"Apenas criar um ministério não é o suficiente!”, acusou Kleber Karipuna, coordenador da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), em discurso em frente ao Palácio do Planalto no dia 25 de abril, por entre o som das maracas. Karipuna e mais oito mil indígenas chegaram ao local após mobilização no Acampamento Terra Livre, para o qual Lula da Silva, que esteve presente em 2022, ainda como candidato, e em 2023, já como presidente da República, não foi, desta vez, convidado.
Os povos indígenas sentem-se frustrados com o governo por culpa de promessas não cumpridas: quando Lula tomou posse, além de criar o inédito Ministério dos Povos Indígenas, anunciou que assinaria 14 demarcações de terras nos primeiros 100 dias de governo; a caminho dos 500 ainda só protocolou 10. “O que foi prometido deveria ter sido cumprido”, alerta Maria Helena Gavião, vice coordenadora das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Estado do Maranhão, ao portal UOL.
Em carta divulgada no citado Acampamento Terra Livre, a APIB manifesta-se não apenas contra o presidente mas também contra o Congresso Nacional em virtude da aprovação recente da “lei do marco temporal” no Senado por influência da poderosa bancada ruralista, também conhecida por ‘bancada do boi”, composta por representantes dos latifundiários. E ainda contra o Supremo Tribunal Federal (STF) por colocar aquela lei, considerada lesiva dos interesses dos povos originários, em negociação - segundo os indígenas, direitos fundamentais não se discutem.
“A nova lei proporciona a ‘legalização’ de crimes e premeia os invasores dos territórios”, diz o texto. “Apenas no primeiro mês da lei, a expansão do agronegócio e o arrendamento de terras para monoculturas e garimpo causaram nove assassinatos de indígenas e 23 conflitos em territórios localizados em sete estados e cinco biomas”.
Por isso, Karipuna continuou, ao som das maracas, a discursar em frente ao Planalto em tom duro. “Quero exigir ao presidente Lula o fortalecimento do nosso Ministério dos Povos Indígenas e da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, garantindo um orçamento necessário, porque só assim conseguiremos implementar, na íntegra, a demanda da política indigenista do Estado brasileiro”.
O Ministério dos Povos Indígenas, liderado por Sônia Guajajara, vem respondendo que “houve uma forte retomada” no governo Lula da política de defesa dos povos originários. E sublinha que “as 10 demarcações ocorridas se aproximam do número de demarcações, 11, da última década”. Mas evita falar das 14 prometidas.
”Vocês pensam que é fácil a gente chegar numa mesa de reunião, onde todo mundo chega com suas gravatas, suas camisas brancas, e a gente chega ali apenas uma, duas mulheres, com um cocar? E a gente enfrentar, falar de igual para igual. Dizer por que nós estamos ali”, disse, durante o Acampamento Terra Livre, a ministra Guajajara, que nas presidenciais de 2018 foi candidata a vice-presidente de Guilherme Boulos, pelo PSOL, partido de esquerda.
“A luta que a gente faz é um enfrentamento muito pesado”, continuou, segurando o choro, de acordo com relatos da imprensa local. “A gente enfrenta o próprio Estado brasileiro. A gente enfrenta as forças económicas, forças políticas fortes, que estão aí há muitos anos. E a gente chega ali com a nossa cara, com a nossa força ancestral, muitas das vezes sendo ignorados”.