Gaza
13 julho 2024 às 21h09
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Quem é o líder militar do Hamas alvo do ataque que fez 90 mortos?

Foi a oitava tentativa de Israel de matar Mohammed Deif em 20 anos, não sendo ontem claro se terá sido bem sucedida. Bombardeamento ocorreu em zona considerada “humanitária”.

Mohammed Deif, o líder das Brigadas Al-Qassam e um dos arquitetos do ataque terrorista de 7 de outubro contra Israel, sobreviveu a sete tentativas de assassinato desde 2001. A dúvida este sábado era se teria sobrevivido à oitava. As Forças de Defesa de Israel (IDF) alegam que ele era um dos alvos do ataque que, segundo as autoridades de Gaza controladas pelo Hamas, terá matado pelo menos 90 pessoas e feito 300 feridos em Al-Mawasi. Uma zona que os israelitas tinham designado como “humanitária” perto de Khan Yunis.

O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, admitiu numa conferência de imprensa que não tinha “a certeza absoluta” de que tinham matado Deif, um dos homens mais procurados por Israel, ou Rafa Salameh, comandante da brigada do Hamas em Khan Yunis que seria o outro alvo. Mas prometeu que “de uma forma ou de outra” iria matar a liderança do grupo terrorista, alegando que deu a luz verde para o ataque após saber que não havia reféns na zona.

Um representante do Hamas alegou mais cedo que Israel mentiu ao dizer que o seu alvo eram os líderes do grupo. “A verdade é que estas alegações são uma tentativa de encobrir a escala do crime e a escala do massacre, de forma a tentar justificar tal massacre, apesar de atacar este número de deslocados não ser justificado por nada”, disse Izzat al-Rashq, membro do gabinete político do Hamas, à Reuters. Israel alega ter atingido um “complexo operacional” onde “não havia civis”, mas segundo as autoridades de Gaza, metade dos mortos serão mulheres e crianças. 

Mas afinal quem é Deif, que há mais de duas décadas tem escapado às autoridades israelitas e, por isso, tem um estatuto quase mítico na Faixa de Gaza? O líder das Brigadas Izz ad-Din al-Qassam, o braço militar do Hamas, nasceu em 1965 no campo de refugiados de Khan Yunis. Mohammad Masri, o seu verdadeiro nome, tornou-se Mohammed Deif após aderir ao grupo terrorista durante a primeira Intifada (revolta ou levantamento popular), que começou em 1987. Dois anos depois terá sido detido e passado 16 meses na prisão, fundando em seguida as Brigadas Al-Qassam com o objetivo de capturar soldados israelitas. 

Estudou física, química e biologia na Universidade Islâmica de Gaza, sendo acusado por Israel de planear uma série de atentados à bomba que mataram dezenas de israelitas nos anos 1990. Numa das sete tentativas de assassinato a que sobreviveu, em 2002, ficou sem um olho e noutra ficou ferido com gravidade na perna. Em 2014, a mulher, a filha de três anos e o filho de sete meses morreram num ataque.

Deif não é visto em público há anos e não existem muitas fotografias suas. É considerado, junto com o líder do Hamas na Faixa de Gaza, Yahya Sinwar, um dos arquitetos dos ataques de 7 de outubro, no qual Israel diz que morreram cerca de 1200 pessoas (a maioria civis) e foram raptadas outras 240. Destas, 120 ainda estarão nas mãos do grupo terrorista, pelo menos 42 delas mortas. 

No dia do ataque, o Hamas divulgou uma rara mensagem áudio de Deif, a anunciar o que dizia ser a operação “Dilúvio de Al-Aqsa” em retaliação pelos raides israelitas contra a mesquita em Jerusalém (um dos locais mais sagrados do Islão). Falando num tom calmo, o líder militar do Hamas alegava que Israel tinha sido avisado para parar os seus crimes contra os palestinianos, libertar os prisioneiros e parar a construção de colonatos. “Tendo em conta a orgia da ocupação e a sua rejeição das leis internacionais e resoluções, tendo em conta o apoio norte-americano e ocidental e o silêncio internacionais, decidimos acabar com isto”, dizia.

A resposta israelita foi o início da guerra na Faixa de Gaza - que já causou mais de 38 mil mortos -, com Netanyahu a prometer matar Sinwar, Deif e o seu número dois, Marwan Issa. Este último terá sido morto num ataque em março. A morte de Deif seria uma vitória para o primeiro-ministro, que está a ser pressionado a aceitar um acordo de cessar-fogo que permita a libertação dos reféns. 

O líder israelita insistiu este sábado que só põe fim à guerra quando os objetivos tiverem sido alcançados, entre eles destruir as capacidades militares do Hamas. Este seria um passo nesse sentido. Contudo, também poderia ser uma desculpa para o Hamas endurecer a sua postura nas negociações, que continuam num impasse.

susana.f.salvador@dn.pt