Estradas
04 maio 2024 às 09h37
Leitura: 9 min

Custo das PPP rodoviárias derrapa mais de 50% com fim das portagens nas ex-Scut

Parcerias Público-Privadas das estradas iam custar, a partir de 2025, 2,8 mil milhões de euros até ao fim das concessões, em 2040. Agora, é provável que não. Proposta do PS para acabar com portagens em algumas ex-SCUT pode fazer subir a fatura dos contribuintes até 4,3 mil milhões de euros, diz o governo.

Os encargos globais com as Parcerias Público-Privadas com as estradas em Portugal deve sofrer uma derrapagem superior a 50% no período de 2025 a 2040 (último ano previsto para todos os contratos hoje em vigor), na sequência da aprovação, esta semana, de um projeto de lei do Partido Socialista para acabar com as portagens em várias ex-SCUT (antigas estradas pensadas para serem sem custos para os utilizadores).

O projeto passou na generalidade com os votos a favor de PS, Chega, Bloco de Esquerda (BE), Partido Comunista Português (PCP), Livre e Pessoas-Animais-Natureza (PAN).

Os partidos do governo (PSD e CDS) votaram contra e a Iniciativa Liberal absteve-se.

Segundo o governo, esta medida, prevista no programa eleitoral do PS, deve custar ao Orçamento de Estado de 2025 cerca de 180 milhões de euros. Pelas contas do PS, é menos, não chega a 160 milhões.

Seja como for, Pedro Duarte, o ministro dos Assuntos Parlamentares, avisou que o impacto da medida tem um alcance muito maior.

"O problema é que não tem impacto apenas num ano. Segundo as nossas estimativas, até ao final do prazo de concessões das portagens das ex-SCUT, em 2040, o valor é de 1,5 mil milhões de euros”, afirmou o governante, na quinta-feira, em declarações aos jornalistas, no Parlamento.

De acordo com dados ainda provisórios obtidos pelo DN/Dinheiro Vivo (DV), este valor em encargos adicionais com as PPP das estradas soma ao custo líquido (descontando receitas que iriam reverter a favor do Estado), que deve ascender a 2,8 mil milhões de euros de 2025 a 2040.

Com a medida aprovada agora pela oposição contra vontade dos partidos do governo de Luís Montenegro, a fatura global das PPP rodoviária deve subir para 4,3 mil milhões de euros. Dá o referido aumento superior a 50% (53%, para se ser mais exato).

As PPP das estradas são e sempre foram as mais pesadas em termos orçamentais, valendo quase 75% do total contratualizado em regime de partilha de riscos, receitas e custos entre público e privados.

Além das estradas, o Estado tem PPP ativas no setor ferroviário, aeroportuário (ANA), na Saúde e ainda no Oceanário de Lisboa.

A aprovação desta medida, mais uma à revelia do que pretende o governo minoritário do PSD-CDS, vem causar mais pressão sobre as despesas públicas, claro.

Assim é porque vários analistas de Finanças Públicas estavam a contar com um alívio destes encargos das PPP nos próximos anos, o que pode agora não acontecer.

Recorde-se que até o anterior ministro das Finanças, Fernando Medina, punha muita fé no fim do ciclo de prejuízos para o Estado com estas PPP, tendo planeado no seu OE 2024 constituir um Fundo para os Investimentos Estruturantes que pudesse começar a ser usado a partir do final do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), em 2026.

Esse fundo seria "financiado com verbas de saldos orçamentais positivos e outras fontes, como por exemplo, as concessões rodoviárias". O mecanismo estaria sobretudo virado para apoiar "investimentos públicos privados" e a ideia era que arrancasse com uma base de constituição de, no mínimo, 2 mil milhões de euros.

Nem o novo líder do PS, Pedro Nuno Santos, nem o atual primeiro-ministro, quiseram aproveitar a ideia do tal fundo, de Medina.

Agora,o aumento de encargos que pode ser espoletado pela proposta ganhadora da oposição vem baralhar já as contas de 2025 e até de governos futuros, já que perturba o fluxo financeiro das PPP até 2040, pelo menos.

Segundo a Lusa, no projeto do PS, acabam as portagens na A4 - Transmontana e Túnel do Marão, A13 e A13-1 -Pinhal Interior, A22 - Algarve, A23 - Beira Interior, A24 - Interior Norte, A25 - Beiras Litoral e Alta e A28 – Minho nos troços entre Esposende e Antas e entre Neiva e Darque.

De acordo com a mesma agência, a proposta do BE quer eliminar as portagens para as autoestradas de acesso às regiões do interior (A22, A23, A24, A25, A28, A29, A41, A42). A do PCP quer eliminar os pagamentos na A4, A13, A22, A23, A24, A25, A28, A29, A41 e A42.

UTAO e CFP estavam otimistas com PPP

Segundo a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), "no âmbito das Parcerias Público-Privadas (PPP), os riscos orçamentais existentes coadunam-se, na sua generalidade, com pedidos de reposição de equilíbrio financeiro e ações arbitrais e também pressionam o saldo para baixo".

Mas, na altura, os riscos estavam circunscritos a dois setores e não eram as estradas.

"De acordo com o sinalizado na análise à proposta de OE 2024, destacam-se, no sector ferroviário, o prosseguimento do litígio com a ELOS – Ligações de Alta Velocidade, através de uma ação executiva com um valor peticionado de 192 milhões de euros", refere a unidade que apoia o Parlamento em matérias orçamentais.

"No sector aeroportuário, é de referir o pedido de reposição do equilíbrio financeiro no montante de 214 milhões de euros, entreposto pela ANA — Aeroportos de Portugal, no terceiro trimestre de 2021, com base na redução das receitas da concessão devida às medidas de restrição do tráfego aéreo adotadas pelo Estado durante a pandemia de Covid-19", acrescenta a entidade coordenada pelo economista Rui Baleiras.

No mais recente estudo "Perspetivas Económicas e Orçamentais 2024-2028", publicado já depois de o novo governo tomar posse, o Conselho das Finanças Públicas (CFP) observa que "o ritmo de crescimento do consumo das administrações públicas em volume deverá acelerar 1,2 pontos percentuais (p.p.), para 2,2% em 2024 (1% em 2023), refletindo, em larga medida, a dinâmica projetada para o emprego público e para as despesas com consumo intermédio".

Nos anos seguintes, "o ritmo de crescimento do consumo público deverá ser inferior, perspetivando-se um crescimento de 1,3% em 2025 e convergindo para valores próximos de 1,2% no final do horizonte de projeção", sendo que "as desacelerações antecipadas para 2025 e 2027 deverão resultar, entre outros, da evolução na despesa com Parcerias Público Privadas (PPP)", esperava o CFP, de Nazaré Costa Cabral.

Ainda segundo este entidade, assumindo como base de partida o OE 2024 e depois um cenário plurianual de políticas invariantes (ou seja, os efeitos financeiros do diploma do PS não constam aqui), "o peso da despesa com consumo intermédio no PIB deverá diminuir de 5,3% em 2023 para 5% do PIB em 2028".

Segundo o Conselho que avalia as contas públicas, "esta evolução reflete a evolução da base macroeconómica subjacente, bem como: (i) a eliminação de medidas adotadas em anos anteriores com impacto apenas em 2024, tal como descrito na última parte desta subsecção; (ii) a redução de encargos com PPP; e (iii) a aplicação em despesa de consumo intermédio de uma parte dos fundos provenientes do PRR".

Em todo o caso, o CFP admitia riscos latentes nas parcerias.

No estudo, o Conselho refere que há "o risco de materialização em despesa de passivos contingentes das Administrações Públicas, nomeadamente decorrente de pedidos de reposição do equilíbrio financeiro por parte de concessionárias no âmbito de parcerias público-privadas (PPP), da conversão de ativos por impostos diferidos ou da execução de garantias estandardizadas associadas a linhas de crédito com garantias públicas”.

Tópicos: PPP, Ex-Scuts