mas disse não incluir o Presidente da República entre estes setores que pressionam a justiça.

"Temos de ter uma justiça de igual para todos, há pessoas à espera há dez anos", defendeu, em declarações aos jornalistas no Jardim da Praça do Império, em Lisboa.

O líder do Chega considerou que, independentemente do que venham a ser as conclusões judiciais, há suspeitas políticas neste campo, que envolve a construção de um centro de dados (Data Center) na zona industrial e logística de Sines pela Start Campus.

Por isso, irá propor uma comissão parlamentar de acompanhamento (não de inquérito) -- semelhante à que se constituirá para os fundos comunitários -- para investigar os "negócios de milhões do lítio e do hidrogénio".

Questionado se a procuradora-geral da República não deve tirar consequências depois deste acórdão, Ventura defendeu que "o Ministério Público tem de ter autonomia e independência para fazer o seu trabalho".

"Não podemos avaliar um processo por decisões sobre as medidas de coação, vamos ter de esperar pela fase final, se há ou não acusação", disse.

O líder do Chega frisou que foi António Costa que se demitiu "com base no processo, mas não só", referindo que também foi encontrado dinheiro no gabinete do seu chefe de gabinete e apontando o envolvimento do "seu melhor amigo" Lacerda Machado neste projeto de Sines.

"Eu acho que é preciso deixar que a justiça trabalhe -- se há crime ou não é outra coisa --, mas o parlamento deve fazer uma investigação profunda sobre estes negócios, porque há elementos que merecem investigação política", disse.

"Não podemos querer uma justiça para primeiros-ministros e outra para portugueses", reforçou.

Mariana Vieira Silva diz que António Costa tem de poder defender-se

A deputada socialista Mariana Vieira da Silva defendeu entretanto que o ex-primeiro-ministro António Costa tem de poder defender-se no âmbito da Operação Influencer, afastando qualquer ataque à separação de poderes ou à investigação do Ministério Público.

"António Costa pediu para ser ouvido e não há nada que justifique que meses depois disto acontecer, de haver buscas, de haver eleições, continue António Costa a não poder ser ouvido e saber o que é que existe contra ele no processo para se poder defender", disse à Antena 1.

Para a antiga ministra da Presidência, o acórdão do Tribunal da Relação conhecido na quarta-feira "é mais um momento num processo já longo em que há uma ação do Ministério Público, com consequências que todos os portugueses conhecem, sem que exista nenhuma capacidade para o ex-primeiro-ministro António Costa poder conhecer aquilo de que é acusado e poder defender-se".

"Por isso, não está em causa nenhum ataque à separação de poderes, nenhuma ideia de que o Ministério Público não deve poder investigar quem quer que seja sobre o que quer que seja, mas sim a ideia de que, à medida que o tempo passa e não acontecendo nada, pelo contrário havendo decisões de juízes sobre este processo, continuarmos em saber exatamente o que é que justificou aquele parágrafo e quais são as acusações sobre António Costa para que ele se possa defender", sustentou.

Na quarta-feira, também a deputada e ex-ministra do PS Ana Catarina Mendes se pronunciou sobre o caso, considerando que o Ministério Público (MP) "deve explicações aos portugueses", defendendo que António Costa, "sabendo que é inocente", se demitiu para que não recaíssem suspeitas sobre as instituições.

"O Ministério Público deve explicações aos Portugueses. Porque derrubou um Governo e um Parlamento, como se levantam suspeitas e se coloca em causa o bom nome das Pessoas? Isto é gravíssimo em Democracia, já o tinha afirmado aqui há meses", criticou.

Segundo Ana Catarina Mendes "António Costa, sabendo que é inocente, assumiu uma posição de estadista e demitiu-se para que não recaíssem suspeitas sobre as Instituições".

"Hoje, exige-se um esclarecimento do MP sobre o que aconteceu! Os cidadãos têm que ter confiança nas Instituições. Impõe-se uma explicação! Exige-se Responsabilidade(s)!!", sustentou.

Mortágua pede que PGR esclareça quadro da investigação, âmbito e duração

Mariana Mortágua, coordenadora do Bloco de Esquerda, considerou que as explicações da Procuradora-Geral da República (PGR) sobre o envolvimento do ex-primeiro-ministro na Operação Influencer foram insuficientes, pedindo que se esclareça o quadro da investigação, âmbito e duração.

"As explicações da PGR sobre o envolvimento do ex-primeiro-ministro [António Costa] na Operação Influencer foram insuficientes. É agora ainda mais necessário que esclareça o quadro da investigação, o seu âmbito e duração", defendeu, numa mensagem publicada na rede social X.

Na opinião da líder bloquista, antes da nomeação "do/a próximo/a PGR deve ser debatido o seu perfil e o estado do Ministério Público".

IL pede cautela com conclusões precipitadas e respeito pelo tempo da justiça

Por sua vez, Rui Rocha, presidente da IL, pediu cautela com "conclusões precipitadas" quanto ao acórdão da Relação sobre a Operação Influencer, considerando que o "tempo da justiça deve ser respeitado sempre" independentemente da vantagem para qualquer um dos lados políticos.

"O momento em que estamos é que houve decisões instrutórias e essas decisões foram agora questionadas pelo Tribunal da Relação. Essas decisões não têm a natureza de decisão final", disse no parlamento, recorrendo à "frase que se tornou famosa nos últimos anos" que defende que "deve ser respeitado o tempo da justiça".

"Deve ser respeitado sempre, quer quando isso tem vantagem para um dos lados políticos quer quando isso tem vantagem para outro lado político. É o tempo de acompanharmos com cautela", apelou.

De acordo com Rui Rocha, "haveria vantagem que a Procuradoria-Geral da República prestasse alguns esclarecimentos".

"Mas eu insisto: muito cuidado com conclusões precipitadas sobre a viabilidade ou não do processo com base em decisões sobre decisões instrutórias", defendeu.

O presidente liberal insistiu que estas "não são decisões finais" e portanto é preciso "cautela sobre a tomada de decisões e de posições definitivas sobre aquilo que são na verdade decisões provisórias".

Sobre o facto de o antigo primeiro-ministro António Costa ainda não ter sido ouvido, Rui Rocha apontou que a preocupação do partido é "uma justiça célere e justa para todos".

"Aquilo que eu estranharia é num país em que a justiça é lenta para todos, em que a justiça muitas vezes tarda demais, que houvesse um regime de exceção para titulares de cargos políticos", apontou.

Esta reação da coordenadora do BE surge um dia depois de ter sido conhecida a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, que rejeitou o recurso do Ministério Público no processo da Operação Influencer, reduziu as medidas de coação dos arguidos a termo de identidade e residência e entendeu não existirem indícios de crimes.

A legislatura anterior foi interrompida na sequência da demissão de António Costa, após ter sido divulgado que era alvo de um inquérito instaurado no MP junto do Supremo Tribunal de Justiça após ter sido extraída uma certidão do processo-crime Operação Influencer.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, aceitou a demissão e dois dias depois anunciou ao país a dissolução do parlamento e a convocação de eleições, que se efetuaram em 10 de março, que deram a vitória à coligação Aliança Democrática, que reuniu PSD/CDS-PP/PPM.

A Operação Influencer levou na altura à detenção de Vítor Escária (chefe de gabinete de António Costa), Diogo Lacerda Machado (consultor e amigo de António Costa), dos administradores da empresa Start Campus Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, e do presidente da Câmara de Sines, Nuno Mascarenhas, que ficaram em liberdade após interrogatório judicial.

Existem ainda outros arguidos, incluindo o agora ex-ministro das Infraestruturas João Galamba, o ex-presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta, o ex-porta-voz do PS João Tiago Silveira e a Start Campus.

O caso está relacionado com o projeto de construção de um centro de dados na zona industrial e logística de Sines pela Start Campus, a produção de energia a partir de hidrogénio em Sines, e a exploração de lítio no distrito de vila Real, em Montalegre e Boticas.