Operação Marquês
07 dezembro 2024 às 22h16
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Sócrates considera “ilegal” decisão do TRL e garante que vai travar julgamento

O antigo governante contesta a criação de um grupo de trabalho no Conselho Superior de Magistratura para acelerar o processo Operação Marquês, alegando que é “um descarado abuso de poder”.

Oantigo primeiro-ministro José Sócrates afirmou este sábado, numa conferência de imprensa na Ericeira, que a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) de remeter o processo Operação Marquês para julgamento no Tribunal de 1.ª Instância é “um abuso” e alegou que “não havendo pronúncia, nem acusação, não pode haver julgamento nenhum”.

“Lamento muito dizer para todos aqueles que estão muito excitados com a ideia de que irá haver julgamento, que não me parece que possa haver julgamento sem uma pronúncia ou sem acusação”, explicou José Sócrates, sublinhando ainda que não está “disposto a abdicar de nenhum direito, nomeadamente o direito ao recurso, apenas para satisfazer o gáudio dos jornalistas que confundem a sua profissão com ativismo jurídico”.

O também antigo secretário-geral do PS referia-se ao despacho do juiz desembargador Francisco Henriques, que na quinta-feira determinou que o recurso no processo, apresentado pela defesa de José Paulo Pinto de Sousa, primo de José Sócrates - que contesta a competência de duas das três juízas desembargadoras do coletivo de juízes do TRL -, afinal tem um “efeito meramente devolutivo”, isto é, só garante que a queixa seja analisada,  e não suspende o processo. O articulado foi aceite por Francisco Henriques, mas depois mandou-o para o Tribunal Central Criminal de Lisboa, dada a conclusão que tirou.

O juiz desembargador, tal como fez com o recurso do primo de Sócrates, também já tinha aceitado três recursos que estão no Tribunal Constitucional - de José Sócrates, do antigo ministro e ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos Armando Vara e de Carlos Santos Silva, amigo de José Sócrates, mas teve a mesma leitura, ou seja, considerou que não teriam um efeito suspensivo do processo.

José Sócrates, aos jornalistas,  disse ontem que esta decisão do TRL  lhe parece “ilegal, porque é um acórdão que recorre a uma alteração substancial de factos óbvia, que altera o crime, que altera a moldura penal”, para além de alegar que nunca lhe foi possível defender-se. O recurso do primo de Sócrates passa por questionar a competência das juízas Raquel Lima e Madalena Caldeira, que em janeiro deste ano decidiram que o antigo primeiro-ministro vai a julgamento por corrupção passiva no âmbito da Operação Marquês.

A decisão das juízas também recuperou quase na totalidade a acusação do Ministério Público no âmbito do processo, que levava a julgamento 22 arguidos por 118 crimes económico-financeiros, revogando a decisão instrutória do juiz Ivo Rosa, que remetia para julgamento apenas José Sócrates, Armando Vara, Ricardo Salgado e João Perna, antigo motorista do antigo líder socialista.

A decisão instrutória de Ivo Rosa também ilibou Sócrates em 25 dos 31 crimes de que estava acusado, pelo que o antigo primeiro-ministro ia a julgamento apenas por três crimes de branqueamento de capitais e três crimes de falsificação de documentos.

“Por mais que o juiz se esforce, não conseguirá transformar um acórdão que está sob contestação num acórdão transitado em julgado”, destacou José Sócrates ontem, que ainda classificou como “abuso de poder” a decisão do Conselho Superior de Magistratura de constituir um grupo de trabalho para acelerar a tramitação do processo.

“A extraordinária resolução de constituir este grupo de trabalho põe também em causa a liberdade e a independência dos juízes, que deve ser garantida relativamente a todos os poderes”, disse, reforçando a ideia com o argumento de que “todos os juízes que intervierem no processo sentirão sobre os seus ombros os olhos inquisitoriais do grupo de trabalho do Conselho Superior de Magistratura”. Com Lusa