Manuel Fernandes (1951-2024)
27 junho 2024 às 23h19
Atualizado em 27 junho 2024 às 23h20
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Morreu o goleador de Sarilhos Pequenos que se tornou uma das maiores glórias do Sporting

Avançado representou os leões como jogador durante 12 anos e festejou dois campeonatos. Como treinador, em 2000, conquistou uma Supertaça. Para a história ficam os quatro golos ao Benfica no célebre 7-1. Tinha 73 anos.

Manuel Fernandes, ex-avançado internacional português e uma das maiores figuras da história do Sporting e do futebol nacional, morreu esta quinta-feira aos 73 anos, vítima de doença prolongada. O quadro clínico do antigo jogador agravou-se nos últimos tempos - estava internado num hospital em Lisboa - e desde então foi alvo de várias homenagens por parte do Sporting. A última uma visita do presidente Frederico Varandas e do goleador Viktor Gyökeres que lhe levaram a taça de campeão ao hospital.

Manuel José Tavares Fernandes nasceu em Sarilhos Pequenos, a 5 de junho de 1951. Oriundo da CUF, chegou a Alvalade em 1975 com a difícil missão de substituir Yazalde, e só saiu em 1987, para fazer uma última época no Vitória de Setúbal antes de terminar a carreira de jogador. 

Manuel Fernandes num dérbi contra o Benfica, relativo à temporada 1985-86.
© Global Notícias

Goleador nato e avançado dotado de uma técnica apurada, realizou um total de 433 jogos com a camisola do Sporting, tendo apontado 257 golos. Em Alvalade conquistou dois campeonatos nacionais (1979-80 e 1981-82), duas Taças de Portugal (1977-78 e 1981-82) e uma Supertaça (1982-83). Foi ainda o melhor marcador do campeonato português na temporada 1985-86, época em que apontou 30 golos. 

No clube leonino formou com Rui Jordão uma das duplas de avançados mais temíveis da história do futebol português. "Rui Jordão foi ao longo de nove anos em que jogámos juntos, o irmão que nunca tive. Conhecíamos tudo um do outro, não só do jogo, mas também da personalidade de cada um. No campo era um artista. Elegante, inteligente no jogo, goleador, homem de grupo e amigo do seu amigo. Foi de facto, o melhor jogador com quem joguei ao longo da minha carreira desportiva", disse numa entrevista o ano passado a um site de adeptos do Sporting.

Ainda hoje é o segundo melhor marcador de sempre dos leões, só superado por Peyroteo, e o terceiro só contabilizando golos marcados no campeonato. 

Há cerca de um ano foi alvo de uma homenagem, organizada pelo filho, por ser o jogador com mais jogos na I.ª divisão - 486 -, numa cerimónia na sua terra natal. "Sou da aldeia de Sarilhos Pequenos, que quando eu era pequeno tinha 600 habitantes. Queria ser jogador de futebol e termino a carreira como jogador com mais jogos na 1.ª Divisão Nacional. Pode não ser importante para muita gente, mas para mim é um orgulho extraordinário e o meu filho decidiu fazer esta festa maravilhosa", disse na ocasião. Esta homenagem estendeu-se depois ao Estádio José Alvalade, em maio de 2023, antes de um dérbi com o Benfica.

Manuel Fernandes foi homenageado em maio de 2023 em Alvalade, antes do dérbi contra o Benfica.
Pedro Rocha / Global Imagens | Pedro Rocha

Começou aos 16 anos na equipa de juvenis do Sarilhense, e com 17 já jogava pela equipa principal na III Divisão nacional. Os responsáveis da CUF viram-lhe qualidades e contrataram-no. Começou nas reservas da equipa do Barreiro, mas no espaço de um ano subiu à equipa principal, tendo ajudado a CUF a atingir um histórico quarto lugar que lhe mereceu a participação na Taça UEFA.

Foi essa grande temporada de 1974-75 que despertou a atenção de vários clubes. O FC Porto também estava interessado, mas o seu sportinguismo, e a premonição da mãe que um dia lhe disse que ia vestir de verde e branco falaram mais alto na hora de escolher.

Em Alvalade viveu muitas glórias, mas sempre destacou três momentos. O dia em que vestiu a camisola do clube pela primeira vez, a tarde em que marcou um dos golos da vitória diante da União de Leiria na época 1979-80, e que permitiu aos leões festejarem o título de campeão. E, claro, provavelmente o seu jogo mais memorável de sempre, o célebre 7-1 aplicado ao Benfica a 14 de dezembro de 1986, tendo sido ele o autor de quatro golos encaixados pelo guarda-redes benfiquista Manuel Bento.

Apesar de destacar este dérbi pelos quatro golos, confessou sempre que nem foi o seu melhor jogo contra o Benfica: "Esse jogo ainda hoje é lembrado pelo resultado que acontece uma vez numa vida. Fiz quatro golos e ficarei na história por isso, mas na minha opinião esse não foi o meu melhor Sporting-Benfica. Para mim, o meu melhor dérbi foi em 1982, quando vencemos por 3-1, com dois golos de Jordão e um meu".

Pela seleção nacional realizou um total de 31 jogos, tendo apontado nove golos pela equipa das quinas. Nunca escondeu, contudo, a sua mágoa por não ter sido convocado para as fases finais do Europeu de 1984 e do Mundial de 1986. A sua primeira chamada aconteceu ainda como jogador da CUF, em 1974, convocado pelo então selecionador José Maria Pedroto.

Treinador e dirigente

Terminada a carreira de jogador no Vitória de Setúbal, em 1988, tornou-se treinador da equipa sadina nesse mesmo ano, substituindo no cargo Malcolm Allison (teria posteriormente mais três passagens pelo clube de Setúbal). Passou ainda pelo banco do Estrela da Amadora, Ovarense, Campomaiorense, Tirsense, Santa Clara, Sporting, Penafiel, ASA de Angola e União de Leiria.

Como treinador teve duas passagens pelo Sporting. Primeiro como adjunto de Bobby Robson em 1993, e depois em 2000 já como técnico principal, quando foi chamado a substituir Augusto Inácio, conquistando nessa temporada a Supertaça e lutando até ao final pelo título, que acabou por ser ganho pelo Boavista.

"Como treinador o meu regresso aconteceu num momento especialmente difícil, a convite de Luís Duque. Foi em 2000, fi-lo com espirito de missão. Em retrospetiva, posso dizer que fui de olhos fechados. Não consegui dizer não ao nosso clube. Neste particular, recordo as palavras de alguém que me disse 'Vais para apagar um fogo', isso porque o treinador era para ser José Mourinho. Ainda assim conquistámos a Supertaça ao FC Porto", contou numa entrevista.

Manuel Fernandes treinou o Sporting em 2000 e conquistou uma Supertaça pelo clube de Alvalade.

Haveria de voltar a representar o Sporting, mas desta vez com missões de dirigente. Primeiro em 2011, convidado pelo presidente Godinho Lopes para integrar a estrutura do futebol. Acabaria por ser despedido com a entrada de Bruno de Carvalho para a presidência, mas voltaria depois em 2015 para liderar o departamento de scouting, por indicação do treinador Jorge Jesus, depois de pouco tempo antes ter feito as pazes com Bruno de Carvalho.

Em 2018, na sequência da grave crise que se abriu em Alvalade com o ataque à Academia de Alcochete e a posterior saída de Bruno de Carvalho, assumiu o comando do departamento do futebol do Sporting, substituíndo Augusto Inácio, por indicação de Sousa Cintra. E após a eleição de Frederico Varandas, passou a fazer parte da estrutura do futebol leonino como embaixador do clube, além de comentador assíduo da Sporting TV.