O número total de despedimentos coletivos iniciados este ano, até final de agosto, ultrapassa já o total de 2023. De acordo com os dados da Direção-Geral do Emprego e das Relações do Trabalho (DGERT), houve 318 empresas em Portugal a avançar com processos para o despedimento coletivo de 4190 trabalhadores, dos quais 3929 foram efetivamente despedidos. A CIP fala em empresas a atingir o limite da sua capacidade de resistência, a Confederação do Comércio aponta a retração do consumo, em especial das áreas do vestuário e calçado, e espera que as alterações nas tabelas de IRS possam trazer alguma “liquidez adicional” para o final do ano que se aproxima.
No total de 2023, houve 431 empresas a comunicarem despedimentos coletivos, o valor mais alto desde 2015, retirando, claro, o ano de 2020, da pandemia e dos confinamentos associados, em que foram 698 as entidades que recorreram a esta figura para reduzir os seus quadros de pessoal. Das 3819 pessoas a despedir, foram efetivamente despedidas 3622, já que 19 viram o processo revogado e 178 foram sujeitas a outras medidas.
Este ano, entre janeiro e agosto, foram efetivamente despedidos 3929 trabalhadores. Um aumento homólogo de 79% no número de trabalhadores e de 37% no número de empresas (233).
Mais de metade dos despedimentos foram justificados pela necessidade de reduzir pessoal. Em termos regionais, Lisboa e Vale do Tejo lidera, com 169 empresas a despedir 1943 trabalhadores, seguindo-se o Norte, com 92 empresas e 1633 trabalhadores.
Significativos são os dados referentes à dimensão das empresas. Das 318 que comunicaram processos de despedimento coletivo, 75% são micro e pequenas, com 102 e 136 entidades, respetivamente. Ao nível do número de trabalhadores envolvidos, e sem surpresa,um terço (1398 pessoas) são de grandes empresas, mas que, no seu conjunto, tinham mais de 17800 trabalhadores. Ja no caso das microempresas, trata-se de entidades com 564 trabalhadores e que pretendiam despedir 430. As pequenas empresas pretendiam cortar 46% dos seus funcionários, com 1361 abrangidos.
Quase um quarto dos despedimentos foram nos setores do comércio por grosso e a retalho e da reparação de veículos automóveis e motociclos, seguindo-se, com uma quota de 20% cada, as indústrias transformadoras e as atividades de informação e de comunicação.
Para a Confederação Empresarial de Portugal - CIP, o aumento do recurso a despedimentos coletivos registado nos últimos meses constitui um “sinal de alerta de que a resistência de muitas empresas portuguesas poderá estar a atingir o limite, sob o efeito acumulado de aumentos incomportáveis de custos, do agravamento das condições de financiamento e de uma conjuntura externa particularmente adversa”.
Para o diretor-geral da CIP, Rafael Alves Rocha, “para além do alívio na carga fiscal, é absolutamente imperioso criar um ambiente regulatório favorável ao desenvolvimento da atividade económica, imbuído da maior flexibilidade, por forma a propiciar às empresas instrumentos que lhes permitam ajustar as suas atividades à volubilidade das circunstâncias nacionais e internacionais, tentando assim satisfazer todas as oportunidades de encomendas que surjam no mercado e promovendo o alargamento dos níveis de emprego”.
Já o presidente da Confederação do Comércio e Serviços admite que o ano tem sido marcado por “alguma retração” da atividade económica na área do comércio, em especial no vestuário e no calçado, com o desaparecimento de milhares de pequenas sapatarias em toda a Europa. Mesmo no alimentar, diz, com a grande distribuição a perceber, no pós-pandemia, a importância do comércio de proximidade, que levou à abertura de supermercados de menor dimensão, o resultado é que se tem assistido, garante, a um desaparecimento das pequenas mercearias, mas também a muitos encerramentos na pequena restauração.
João Vieira Lopes admite preocupação com a conjuntura adversa, mas mostra alguma expectativa quanto ao final do ano, fruto do aumento do rendimento líquido das famílias em consequência das alterações nas tabelas de retenção do IRS. A época natalícia é vital para a sobrevivência de muitos pequenos comerciantes.
Também o secretário-geral adjunto da UGT se assume preocupado e a acompanhar a situação. Sobretudo porque, diz, este aumento nos despedimentos coletivos vem em contra corrente. “O desemprego não tem aumentando, a taxa mantém-se mais ou menos estática há uns tempos, precisamos de ver os próximos dados para ver se esta tendência de crescimento se verifica e em que proporção”, sustenta Sérgio Monte.
Por fim, a Associação Nacional das Empresas do Comércio e da Reparação Automóvel mostra surpresa com os dados já que, diz o secretário-geral da Anecra, o setor “vive tempos de crescimento e tem sim um problema gravíssimo de falta de mão-de-obra qualificada”.
Roberto Saavedra Gaspar dá o exemplo de um associado que se prepara para trazer 16 pessoas da Colômbia para suprir a falta de trabalhadores em Portugal. O INE contabiliza a existência de mais de 19 mil oficinas no país, mas a associação admite que não serão mais de oito a 10 mil. O setor dava emprego a quase 47 mil pessoas em 2022, o que representa um crescimento de 3,5% face ao ano anterior e de 5,9% face a 2018.