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Dinheiro
28 outubro 2024 às 00h42
Leitura: 6 min

Em oito meses despedimentos coletivos já ultrapassam os de 2023

318 empresas avançaram com processos para despedir 4190 pessoas. Destas, 3929 foram efetivamente despedidas, número que compara com as 3622 do ano passado

O número total de despedimentos coletivos iniciados este ano, até final de agosto, ultrapassa já o total de 2023. De acordo com os dados da Direção-Geral do Emprego e das Relações do Trabalho (DGERT), houve 318 empresas em Portugal a avançar com processos para o despedimento coletivo de 4190 trabalhadores, dos quais 3929 foram efetivamente despedidos. A CIP fala em empresas a atingir o limite da sua capacidade de resistência, a Confederação do Comércio aponta a retração do consumo, em especial das áreas do vestuário e calçado, e espera que as alterações nas tabelas de IRS possam trazer alguma “liquidez adicional” para o final do ano que se aproxima. 

No total de 2023, houve 431 empresas a comunicarem despedimentos coletivos, o valor mais alto desde 2015, retirando, claro, o ano de 2020, da pandemia e dos confinamentos associados, em que foram 698 as entidades que recorreram a esta figura para reduzir os seus quadros de pessoal. Das 3819 pessoas a despedir, foram efetivamente despedidas 3622, já que 19 viram o processo revogado e 178 foram sujeitas a outras medidas.

Este ano, entre janeiro e agosto, foram efetivamente despedidos 3929 trabalhadores. Um aumento homólogo de 79% no número de trabalhadores e de 37% no número de empresas (233).

Mais de metade dos despedimentos foram justificados pela necessidade de reduzir pessoal. Em termos regionais, Lisboa e Vale do Tejo lidera, com 169 empresas a despedir 1943 trabalhadores, seguindo-se o Norte, com 92 empresas e 1633 trabalhadores. 

Significativos são os dados referentes à dimensão das empresas. Das 318 que comunicaram processos de despedimento coletivo, 75% são micro e pequenas, com 102 e 136 entidades, respetivamente. Ao nível do número de trabalhadores envolvidos, e sem surpresa,um terço (1398 pessoas) são de grandes empresas, mas que, no seu conjunto, tinham mais de 17800 trabalhadores. Ja no caso das microempresas, trata-se de entidades com 564 trabalhadores e que pretendiam despedir 430. As pequenas empresas pretendiam cortar 46% dos seus funcionários, com 1361 abrangidos.

Quase um quarto dos despedimentos foram nos setores do comércio por grosso e a retalho e da reparação de veículos automóveis e motociclos, seguindo-se, com uma quota de 20% cada, as indústrias transformadoras e as atividades de informação e de comunicação.

Para a Confederação Empresarial de Portugal - CIP, o aumento do recurso a despedimentos coletivos registado nos últimos meses constitui um “sinal de alerta de que a resistência de muitas empresas portuguesas poderá estar a atingir o limite, sob o efeito acumulado de aumentos incomportáveis de custos, do agravamento das condições de financiamento e de uma conjuntura externa particularmente adversa”. 

Para o diretor-geral da CIP, Rafael Alves Rocha, “para além do alívio na carga fiscal, é absolutamente imperioso criar um ambiente regulatório favorável ao desenvolvimento da atividade económica, imbuído da maior flexibilidade, por forma a propiciar às empresas instrumentos que lhes permitam ajustar as suas atividades à volubilidade das circunstâncias nacionais e internacionais, tentando assim satisfazer todas as oportunidades de encomendas que surjam no mercado e promovendo o alargamento dos níveis de emprego”.

Já o presidente da Confederação do Comércio e Serviços admite que o ano tem sido marcado por “alguma retração” da atividade económica na área do comércio, em especial no vestuário e no calçado, com o desaparecimento de milhares de pequenas sapatarias em toda a Europa. Mesmo no alimentar, diz, com a grande distribuição a perceber, no pós-pandemia, a importância do comércio de proximidade, que levou à abertura de supermercados de menor dimensão, o resultado é que se tem assistido, garante, a um desaparecimento das pequenas mercearias, mas também a muitos encerramentos na pequena restauração. 

João Vieira Lopes admite preocupação com a conjuntura adversa, mas mostra alguma expectativa quanto ao final do ano, fruto do aumento do rendimento líquido das famílias em consequência das alterações nas tabelas de retenção do IRS. A época natalícia é vital para a sobrevivência de muitos pequenos comerciantes.

Também o secretário-geral adjunto da UGT se assume preocupado e a acompanhar a situação. Sobretudo porque, diz, este aumento nos despedimentos coletivos vem em contra corrente. “O desemprego não tem aumentando, a taxa mantém-se mais ou menos estática há uns tempos, precisamos de ver os próximos dados para ver se esta tendência de crescimento se verifica e em que proporção”, sustenta Sérgio Monte.

Por fim, a Associação Nacional das Empresas do Comércio e da Reparação Automóvel mostra surpresa com os dados já que, diz o secretário-geral da Anecra, o setor “vive tempos de crescimento e tem sim um problema gravíssimo de falta de mão-de-obra qualificada”.

Roberto Saavedra Gaspar dá o exemplo de um associado que se prepara para trazer 16 pessoas da Colômbia para suprir a falta de trabalhadores em Portugal. O INE contabiliza a existência de mais de 19 mil oficinas no país, mas a associação admite que não serão mais de oito a 10 mil. O setor dava emprego a quase 47 mil pessoas em 2022, o que representa um crescimento de 3,5% face ao ano anterior e de 5,9% face a 2018.